Disfarçando as preocupações que lhe fervilhavam as ideias,Raquel decidiu: - Fique tranquilo, Marcos.Resolveremos assim: eu mudo para sua casa e ajudo vocês a pagar o aluguel. Está decidido! - Não posso concordar com isso Raquel. Ninguém suporta Alice. Acabei de contar tudo o que fiz hoje porque entrei em desequilíbrio por tanta queixa que ouvi, e você ainda quer ir lá para casa? Só se você estiver louca! - Veja, eu conheço a Alice e, por isso não vou me importar com o que quer que ela faça ou diga. Estarei preparada. - Não! - Então quem vai lhe ajudar? - inquiriu Raquel com firmeza,encarando-o sem arrogância,mas desarmando-o de qualquer subterfúgio. Após alguns segundos, enquanto Marcos refletia,ela argumentou: - Acredito que tenha sido por minha causa que você se indispôs com nossa família e hoje não tem notícias de ninguém. Papai está inválido. O coitado nem entende o que está acontecendo. Mamãe é.... Bem, nem sei dizer se ela é submissa ou acomodada. Vovô, por ser o "czar" da nossa família,soberano,cruel,de extraordinária figura,jamais deixaria nossos irmãos nos ajudar. Como " Pedro,o Grande", ele seria bem capaz de mandar executar o filho que se opusesse às suas ordens. Depois de breves instantes,Raquel apelou com voz mansa,envolvendo-o com sentimentos bondosos e sinceros: - Somos um pelo outro,Marcos. Eu só tenho você. Vamos morar juntos, irei para lá e vai dar tudo certo. Marcos fitou-a longamente. Ele estava sem alternativa e sem argumentos,por essa razão teria de concordar.
Com o passar dos dias,Raquel mudou-se para a casa do irmão. E tendo a oportunidade de ficar sozinha com Marcos,ela ofereceu: - Tome - dizia, estendendo-lhe um maço de notas de dinheiro. - Onde você arrumou isso?- perguntou Marcos surpreso. Com doce sorriso que irradiava ternura, Raquel respondeu: - Assaltei um banco! - brincou,rindo gostosamente. E notando que os olhos de Marcos sinalizavam espanto,ela esclareceu: - É brincadeira,seu bobo. - Eu sei, como o conseguiu? - Eu tinha uma certa economia guardada no banco e.... Bem o restante consegui com a venda de alguns móveis, televisão,vídeo,geladeira..... - Raquel!.... - Não diga nada - ela interrompeu,colocando o dedo indicador nos lábios de Marcos , sinalizando-o para silenciar. Depois completou: - Quero que aceite e pague os aluguéis atrasados. Daqui para frente será vida nova. - Raquel,você não deveria ter feito isso! - Por que não? Você não vai deixar eu usar a sua geladeira? Nem assistir à sua TV? Marcos calou-se meio angustiado. Algo o incomodava com aquela situação. Era muita renúncia por parte de sua irmã. Ele não queria que ela se sacrificasse tanto. Com o dinheiro na mão, ele a olhou por longo tempo sem dizer nada e estampou um suave sorriso , quase forçado, no rosto pálido. Nesse instante, Alice entra na sala e com ar de desdém, trazendo na fala uma expressão debochada,observou: - Que cena! Hum! ..... Comovente. Não oferecendo atenção aos comentários pobres da esposa,Marcos lhe mostrou: - Temos o dinheiro para pagar o aluguel. A Raquel nos emprestou. Alice fechou o sorriso irônico que segundos antes sustentava. Ela não disse uma palavra. Sua face, antes alva, cobria-se agora por um intenso rubor provocado pela ira e pela revolta. Ela possuía um coração orgulhoso, repleto de ódio e de impulsos vaidosos,que não a deixava, no mínimo agradecer o auxílio recebido. A cena foi interrompida pela chegada de Elói, o filho mais novo do casal,que anunciava,afoito,um imprevisto. - Mãe! Mãe! O Nilson está brigando lá na rua,aos socos e pontapés!
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Um motivo para viver
SpiritualRaquel nasceu em uma fazenda,numa pequena cidade do Rio Grande do Sul.Morava com o pai,a mãe,três irmãos e o avô,um rude e autoritário imigrante clandestino da antiga Polônia russa. Na mesma fazenda,mas em outra casa,residia seu tio Ladislau,com a m...