Quebrando o silêncio, Raquel perguntou: - O que aconteceu? Você está branco feito cera. Ainda não está bem? - Já estou melhor. - Poucos segundos depois,ele desabafou,quase irritado: - Desgraçado! Ele me paga. - Você e o Vagner são amigos. O que aconteceu para você quase bater nele. - Se não fosse você,eu iria quebrá-lo ao meio. - E,após pequena pausa,avisou: - Temos que tomar cuidado ao falar com os outros, Raquel. Tem coisa que não se diz. Não se deve mexer com a moral de ninguém. - O que ele falou que o deixou assim? Fiquei preocupada. Pensei que você fosse desmaiar. Alexandre olhou-a com ternura e procurou explicar: - Não vou repetir o que ele me disse. Não tenho com você liberdade para falar as mesmas palavras que aquele crápula usou. Foi uma conversa de homem e ele... Bem ele me ofendeu moralmente,duvidando da minha capacidade,da minha integridade. Entende? - Ora, Alexandre,entre colegas há brincadeiras como essas. Vocês são amigos. - Eu não tenho amigos. Não confio em ninguém. Raquel se calou amargurada,lembrando da agressão que sofrera no dia anterior. O colega percebeu algo errado e perguntou: - O que houve? - Nada. - Você também ão gosta dele, não é? Ela nada respondeu e o colega lembrou: - Ele me falou que chegou em você ontem.O que ouve? Raquel abaixou a cabeça e não se manifestou. Curioso e interessado,Alexandre insistiu: - Ele está dando em cima de você? Raquel estava quase chorando. Lágrimas brotavam em seus olhos,mas sua posição dificultava que Alexandre visse. Tentando dissimular,ela perguntou: - Você está melhor? Sorrindo,suavemente,ele respondeu: - Sim.Já estou bem. Tentando não tocar mais naquele assunto,ela perguntou: - O que você sentiu? O que era aquilo que estava tomando? Agora, com o semblante mais tranquilo,quase sorrindo,ele a olhou e ajeitou-se melhor, tomando-lhe as pequenas mãos e colocando-as entre as suas. Raquel, séria,pareceu repelir a atitude quando se enrijeceu e, erguendo o corpo,ajeitou-se no banco puxando vagarosamente suas mãos. Alexandre,deixando-a à vontade,percebeu a ação,mas nada disse a respeito e comentou: - Tenho uma história longa e... Bem,não sei se você quer ouvir. Ambos se entreolharam . Alexandre parecia suplicar com o olhar a atenção da jovem. Ele estava angustiado,magoado.Jamais confiara a um conhecido todos os seus pesares,todos os seus sentimentos mais puros. - Eu quero saber.Conte-me,por favor - pediu Raquel com sua voz suave e olhar atento. Mais á vontade,Alexandre iniciou: - Anos atrás, por uma oportunidade de emprego,eu fui trabalhar em outra cidade.O salário era ótimo,mas a viagem diária seria cansativa,quase impossível de suportar.Foi aí que eu e mais três colegas alugamos uma casa e passamos a morar juntos.Ganhei um bom dinheiro.Fiz uma excelente economia e, no final de uns quatro anos,retornamos. Quando regressei,não consegui mais ir morar com meus pais.Ficou estranho. Com a desculpa de querer morar mais perto do serviço,eu e os mesmos amigos alugamos um apartamento e voltamos a morar juntos. Dividíamos as despesas e pagávamos também uma empregada para cuidar das coisas. Nessa época,comecei a namorar firme uma moça que já conhecia há alguns anos,pois ela morava próximo da casa dos meus pais. A essa altura da conversa,Alexandre engoliu a seco e se deteve. Suspirou profundamente,esfregando suavemente as mãos,e só depois prosseguiu: - Nosso namoro era sério. Depois de alguns meses ficamos noivos ... -Após breve pausa,continuou: - Com o dinheiro que economizei,comprei um apartamento.Apesar desse imóvel ser novo,acreditamos que uma pequena reforma seria necessária para o termos a nosso gosto. Meu pai tem uma boa condição financeira e a reforma seria o seu presente de casamento.Ele me ajudou muito. Alexandre fez longa pausa. Raquel o olhava firme e percebeu que seus olhos brilhavam ,quase se empoçando em lágrimas,quando ele disse: - Eu a amava muito.Muito mesmo. Apaguei-me tanto a ela que em tudo pedia sua opinião.Eu acreditava que não poderia viver sem a Sandra. Marcamos a data do casamento,enquanto mobiliávamos o apartamento.Nessa época eu ainda morava com meus colegas. Entre eles,um era muito especial. Amigo mesmo.Seu nome era Julio. Raquel estava atenta e não se incomodava com as pausas que ele fazia,cada vez mais longas. - Um dia - tornou Alexandre, com voz grave - , percebi Sandra muito diferente. Nervosa.Não me importei ,achei que fosse por alguma coisa com a mobília que haviam entregado errado. Sabe como é, toda noiva fica exigente e Sandra não seria diferente. Passados uns dois dias,estávamos no apartamento em que eu morava junto com os colegas e eles não estavam.Sem que eu esperasse,ela falou: " Estou grávida". Foi um choque! Um susto!- nesse instante,Alexandre sorriu e confessou: - Verdade.Fiquei feliz mesmo.Eu abracei,a beijei.Eu estava contente ... Realizado! Percebi então sua frieza e indiferença.Sandra não estava contente.Ela ficou nervosa. Afastando-se de mim,ela disse que não queria aquele filho. Conversamos muito e Sandra estava irredutível.
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Um motivo para viver
EspiritualRaquel nasceu em uma fazenda,numa pequena cidade do Rio Grande do Sul.Morava com o pai,a mãe,três irmãos e o avô,um rude e autoritário imigrante clandestino da antiga Polônia russa. Na mesma fazenda,mas em outra casa,residia seu tio Ladislau,com a m...