Rapidamente ela tomou um banho e se aprontou para dormir sem jantar.
Deitada em sua cama,Raquel não conseguia adormecer,pensamentos e emoções inebriados de melancolia e insegurança passaram a lhe corroer a alma.
" Será que agi corretamente" perguntava em pensamentos. "Eu não tenho alternativa. É meu irmão!" justificava." Depois,Marcos foi a única pessoa que me ajudou quando eu mais precisei. Não posso deixá-lo sem amparo em um momento como esse" Os pensamentos de Raquel corriam céleres,pois ainda havia inúmeras dúvidas na decisão já tomada. " Será difícil conviver com Alice. Mas, por Marcos,eu tenho de suportar.Devo-lhe muito!" Após breve pausa,tornava ela: " Prometo,a mim mesma, tolerar Alice.Não dar ouvidos às suas implicâncias. Deixarei ela falar e até brigar sozinha.Será por pouco tempo". E,assim,Raquel passou á noite convencendo-se de que aquela decisão que tomara para ajudar o seu irmão,cedendo espaço em sua casa,foi a melhor. E insistindo para que os planos positivos ocupassem seus pensamentos, sem perceber,ela não conciliaria o sono até amanhecer. Enquanto isso,na residência de Marcos,Alice reagia com extrema revolta à situação que já era difícil. Ela parecia estar envolta por uma aura de labaredas,uma vez que, levada por irresistível força,a pobre mulher não conseguia se conter,aos gritos,expunha ao esposo seu parecer. - Eu não acredito! - dizia Alice com voz estridente,franzindo o semblante e exibindo sua insatisfação. - Morar com sua irmã pela sua incompetência! Era só isso o que me restava. Eu não posso aceitar uma coisa dessas,Marcos!!! Caminhando de um lado para outro da sala,Alice parecia alucinada tamanha era sua revolta e indignação. O silêncio de Marcos a incomodava. O homem estava cabisbaixo,desalento e sem argumentos que pudesse animar aquela situação. Em virtude da ausência de palavras do companheiro,Alice, andando de um lado para o outro feito um animal enjaulado,continuou a reclamar: - O que será que fiz para pagar tanto pecado assim ? Veja só a que ponto chegamos! Viveremos á custa de sua irmã! bastasse, agora nem teremos onde morar. - Depois de pequena pausa,Alice diminuiu o tom de voz reclamando de forma estridente: - Já levamos uma vida pobre e miserável,enquanto muitos por aí se esbaldam no luxo e no prazer , não temos nem o que vestir. Às vezes pergunto se Deus existe mesmo,porque não suporto sofrer tanta injustiça. Ao cabo de alguns momentos,procurando reconfortar a esposa,Marcos manifestou-se de forma esperançosa. - É só uma fase,Alice.Isso vai passar.Vai dar tudo certo. Enérgica sem poder conter-se, Alice reagiu: - É só isso que escuto de você: " Que é uma fase! Que tudo vai passar!" No entanto,você nada faz para melhorarmos de vida. Desde quando saímos do Rio Grande do Sul escuto isso. - O que você quer que eu faça? - Se vira!!! - gritou Marcos. - Só seu assaltar um banco! O que você quer que eu faça? A crise é no país todo! O governo não oferece boas condições de vida,os políticos roubam, as escolas não prestam! De você, Alice só escuto reclamações! Estou desesperado,também! Somente a Raquel me escuta sem me criticar,além do mais é única que está tentando, de alguma forma me prestar uma ajuda. - Por que você não pede um aumento? Reclama um pouco também. - Pro inferno,Alice! Você e suas opiniões malditas! Dois já foram demitidos só no meu setor, essa semana.Quer que eu seja o próximo? Em meio à discussão que se fez,Alice se deixou dominar pela revolta e, impensadamente,murmurou: - Não sei como fui me casar com um cara tão cretino como você. Apesar do tom baixo de voz, o esposo ouviu com clareza aquela opinião infeliz. Marcos aproximou-se de Alice e com as mãos gélidas pelo suor frio, segurou-a com firmeza pelo braço e,sem desviar o olhar,agora furioso,e com a garganta ressequida,ele falou com voz trêmula,exigindo: - O que disse? - Sem aguardar que ela repetisse,com o semblante sisudo, encorporando a voz em tom baixo e pausado,ele prosseguiu: - Se desejava um marido rico,deveria ter visto isso antes. Você não é tão grande coisa assim para ser tão exigente . Além do mais,Alice - destacou Marcos ainda com voz de desdém -, você é uma pessoa improdutiva. Alias, mais incompetente do que eu. Ao menos eu trabalho. Ganho pouco pelo que faço,mas ganho. Quanto á você, Alice,vive dependente,á minha custa e reclamando! Se não fosse por esse cretino aqui, você morreria de fome,pois nem pra faxineira presta, ninguém a suportaria.
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Um motivo para viver
EspiritualRaquel nasceu em uma fazenda,numa pequena cidade do Rio Grande do Sul.Morava com o pai,a mãe,três irmãos e o avô,um rude e autoritário imigrante clandestino da antiga Polônia russa. Na mesma fazenda,mas em outra casa,residia seu tio Ladislau,com a m...