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Jane Petter

Após várias horas de viagem, finalmente pousamos no Japão. Descemos do avião e seguimos em direção à saída do aeroporto. Caminho pelos corredores com uma expressão vazia, como se a dor tivesse me engolido por completo. Observo as pessoas ao meu redor, felizes e caminhando lado a lado, como se o mundo tivesse escolhido a dedo os privilegiados. Meu olhar se fixa em Megan e Donato, que seguem de mãos dadas, trocando olhares apaixonados.

A certa distância, avisto um casal se aproximando. Conforme eles se aproximam, reconheço meu irmão e Anastácia. A loira solta a mão de meu irmão e corre em minha direção, seus olhos marejados de saudade.

— Morri de saudades! — diz com a voz embargada, abraçando-me apertado. — Feliz aniversário, cunhadinha.

Anastácia está ainda mais radiante, sua gravidez a deixou ainda mais bela, suas bochechas estão mais cheias e ela ganhou um pouco de curvas.

— Minha vez! — Nath exclama, me abraçando forte. Seu sorriso transborda alegria ao me reencontrar. — Feliz aniversário, irmãzinha.

— Feliz aniversário, bobinho! — brinco, apertando suas bochechas.

Percebo que Megan, Donato e Anastácia estão cochichando afastados. Tento me aproximar para ouvir a conversa, mas eles mudam de assunto rapidamente, deixando-me curiosa. Anastácia puxa as mangas da blusa, um gesto que notei que ela faz quando está preocupada com algo.

— Vamos lá? Tem uma festa enorme nos esperando, irmãzinha — meu irmão diz impaciente, passando a mão sobre meus ombros e indicando o caminho até o carro.

Caminho ao lado de meu irmão, que está radiante de felicidade. Seu sorriso é encantador. Entramos no carro e ele dirige calmamente, seguindo em direção ao complexo dos Yang. Aproveito para apreciar a bela paisagem ao meu redor. 

Dou uma olhada rápida no celular, verificando que Steve recebeu minha mensagem, mas não há nenhum retorno de sua parte. A ansiedade cresce dentro de mim, mas tento manter a calma enquanto me preparo para a festa que me aguarda.

— Chegamos ao castelo, princesa — Anastácia fala, descendo do carro. 

Percebo que ela disfarçadamente vai com o marido para longe e eles discutem por um tempo.

Enquanto isso, observo a esplendorosa mansão dos Yang. É perfeita para uma criança crescer aqui, com um lindo jardim na frente e uma fonte adorável. Imagino uma versão pequena de Nathaniel e Anastácia brincando alegremente.

— Você está com um sorriso bobo no rosto, irmãzinha — Nathaniel diz, roubando a mala que carrego. — Vou te levar ao seu quarto, para que possa tomar um banho relaxante de banheira e depois aproveitar nossa hospitalidade.

Sigo meu irmão, adentrando em sua nova casa. Permito-me admirar o ambiente incrível, com uma decoração sofisticada, assim como seus donos. Subo as escadas e, no caminho, reparo nos quadros com fotos do casamento nas paredes.

— Vocês são bregas — debocho, apontando para os porta-retratos. Nathaniel me encara e dá uma piscadinha.

Nathaniel parece avoado e até chegarmos ao quarto de hóspedes ele não fala nada. Adentramos o cômodo e como o restante da casa é decorado em detalhes. Observo que neste específico tem fotos minhas e de meu irmão.

— Sabe quem me deu essa ideia? — pergunta com um sorriso travesso, melhorando seu humor. 

— Não faço ideia de quem seria tão criativo — rio, enquanto meu irmão revira os olhos.

— Seu namorado — ele diz, fazendo com que eu engula em seco, pensando em como Steve reagirá ao descobrir o que fiz. 

Ainda não decidi como vou partir, talvez com sorte consiga resistir mais alguns dias até que a dor diminua.

Antes que eu possa responder, Nathaniel adota uma expressão séria e fechada.

— Preciso que você saiba de algo — ele diz, segurando minhas mãos.

— O que aconteceu? — pergunto, preocupada, segurando firmemente suas mãos.

— Steve está desaparecido, ninguém tem notícias dele... Ele saiu para se encontrar com Edward e perdemos o contato com os dois — ele encara os nós de nossos dedos, e uma dor aguda atinge meu peito.

— Precisamos encontrá-lo — digo, com firmeza, encarando-o.

— Donato acredita que ele esteja em um evento fechado de racha, às vezes ele faz isso... Por isso, antes de tomarmos qualquer atitude alarmante, iremos esperar. Achamos melhor cancelar nossa festa até que ele esteja de volta — diz, acariciando meu rosto.

— Obrigada por isso, irmão — agradeço com sinceridade, dando-lhe um abraço apertado.

Após ele sair cabisbaixo, abro minha mala e retiro a camisa de Steve, abraçando-a e sentindo seu cheiro reconfortante preencher meus sentidos. Caminho até à mesinha que tem no quarto e encontro papel e caneta, decidindo escrever uma carta de despedida. 

Retiro minhas roupas e visto a camisa do homem que, por alguns dias, foi meu porto seguro. Em seguida, dirijo-me ao banheiro e começo a encher a banheira, voltando ao quarto para começar a escrever.

Olá, irmãozinho. Eu sei que deve estar bravo agora. Por favor, não me odeie. Saiba que eu te amo mais do que palavras podem expressar. Perdoa-me por não ser forte o suficiente. 

Anastácia, minha querida amiga e agora cunhada, obrigada pelos anos maravilhosos que passamos juntas. Peço que cuide de meu irmão e do meu sobrinho(a) que está para nascer. Eu já o amo incondicionalmente. 

Donato, meu cunhado querido, eu te amo mais do que posso dizer. Perdoe-me por sempre fugir de suas tentativas de se aproximar de mim. Não sou muito boa em confiar nas pessoas, mas por favor, cuide de Megan. Não a deixe se abater com minha partida. Eu acredito que eu literalmente estarei melhor. 

Steve, por favor, entenda que por um tempo eu pensei que conseguiria resistir. Você me mostrou que gradualmente posso me curar. No entanto, hoje, a maldita dor me dominou. Eu tentarei cessá-la. Obrigada por me fazer amar novamente. Eu partirei, mas levarei você em meu coração.

Meu corpo está tão trêmulo que mal consigo segurar a caneta. A caligrafia fica distorcida, manchada pelas lágrimas que escorrem sem controle. A folha está úmida, testemunha silenciosa do meu sofrimento. Com um nó na garganta, deixo a carta ao lado do celular e tranco a porta do quarto, isolando-me do mundo lá fora. As lágrimas continuam a jorrar, incontroláveis, enquanto minha alma é corroída por uma dor dilacerante.

Caminho em direção à banheira, os pesadelos do meu passado se revolvendo em minha mente. Recordo os momentos de assédio, abuso, agressões físicas e psicológicas que vivi, cada cicatriz se reabrindo em meu coração. Sinto a carga de toda a minha força, a luta constante para sobreviver até o momento presente.

Frente à banheira, desligo a água com mãos trêmulas. Adentro cuidadosamente, sentindo a água envolver meu corpo como um abraço gélido. Enquanto me afundo, uma sensação angustiante toma conta de mim, como se a própria água começasse a invadir meus pulmões. Cada respiração se torna mais difícil, o ar escasso sendo substituído pelo líquido frio. A sensação de afogamento toma conta de mim, trazendo uma mistura de pânico e resignação.

Não há vontade de lutar pela vida, apenas a sensação de que estou sendo arrastada para o abismo. Os olhos fechados, lágrimas se misturam às águas, enquanto a escuridão envolve meu ser. Aos poucos, a consciência se esvai, diluindo-se na escuridão da água que agora se torna a minha prisão.


Continua...

OS RISTRETTOSOnde histórias criam vida. Descubra agora