Capítulo 24

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Fechei por alguns segundos os olhos e parece que tudo voltou a minha mente como pequenos flashes. A música alta, o sorriso nos lábios, e por alguns segundos de distração veio o caminhão. Ele atingiu em cheio toda a lateral do carro do passageiro e eu não pude fazer nada, era uma médica que não pode salvar a vida das pessoas mais importantes da minha vida.

Minha mãe havia morrido na hora.

Encostei minha mão no vidro, sem coragem de entrar. Lembrei-me do motorista imprudente e bêbado que dirigia o caminhão, não sofreu sequer um arranhão. Eu, a motorista distraída que poderia ter evitado tudo isto de alguma forma, saí com alguns cortes, uns ossos quebrados e algumas cicatrizes que não doíam mais e que marcavam minha pele, além de outras que ninguém podia ver, mas marcavam minha alma e doíam mais do que qualquer outra dor.

Ia virar-me e colidi com Rodrigo que se aproximava. De algum modo ele me abraçou e eu aceitei seu abraço. Era a primeira vez que isto ocorria desde o acidente.

- Onde está Alfonso? – Disse me desvencilhando de seu abraço, que por poucos minutos ele fora reconfortante e em seguida fora algo que me incomodava.

- Está no quarto com o menino, imaginei que iria te encontrar aqui. Fazia muito tempo que não vinha e agora é o segundo dia consecutivo.

Neguei para ele, tentando negar para mim mesma, mas era verdade.

- Você vem aqui?

- Todos os dias, duas vezes por dia ao menos?

- Por dever?

- Por culpa. – Ele então se afastou.

Entendia exatamente o que ele queria dizer, e dando o assunto por encerrado, sequei meu rosto limpando as lágrimas e fui para o quarto onde Miguel estava internado. Ao chegar lá, soltei um sorriso.

Alfonso estava com Miguel no colo, o embalando, com um brilho no olhar. Agora provavelmente tranquilo por seu filho estar fora de perigo.

- Como ele está? – Me anunciei.

- Está bem melhor. Obrigado Anahí...

- Pelo que?

- Por ter salvado meu filho, por não tê-lo deixado morrer. Eu não sei o que seria de mim sem ele. – Ele deu um beijo na testa do menino e voltou a deixa-lo no berço, em seguida se aproximou de mim. – Você estava chorando? – Disse reparando em meu rosto inchado.

- Não. – Menti.

- Por que sempre mente para mim? Ontem percebi que ficou abatida quando foi resolver seu problema, e agora se afastou de novo e volta com os olhos vermelhos de tanto chorar. Tem alguém que você gosta que esteja hospitalizado?

- Na verdade sim. – Meus olhos marearam novamente contra minha vontade. – Mas não quero falar sobre isso.

- Existem muitos assuntos aos quais não quer conversar. Por que não desabafa? Às vezes faz bem. – Ele então se aproximou de mim, o suficiente para que eu sentisse o calor de seu corpo, mas recuei, dando um passo para trás.



O mendigo ✖ AyA {finalizada}Onde histórias criam vida. Descubra agora