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[ 29 de dezembro, quarta-feira ]




   — Oi, Ari.

  Termino de repôr os copos descartáveis e me viro a tempo de ver o garoto de olhos coloridos se acomodar num dos bancos altos e apoiar os cotovelos no balcão. Aliso o avental, limpando uma sujeira inexistente da palma das mãos, e sorrio.

  — Oi, Lys. Quer pedir alguma coisa? 

  — Ah, não, obrigado. Eu comi com o meu irmão — ele faz um gesto de recusa com a mão. — Só vim fazer uma visita. Estava entediado, e Leigh teve que ir trabalhar.  

  — Oh, ok. Não sei se vai encontrar muita diversão por aqui, mas pode ficar o quanto quiser. 

  — Valeu. Cadê o Keith?

  — Ele não vem hoje, vai fazer uma colonoscopia. Vou ter que cuidar de tudo sozinha por aqui, espero que não haja problemas — levanto as sobrancelhas, comprimindo os lábios. 

  Como se o universo tivesse me ouvido e estivesse apenas esperando para me sacanear um pouco mais, um grupo de adolescentes passa pela porta em meio a conversas e risadas altas e ocupam uma das mesas à janela. São quatro garotos e duas garotas, talvez um pouco mais velhos, e só preciso observá-los por meio segundo para saber que são do tipo problemático. Não costumamos ter problemas com fregueses, mas vez ou outra aparece alguém para nos dar dor de cabeça. 

  — Maravilha — digo entredentes. 

  — Será que tem alguém aqui para nos atender? — um dos rapazes grita, olhando ao redor de maneira debochada. Ele tem cabelos pretos e olhos castanhos. — Que tal você, gata? Ou está aqui só para nos proporcionar uma boa vista enquanto comemos? 

  Fecho as mãos e solto o ar com força pelo nariz. Estou prestes a dar a volta no balcão quando Lysandre me para.

  — Deixa comigo — ele diz. 

  — Você não trabalha aqui, não posso deixar que faça isso.

  — Eu sei, mas não gostei do jeito daqueles caras — ele olha por cima do ombro, na direção da mesa, depois para mim novamente. — Ninguém vai saber.

  Eu não deveria, mas entrego o bloco de notas e o lápis para Lysandre e o observo se afastar. Esses garotos são uns encrenqueiros e se decidirem fazer algum tipo de gracinha, ao menos Lysandre poderá se defender melhor do que eu. Embora não seja musculoso, ele é grande e tem ombros largos, e parece um pouco intimidante quando fecha a cara. 

  — Posso anotar seu pedido? — Lys pergunta, a voz calma e firme, o lápis preparado entre o polegar e o indicador.

  — Esse é seu trabalho, não é? — o mesmo garoto de cabelo escuro responde, folheando o menu com rispidez. — Quatro cheese burgers com fritas, quatro cervejas, dois milkshakes de baunilha e dois sanduíches de peru. Rápido. 

  — Vou precisar da identidade.

  — Por que? Você é da polícia, por acaso?

  — Política do estabelecimento. 

  — Política do estabelecimento — o rapaz caçoa. — É claro que um mauricinho como você seguiria esse tipo de idiotice — ele tira a carteira do bolso, pega a identidade e a entrega ao Lysandre. — Satisfeito? Vai querer falar com a minha mamãe também?

  Lysandre não responde a provocação, apenas devolve a identidade e se afasta. Entrego as anotações ao cozinheiro e enquanto esperamos que a comida fique pronta, o grupinho fala e ri e xinga alto, como se estivesse em um bar. Ainda bem que não há outros fregueses no momento. Acomodo o pedido todo em duas bandejas — comida em uma, bebidas em outra. 

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