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[ 29 de maio, quinta-feira ]






  Me encontro no meio do fogo cruzado logo que chego na casa dos meus pais. Ariana está discutindo com a mamãe e o papai, e não rola nem um ' oi ' antes de ela apontar em nossa direção e dizer:

  — Vocês não tentaram empacar a Ari quando ela decidiu morar com o namorado!

  — Não?! — Castiel soa mais alto e indignado do que provavelmente pretendia, mas não se acanha quando toda a atenção se volta para ele. — Não sei em que universo você tem vivido nos últimos tempos, cunhadinha, mas nós fomos muito empacados. Tipo, pra cacete. Muito mesmo. Não fomos?

  Ele olha para mim como se buscasse uma confirmação, mas eu apenas desfiro alguns tapinhas compreensivos em seu braço.

  — O que está rolando?

  — Eles estão tentando me impedir de me mudar com o Lysandre para Stanford — minha irmã explica, cruzando os braços e fechando a cara.

  Já vi esse filme antes. Fui protagonista dele.

  — Tudo o que estamos dizendo é que é imprudente fazer isso nesse momento — papai diz calmamente, embora pareça bastante estressado. — Nós adoramos o Lysandre, mas vocês não têm dinheiro. Pretende morar onde? Ele terá um dormitório. Antes de se mudar, precisa arranjar um emprego.

  — Oh, então nada do argumento " vocês estão juntos há pouco tempo "? — Castiel pergunta com um sorrisinho implicante. — Foi o que usaram com a gente.

  — Não começa, por favor — peço. — Por que não espera na cozinha?

  — De jeito nenhum, eu faço parte da família. Quero ver onde isso vai dar.

  — Não faz parte da família oficialmente até que se casem — meu pai alfineta.

  — Eu me casaria agora mesmo, senhor, mas sua filha só está a fim de me foder.

  — Castiel! — esbravejo, ficando quente de vergonha. Passo a mão no rosto e aponto para a escada. — Vai sentar no degrau. E não fale nada.

  Ele me obedece, se acomodando no primeiro degrau e observando a cena com um brilho zombeteiro nos olhos. Todos fingimos que nada aconteceu e voltamos ao problema principal. Já tive essa conversa com a minha irmã e repito tudo o que disse da última vez.

  — Acontece que vai demorar para juntar dinheiro. Vocês sabem que mal passo um dia sem ver o Lysandre desde as férias do ano passado; vou morrer de saudade!

  — Uma separaçãozinha vai fazer bem — mamãe argumenta. — Vocês não nasceram grudados, filha. Arranje um emprego, junte dinheiro e depois pense em se mudar. O mundo não vai acabar amanhã.

  — E se acabar?

  — Então, não terá que se preocupar com moradia.

  Ariana rosna de frustração e irritação.

  — Você não ganhará nada sendo inconsequente.

  — A Ari...

  — Não compare as situações — papai interrompe. — Sua irmã tem um emprego e não se mudou para outro estado. Pode ter sido precipitado, mas foi muito menos imprudente. E aparentemente vai acabar em casamento, o que, sinceramente, não sei se me alegra ou me apavora.

  — Não se preocupe, senhor — meu namorado diz. — Vamos te encher de netos. Somos bons no que diz respeito ao processo de fabricação.

  — Quieto, eu disse!

  Castiel sorri e levanta as mãos em rendição, piscando para mim. Francamente, esse garoto. Não devia tê-lo chamado para vir comigo.

  — Lysandre e eu podemos acabar nos casando também.

  — E isso nos deixaria muito felizes, filha, acredite. Seria ótimo ter um genro decente.

  Faço uma carranca para o meu pai.

  — Mas é preciso fazer as coisas da maneira certa — mamãe toma a palavra. — Não se arrisque sem necessidade.

  — E se nosso namoro não sobreviver a distância? — Ariana pergunta baixinho, como se estivesse falando consigo mesma.

  — Não sofra por algo que não aconteceu. Não dá para prever o futuro, filha, a vida é cheia de reviravoltas.

  — Eu sou uma prova viva disso — concordo. — Quem imaginaria que eu seria a primeira a sair de casa? E para morar com um namorado, que era o garoto que eu mais odiava no mundo? O futuro pode surpreender tanto positivamente quanto negativamente.

  Minha irmã suspira e deixa os ombros caírem.

  — Eu vou para a cama. Não quero mais falar sobre isso hoje.

  Castiel se levanta para que Ariana passe, então nós quatro ficamos em silêncio por vários segundos. Mamãe suspira pesadamente e o papai segura sua mão. Acho que ela não devia passar por esse tipo de estresse estando grávida, mas não condeno minha irmã. Pelo menos nossos pais não querem que ela se mude por conta de dinheiro, não porque acham que o namorado dela é um marginal.

  Castiel assobia.

  — Que situação — diz. — Lembro quando éramos nós tendo essa briga. Bons tempos. Senhora Greene, eu trouxe um presente para o bebê.

  — Oh? Mas ainda é tão cedo.

  — Tudo bem, é unissex — ele enfia a mão no bolso do moletom e pega um pequeno embrulho do qual eu não tinha conhecimento. — Vi na farmácia enquanto comprava cam... um xarope... e não resisti. Seu bebê vai ser o mais maneiro da creche.

  Mamãe pega o embrulho com curiosidade e o abre cuidadosamente, revelando uma chupeta preta com spikes. Levanto as sobrancelhas, contendo um sorriso. É fofo e inesperado.

  — Que... diferente — ela diz, inspecionando a chupeta, depois sorri. — Obrigada, Castiel. Foi muito atencioso da sua parte.

  Castiel apenas acena com a cabeça. Como não amar esse homem?

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