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[ 04 de abril, sábado ]



    Acordo com a porta do quarto abrindo. Não sei que horas são, mas é sábado e não pretendo sair da cama tão cedo. Sequer me movo ou abro os olhos enquanto Ariane se move pelo quarto. Ela deve ter acabado de voltar do encontro com sei-lá-quem da universidade, e espero que volte para debaixo da coberta também. Adoro nossas manhãs preguiçosas nos fins de semana — isto é, quando Keith não aparece de surpresa. Eu deveria trancar aquele cara num depósito por aí e jogar a chave fora, só pra ter um pouco de sossego.

    Então ouço um som que me deixa imediatamente em alerta. Espero um segundo para ter certeza, e ouço de novo. Me levanto tão rápido quanto um tiro. Ariane se vira, assustada, com lágrimas escorrendo sem parar pelas bochechas. Corro até ela, preocupado, e seguro seu rosto entre as mãos. Detesto vê-la chorar, embora ela fique uma gracinha com o nariz vermelho.

    — Amor, o que aconteceu? Está machucada?

    — Não — a resposta sai em meio a um soluço. — O cara da universidade disse que minhas fotos são totalmente amadoras, que não tem certeza se eu levo jeito pra coisa e se o curso pode me ajudar. Ele basicamente disse que só consegui um contrato com a i-D porque a revista também é de baixa qualidade, e sugeriu que eu tentasse outro curso.

    Cada palavra entrecortada por soluços quebra meu coração e me deixa extremamente puto ao mesmo tempo. Como alguém, quem quer que seja, se atreve a ser tão cruel com a minha garotinha? Como esse filho da puta ousou pisar nos sonhos dela dessa forma? Fazê-la duvidar de si mesma?

    — Você sabe que isso não passa de idiotice, não é? Você é fantástica. Talvez seja amadora porque não tem nenhuma formação, mas isso não te torna menos talentosa.

    — Mas ele é um profissional. E se tiver razão?

    — Não, nem pense nisso. Ele não tem merda de razão nenhuma. Que tipo de profissional desencoraja outras pessoas? Ele deve ser só um velho frustrado, descontando a infelicidade nos outros. Esse encontro não determina se você foi aceita ou não, né?

    Ariane funga e nega com a cabeça, secando o rosto com as mangas da blusa.

    — Só vou saber em Maio, vão enviar uma carta. Só que não tenho mais muita esperança.

    — Para, Greene. A universidade não deveria te avaliar pelas notas e histórico escolar? Que diferença faz suas habilidades como fotógrafa? O curso não serve justamente pra te ensinar?

    — Eu mostrei algumas fotografias. Me senti tão humilhada! Não sabia onde enfiar a cara, queria chorar lá mesmo.

    Ela desaba outra vez e se enterra em meus braços. Fico em silêncio, apenas abraçando-a, acariciando seu cabelo e deixando-a chorar tanto quanto precisa. Acho que nunca vi Ariane Greene derramar tantas lágrimas, e o cara que as causou deveria pagar por isso. Parece levar longos minutos até ela se acalmar. A afasto de mim com cuidado e enxugo seu rosto com as mãos — suas bochechas estão mais vermelhas do que nunca.

    — Melhor? — pergunto suavemente.

    — Só parei de chorar porque minha cara dói. Continuo chateada.

    — Não devia se deixar abater por causa de um imbecil qualquer.

    — Não posso evitar, tá bem? Sempre me orgulhei das minhas fotografias, aí chega alguém e diz que elas são uma porcaria. Como você se sentiria se dissessem isso sobre sua música?

    — Greene, sempre vai existir uma pessoa que não vai apreciar sua arte. Isso não significa que ela não é boa. Todos ao seu redor já disseram que você é fantástica. Vai mesmo ficar pra baixo porque uma pessoa disse algo negativo?

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