[ 26 de setembro, quinta-feira ]
Por mais que tenha passado boa parte da vida assistindo e lendo histórias de romance, nunca compreendi muito bem a capacidade dos personagens de fazer maluquices por amor. Quer dizer, eu faria muita coisa ridícula pela minha família; mas por um interesse romântico? Não mesmo! Ou era isso o que eu pensava. Eu nunca havia gostado realmente de alguém. É claro que já tive outras paixonites antes, mas elas sempre sumiam bem rápido; isso é, até Lysandre surgir na minha vida. Estou apaixonada por esse garoto há quase quatro meses e, agora, olha só para mim! Estou fingindo ainda estar machucada só pra continuar recebendo atenção. Em um filme isso seria um ato fofo motivado pelo amor, mas aqui, na vida real, me sinto um tanto quanto patética.
A contusão já está bem melhor desde terça-feira à tarde, visto que tomei os cuidados necessários e um soco não provoca danos tão duradouros, mas continuo andando por aí com a mão enfaixada. Tive que convencer meus pais de que ainda não estou recuperada sem deixá-los ver meus dedos, além de fugir de uma ida ao médico. Eu não queria ter que mentir pra todo mundo, mas é necessário para que Lysandre não descubra nada. Também não queria mentir para ele, é claro, por isso prometi pra mim mesma que vou acabar com isso hoje. Amanhã de manhã me livrarei de uma vez por todas dessa gaze. Enquanto isso não acontece, faço o melhor que posso para preparar o pedido de Castiel com uma mão só.
— Por que não dá fim a essa agonia e usa logo as duas mãos? — questiona o ruivo em questão, parado em pé do outro lado do balcão.
— Sofri uma contusão, lembra?
— Pra cima de mim com essa historinha, Greene? — seu rosto assume uma expressão incrédula enquanto me viro com seu copo de café. — Hoje é quinta, essa contusão deve ter sumido há um dia, no mínimo. Você socou uma pessoa, não uma parede. Até parece que quebrou algum osso.
— Acontece que ainda dói. Diferente de você, não estou acostumada a agredir os outros — retruco, recebendo uma risadinha debochada como resposta. — Por que continuaria com o curativo se já estivesse melhor?
— Porque você é idiota. Está a fim daquele ignorante e não tem coragem de admitir, então está usando o machucado pra ganhar atenção. Ou acha que não reparei em como vocês andam grudados ultimamente? E, na boa, ele é tão tapado quanto você se não notou nada de errado.
— Você se acha muito esperto, não é? — tento manter a voz firme para não entregar o jogo. — Aposto que tudo isso não passa de ciúme. Tem inveja do Lysandre porque ele é doce e gentil, e você não passa de um amargurado metido a bad boy.
— Caramba, como adivinhou? Sou assim tão transparente? — ele leva uma mão ao peito com falso espanto. — Se fingir de frágil é um golpe clássico, Greene, mas nós dois sabemos que você não é nenhuma bonequinha de porcelana. Quanto tempo acha que vai conseguir manter essa farsa?
Deixo o pedido completo sobre o balcão, irritada. Maldito Castiel Chase! Por que ele tem sempre que se meter na minha vida dessa maneira? E por que consegue ver tão bem através das minhas mentiras? Tenho plena certeza de que não sou tão fácil assim de ler. Para quem não vai com a minha cara, esse garoto presta atenção demais em tudo o que faço. Eu não deveria permitir que suas palavras me afetassem, entretanto estou me sentindo mais patética agora do que antes.
— Se já acabou de enfiar o nariz onde não foi chamado, são sete dólares.
— Aqui está, garotinha — ele enfia a mão no bolso, tirando a quantidade exata de dinheiro necessário. — Deixe que eu mesmo coloque na caixa registradora. Não quero que force os dedinhos lesionados por minha causa.
Com um último sorriso de escárnio, Castiel deixa o dinheiro sobre o balcão e vai embora. Que ódio! Com o sangue fervendo de raiva, retiro a gaze e a jogo no lixo. Quem aquele garoto pensa que é, afinal? Meu grilo falante da consciência? Como se ele fosse um grande exemplo de ser humano! Keith presenciou toda a cena, inevitavelmente, e sou obrigada a lhe contar tudo quando o mesmo se aproxima para me passar alguns pedidos. Ele compreende o porquê de eu ter feito o que fiz e não fica zangado, mas passo o resto da tarde servindo as mesas para compensá-lo pelos dois dias extras que passei somente atrás do balcão sem necessidade.
A cada segundo mais próximo das sete horas que o relógio fica, vou me sentindo mais e mais nervosa. Sei que Lysandre vai aparecer no fim do expediente para me dar uma carona, e preciso pensar numa boa explicação para dar a ele. Não posso simplesmente dizer que o enganei por atenção; estaria praticamente confessando meus sentimentos e isso não é uma opção. Não preciso encarar uma rejeição nesse momento. Fico tão focada tentando inventar alguma desculpa, que só percebo que a tarde acabou quando Lysandre passa pela porta. Pela primeira vez na vida, ele é a última pessoa que eu gostaria de ver agora. Respiro fundo enquanto o garoto se aproxima, e Keith me lança um olhar confortador.
— Oi, Ari! — Lysandre sorri, parando do outro lado da caixa registradora, de frente para mim. — Como foi seu dia?
— Estressante — confesso, deixando os braços soltos ao lado do corpo para que minhas mãos sejam ocultadas pelo balcão. — O Castiel resolveu aparecer por aqui hoje e me deu nos nervos.
— Vocês não se bicam muito, não é? Embora só tenha visto vocês conversando de longe, notei que sempre rola uma tensão. Nós interagimos poucas vezes, mas ele parece ser meio difícil.
— Difícil? Aquele garoto é um verdadeiro pé no saco — bufo. — Mas já estou acostumada, convivemos um com o outro desde a quinta série. Aprendi como lidar com ele.
— Bom, pelo menos isso — ele sorri outra vez, parecendo um pouco piedoso. — Podemos ir?
— Podemos, mas preciso te contar uma coisa antes — declaro, sentindo o nervosismo com mais intensidade. Levanto o braço direito. — Minha mão já está melhor.
— Que ótimo! Fico feliz que o gelo e o anti-inflamatório funcionaram, estava começando a ficar preocupado. Os sites que pesquisei diziam que esse tipo de contusão dura só dois ou três dias, e já se passou quase uma semana. Mas, espera… — seu rosto se contorce em confusão. — Hoje, na escola, você disse que ainda estava com dor. Como pode ter melhorado tão rápido?
Oh, deuses, é agora! Chegou a hora de me humilhar na frente do garoto dos meus sonhos. Meu estômago está tão agitado, que sinto que pode sair pela minha boca a qualquer segundo.
— É-é que, na verdade, estou melhor desde terça-feira. O inchaço e a marca roxa sumiram na segunda, mas meus dedos continuaram doloridos até terça à tarde.
— Então, mentiu pra mim? Por quê?
— Porque… porque eu gostei de passar tempo contigo e achei que, se você não visse mais necessidade, isso acabaria — falo rápido, desviando o olhar e sentindo meu rosto arder de vergonha. Não é a verdade completa, mas também não é mentira.— Foi uma mentira estúpida e eu não devia ter feito isso. Me desculpe.
Para a minha surpresa, Lysandre dá uma risadinha. Eu não esperava que ele fosse gritar comigo nem nada do tipo, mas rir? Acho que meu papel de boba foi maior do que imaginei. Levanto a cabeça, confusa. Apesar do riso, ele não parece estar caçoando de mim.
— Qual é a graça? — pergunto, franzindo o cenho.
— Nenhuma, é que você é uma graça. Não foi legal mentir, é claro, mas o motivo é fofo — ele estica o braço e aperta meu ombro, me fazendo corar. — Se queria que passassemos mais tempo juntos, era só dizer!
— Então... Não está zangado?
— Uh-uh — Lysandre nega, balançando a cabeça de um lado pro outro. Solto um suspiro aliviado. — Podemos ir, agora?
Digo que sim, me sentindo mais leve e um bocado menos envergonhada. Castiel fez com que eu me sentisse mais estressada que o necessário por conta dessa história, afinal. Ou talvez a tensão pré-menstrual faça tudo parecer pior do que realmente é. Tiro o avental e me despeço de Keith, seguindo Lysandre até o carro de seu irmão. Ainda tenho explicações para dar quando chegar em casa.

VOCÊ ESTÁ LENDO
You
أدب الهواةNOTA: ESSA HISTÓRIA CONTÉM ERROS DE DATA QUE SERÃO CONSERTADOS POSTERIORMENTE - Você me ignorou a semana inteira - reviro os olhos. - Sua amiga deve estar te esperando. Vai embora. Tento fechar a porta, mas meus movimentos estão lentos demais, ent...