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[ 27 de fevereiro, domingo ] 




  Acordo assustada e confusa com batidas insistentes na porta da frente. Saio da cama descabelada, descalça e vestindo um pijama vergonhosamente curto porque estava quente demais na noite passada. Levo um ou dois segundos para me lembrar de onde estou. As batidas continuam até eu finalmente abrir a porta. Keith está parado do outro lado, segurando um panfleto laranja nas mãos. 

  — Tenho ótimas notícias! — exclama, passando por mim. 

  — Que horas são? — pergunto preguiçosamente, com a voz rouca. 

  Keith não precisa responder, pois Castiel aparece na porta do quarto, reclamando: 

  — Que tipo de pessoa perturbada aparece na casa dos outros às sete horas da manhã de um domingo?

Foi mal, sei que está cedo, mas fiquei ansioso para te mostrar isso — ele segura o panfleto de forma que o ruivo possa ler o que está escrito. — Vai rolar uma batalha de bandas na casa de shows em duas semanas, e a participação é gratuita. O prêmio é um vale-presente do D&B e a oportunidade de gravar uma demo profissional! 

  A irritação do Castiel passa no mesmo instante. Ele chega mais perto e tira o panfleto das mãos do Keith para le-lo melhor. Sua boca forma um pequeno O e os olhos ficam levemente arregalados. Castiel desvia a atenção para mim, e eu lhe ofereço um sorriso empolgado, então ele se volta pro amigo.

  — Eu te amo e te odeio nesse momento. 

  — A gente vai se inscrever, né? É a oportunidade que estávamos esperando! 

  — É óbvio que vamos nos inscrever. E vamos ganhar. Caralho, uma demo profissional seria perfeito, poderíamos mandar pra alguma gravadora. 

  Fico feliz por vê-los felizes e animados, porém… 

  — Que dia vai ser a batalha? — pergunto. 

  — Dia treze. Algum problema? 

  — Castiel só vai tirar a tipóia no dia vinte e três.
 
  — Não vou deixar isso atrapalhar — Castiel determina. — A fratura já estará bem melhor até lá. Posso me apresentar. 

  — É assim que se fala! — o loiro encoraja, então abraça o ruivo pela cintura e o tira o chão, o chacoalhando para cima e para baixo. 

  — Tire as mãos de mim, seu merdinha abusado! 
  Solto uma gargalhada. Keith o coloca no chão novamente, recebendo um empurrão. Ele pega o panfleto das mãos do Castiel. 

  — Vou mostrar isso pros outros caras. 

  Ele se dirige até a porta, beijando minha bochecha no caminho. Assim que Keith vai embora, Castiel me pega desprevenida com uma enchurrada de beijos pelo rosto e pescoço, me fazendo rir. 

  — Que bom que está animado — digo, sorrindo.
 
  — Animado?! Isso pode ser o começo para uma carreira grande. Podemos começar a faturar de verdade com a música, assim não vou precisar arranjar outro emprego. 

  — Tenho certeza de que serão a melhor banda da competição. A Crowstorm saiu na i-D, não dá para competir com isso. Os outros não terão a menor chance. 

  — Espero que esteja certa. Sair na i-D não deu o impacto que esperávamos, embora tenhamos conseguido mais seguidores no Instagram. 

  — E algumas tietes também. 

  — Não precisa ficar com ciúmes, Greene, você sempre será minha tiete preferida. 

  Faço uma careta. 

  — Não seja idiota. 

  — Mas é só o que eu sei ser — sorri. — E aí, quer tomar café ou voltar pra cama? 

  — É domingo, com certeza quero voltar pra cama. 

  — Então, vamos. Só uma pergunta: está com raiva de mim por alguma coisa? 

  Franzo o cenho. 

  — Não. Por que a pergunta? 

  — Porque, com esse pijama, parece que está tentando me castigar. 

  — Fez muito calor à noite. Nem tudo é sobre você, sabia? — empurro seu ombro bom. 

  Sigo para o quarto, e ouço Castiel soltar o ar pela boca atrás de mim. 

  — Vinte e quatro dias — murmura. — Mais vinte e quatro dias. 

                                         °

  — Tem certeza de que consegue se apresentar com essa coisa? — Jake pergunta, cutucando a tipóia. 

  — Acho que até o dia da batalha já poderei mover o ombro mais livremente — Castiel responde, tomando um gole de cerveja. Ele pode beber, agora que deu um tempo dos analgésicos. — Não tem nem uma semana direito e a dor já diminuiu bastante. 

  Os garotos ficaram bastante empolgados com toda a história da batalha de bandas, então os convidamos para vir ao apartamento para beber alguma coisa e, no geral, apenas aproveitar um tempo de qualidade juntos. O único que não chegou ainda é o Keith. 

  — E quanto a você, Primeira Dama? — Mark pergunta. Ainda acho graça do apelido. — Estressada com a faculdade? Fiquei sabendo que as inscrições já começaram. 

  — Passei três noites escrevendo a redação. Você é um universitário, tem algum conselho pra dar?
 
  — Não, desculpa. Ainda não sei como passei na entrevista. 

  — Que tipo de pergunta eles fazem? 

  — É quase como uma entrevista de emprego — Jake diz. — Como foi quando começou a trabalhar no Hummingbird? 

  — Bom, foi durante o verão. O movimento era alto e eles estavam desesperados, então eu só disse que estava procurando trabalho e fui contratada. 

  — Puxa… Queria que minha vida fosse fácil assim. 

  Alguém bate na porta, e me levanto para abrir. É o Keith, como esperado. Ele não parece tão empolgado quanto estava pela manhã. 

  — Tudo bem? — pergunto, deixando-o entrar. 

  — Está, é só que apareceu um rato em casa e minha mãe vai mandar dedetizar tudo. A equipe de dedetização só conseguirá ir no sábado, mas ela não quer que usemos a garagem enquanto o rato não for exterminado. 

  — O que? E onde vamos ensaiar? — Jake se levanta, exasperado. — Não podemos participar de uma competição sem ensaiar. É um prêmio importante, temos que estar preparados. 

  — É, quem liga pra uns ratinhos? — Mark entra na conversa. 

   — Ela proibiu, e vocês conhecem a minha mãe. É melhor não desafiá-la. 

  — Cacete — Castiel reclama. — O que vamos fazer? Keith é o único que tem uma garagem. A menos que… — ele olha para mim. — Você tem uma garagem. Quer dizer, seus pais têm. 

  Quatro pares de olhos me encaram esperançosamente. 

  — H-huh, foi mal, não acho que meus pais gostariam de ter uma banda ensaiando na garagem. Principalmente minha mãe, que fica em casa o dia todo. 

  — Que droga — Jake suspira. — E agora? 

  Mordo o lábio diante dos rapazes, agora, desanimados. Tem que haver uma solução. Eles não podem ter as chances de vencer diminuídas por causa de um roedor. Começo a pensar. 

  — Qual é, galera, não tem nenhum outro lugar onde possamos ensaiar? 

  — Tive uma ideia — anuncio, me aproximando deles. — Conheço alguém que tem uma garagem e provavelmente não se importará em ajudá-los. 

  — Quem? 

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