|Cap. 6|

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Desço a escada com um belo vestido de cetim azul claro e fitas brancas rumo à sala de jantar, passo pelo salão principal e mais algum outro cômodo sentido à ampla sala, assim como todos os outros poucos cômodos, que ficam mais ao fundo da residência e próximo a cozinha. É um ambiente bem iluminado, com enormes portas duplas de madeira maciça e sem muitos móveis, a não ser uma mesa com espaço para 12 cadeira, louças ricamente decoradas, talheres da mais brilhante prata e um puro e bonito linho branco que a decoram. Me sento em uma das cadeiras que dão de frente à enorme porta e espero aos outros possíveis acompanhantes.

Após alguns minutos, tempo que me perco observando o cuidado, simplicidade e presteza dos empregados na disposição dos utensílios de mesa, posso ver claramente André que puxa um pobre e magro Gaspar pelo braço rumo a entrada do salão enquanto segue esbravejando impaciente.

— Criança irritante! Vamos, Guez, não me faça te colocar por sobre os ombros como um saco de batatas e lhe jogar naquela cadeira. — diz carregando forçosamente um Gaspar inquieto e o empurrando para uma das cadeiras à minha frente para logo sentar ao seu lado.

— O que acontece? — pergunto curiosa.

— Me desculpe, Cunhadinha! Esse moleque está com vergonha de sentar à mesa conosco, daí todo esse trabalho. — André diz apontando com os olhos injetados para um Gaspar silencioso, enquanto que, com as mãos, puxa o pequeno pedaço de linho delicadamente bordado e o deposita no colo do rapaz. É um gesto carinhoso e atencioso, um cuidado de irmão mais velho que, mesmo irritado ou enfurecido pelas atitudes infantis do mais novo, ainda se preocupa com sua comodidade e bem estar. É um amor único e bonito que aos meus olhos toma todo ambiente, um gesto pequeno que envolve meu coração e me faz invejar tal atenção. Estes dois homens me ensinam em todos os momentos sobre cuidado, respeito e união. Me ensinam sobre amor velado e o compartilhar. Me ensinam que coisas bonitas existem e que as mereço. Me ensinam que mesmo com tamanha saudade de um Sr. Sombrio, eu preciso de mais do que apenas proteção. Eu preciso e quero um amor que me respeite e se entregue.

— Alexia?! — André chama.

— OH! Me desculpe! — digo envergonhada por me alienar em pensamentos tão inapropriados para o momento. — Mas porque não queria participar do jantar conosco? — pergunto diretamente para Gaspar, numa tentativa de retomar a conversa e dissipar o pequeno embaraço.

— Não acho que seja certo um simples empregado participar de um jantar entre seu patrão e uma dama. — Gaspar responde de cabeça baixa, com suas magras mãos sobre o tecido de linho.

— Não sei qual o problema com você! Sempre dividiu todos as refeições comigo nesta mesa, e sabe muito bem que esta casa é tanto sua como minha, então trate de parar com essas criancices. — André esbraveja, seus olhos com um brilho profundo em seu negro tentador, seus lábios apertados como com vontade de brigar mais. Esses dois vivem entre o amor e o ódio, uma relação complicada e, ao mesmo tempo, de uma ligação forte e incrivelmente sensível. Mas, pelo pobre Gaspar, não é de se estranhar toda essa vergonha que posso ver em seu rosto corado e seus olhos baixos, já que, mesmo com todo tempo que passamos juntos e nossa amizade desenvolvida, o jovem nunca participou ativamente de algo tão íntimo como um de nossos jantares em família. O pequeno soldadinho de ferro de meu querido André parece deslocado em toda essa cena e faz meu coração pesar ao ver que é obrigado a engolir calado esses imperativos para não me ofender.

— Por favor, não vamos mais brigar! Gaspar, hoje é meu primeiro dia nesta terra e gostaria muito de sua presença aqui. — digo na tentativa de acalmar os ânimos dos dois e dissipar um pouco do constrangimento do jovem que consente com a cabeça em tímida aceitação

—Muito bem, já que estamos resolvidos, vou pedir para que Hanna nos sirva. — André se adianta animado ao ver a aceitação de Gaspar, autorizando assim a bela e sorridente empregada a trazer os cheirosos e fumegantes pratos. Há um delicioso pato assado, batatas inglesas rusticas com creme de ervilhas e pasteis variados que completam um jantar simples e delicioso. A aptidão culinária do cozinheiro e o cuidado doméstico que Hanna tem ao nos oferecer esse gostoso jantar são gravados em minha alma, o sabor de cada pedaço e as taças sempre cheias me levam um belo sorriso aos lábios e um aconchego ao coração ainda apertado.

— Minha adorável Alexia que parece apreciar tanto da comida... — André inicia com um sorriso desavergonhado enquanto acrescenta um outro pedaço de pato ao prato de Gaspar. — Ainda não tive a oportunidade de me desculpar por ter lhe abandonado durante a tarde de hoje. Estava um tanto atarefado com os trabalhos de descarregamento que deveriam ser feitos no navio, mas isso não deve ser desculpa. Peço perdão por cometer uma falta tão grande, e que se sinta livre para usar do magricela ao meu lado nos seus passeios de exploração pelo porto.

— Ficaria encantada! — respondo energizada com as possibilidades de exploração do meu novo lar. O belo verde, o caloroso sol e o bonito mar tão próximo me dão uma vontade de apreciar ao máximo o período provisório da estadia.

— Esse pequeno lugar guarda coisas maravilhosas em paisagens encantadoras, tenho certeza que se der a oportunidade certa vai aprender a amar este paraíso tanto quanto Guez e eu. — ele termina com um sorriso acolhedor, e posso sentir em cada palavra dita uma verdade que transborda. Sinto sua ligação com essa terra e com os misteriosos trabalhos de pirataria bem mais do que com os poucos momentos que deslumbrei de sua vida de realeza russa.

— Então irei precisar de um bom descanso já que o dia de amanhã promete grandes aventuras. Gaspar, você pode me acompanhar? Não pretendo te obrigar a fazer as coisas só porque um tal mandão quer. — digo com um sorriso matreiro, enquanto o belo homem à minha frente observa, para logo explodir em um gargalhada deliciosa e contagiante.

— Esta doce Valquíria está me saindo melhor que o esperado! — André termina ainda rindo enquanto me dá uma piscadela.

— Sou uma pessoa que aprende rápido, Capitão! — respondo com outra piscadela cúmplice. — Mas agora devo pedir licença para me retirar, pois ainda preciso escrever algumas cartas aos meus queridos amigos e ao meu avô para não deixá-los preocupados. — continuo antes de sair em um folego.


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