Com amor, H

391 24 2
                                    

Meus queridos Alexia e Mikhail, como devem imaginar, cheguei faz alguns dias na ainda tão desconhecida e absurdamente encantadora Normandia. Acredito não precisar discorrer tanto sobre meus tormentos durante os longos dias de viagem pois, como meu velho irmão bem sabe, tenho um pavor sempre crescente às viagens por terra ou mar. Um pavor absoluto por viagens em geral. Acredito severamente que o negrume das noites em estradas tão abandonadas por Deus não deixa qualquer sensação de misericórdia no coração daqueles que por elas sempre passam, e digo isso mesmo tendo ao meu lado a força de vários homens e a sempre tão gigantesca confiança, ou melhor, ego de um senhor que diz carregar em seus braços a proteção de Thor. Por Deus, meus amados, porque me colocar ao lado de tão irritante homem?!

Mas é esquecendo aqueles pavorosos dias e tentando sempre emplacar em meu coração o amor e a bondade que, espero eu, o divino conseguiu depositar em meu corpo, que embarquei em uma aventura tão desconhecida a mando do grande respeito que tenho por você, irmão, e pelo sentimento honroso que sei que nutre pelo homem que repousa tranquilo nesta mesma casa. Acrescento que nunca vi casa mais linda, nem mesmo o Palácio em Moscou se compara com a simplicidade de uma boa casa rodeada por campos verdes, arvores elegantes, ovelhas pastoradas e cavalos selvagens que correm em larga por aqui. Há uma beleza tão selvagem e decidida que me comove a alma, e são esses momentos de encanto ao qual consigo calmamente, o que é o mais completo oposto dos meus costumeiros estados de espirito, compreender e respeitar um pouco mais ao homem que me trouxe aqui em auxilio.

O dono destas terras, o nosso amigo Viking, me provou ser um homem honrado, um Senhor querido pelo seus e responsável por suas ações. É de se espantar, claro, que com língua tão rebelde este enorme homem possa conter tanta pureza de coração. Mas, como ele mesmo não cansa de dizer, a natureza descontrolada e todos os deuses pagãos que vive citando, e que já não me recordo os nomes, esfriam sua alma vulcânica e abrandam as amarguras que carrega do mundo e, por milagre, o deixam bom.

Porém, mesmo com todo clamor da natureza e, começo a crer eu, da magia doce que emana dos corpos silvestres que rondam este lugar tão especial, confesso que estou abertamente chocada com os comportamentos da casa e, em especial, de uma pessoa que aqui se mantem. Ainda que não consiga colocar em prática todas as regras de uma boa escrita, o saber acumulado de anos de uma seleta educação, retenho perguntas que me atormentam e mistérios que me atiçam, então, me atendo a toda essa necessidade, pergunto ainda calma: meu querido e amado irmão, você me mandou para este território na esperança de educar uma jovem e tímida moça criada em um convento? Pois se foi essa sua delicada intenção, creio que seus enganos se alinham aos meus.

Nada para se alardar por agora, acredito, mas a jovem em questão tem a minha idade e, não querendo ofender esta casa e nem ao digno nome da família, afirmo que seu pobre espirito é o de um verdadeiro selvagem. Não sei se pelo descuido do próprio irmão que tem outras preocupações mais urgentes com seu povo, mas a mulher que se apresenta como a jovem que devo oferecer meus serviços não sabe o significado de um banho, usa trapos, tem os cabelos embaraçados e nunca, nunca mesmo, emite qualquer som que não o de grunhidos animalescos. E o mais chocante, preciso continuar, é que todos parecem não se importar com isso. A casa respira como se essa jovem não existisse, e o que vejo é apenas a tentativa de atender seus estranhos e parcos pedidos para se livrarem de qualquer tormento. Meu irmão, você bem sabe que mesmo não sendo a mais corajosa de todas as mulheres, ainda me sobrou uma fagulha quente de nosso sangue russo. Minha curiosidade se aflora com o meu medo, mas os dias que tenho passado aqui me fazem ter a certeza da necessidade em continuar.

Agora, tentando dar fim com esta carta que me apresenta tão estranha, gostaria de dizer especialmente para você, minha amiga Alexia, o quanto queria lhe desejar coisas lindas para o início da sua vida de casada, porém não consigo deixar de amaldiçoar ao Príncipe que provavelmente está ao seu lado e que, na melhor das hipóteses, me enviou cega para tal tipo de distinta confusão. Queria que estivesse aqui, queria sua força de vontade e suas capacidades físicas para se livrar de todo e qualquer problema, pois acredito que a força bruta seja algo bastante apreciado nessa terra de gigantes.

Com todo amor e uma pontinha de suspeita no coração,

Helena Korcwovski.

Sedução do PríncipeOnde histórias criam vida. Descubra agora