Acasos.

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Reagan

Não consigo me mover.

Estou presa no chão, impossibilitada de dar um passo à frente ou dois para trás. Nada do que estou presenciando pode ser real, deve ser um pesadelo ruim, sem dúvidas ainda estou no quarto, se eu fechar os olhos — e é o que faço — quando eu tornar a abri-los, tudo vai ter desaparecido e acabado. Torno a abrir os olhos e vejo a pior cena da minha vida diante de mim, cruel demais pra que eu acredite na realidade, mas é real, não estou tendo um pesadelo, Bessie está beijando Nadia com uma plateia inteira em torno das duas. Aaron, assim como eu, incapaz de expressar quaisquer sentimento que não seja repulsa, se mantém num canto observando a cena com tanta dor dentro daqueles olhos azuis que a minha dor cumprimenta a sua quando nossos olhares se encontram. Ele sai sem ninguém perceber, sem ninguém se dar conta de sua presença e se perde no corredor atrás dele, caminhando atordoado para o ginásio.

Engulo em seco pra tentar desfazer o nó que se forma em minha garganta, provocando uma dor angustiante da qual vai me fazer desabar se eu pronunciar algo. Logan me observa do outro lado, está prestes a ir atrás do seu melhor amigo que está com o coração partido e não sei como consigo segurar as lágrimas quando ele sibila um "estou aqui" pra mim. O meu cenho se franze e assinto com um gesto de cabeça ao me lembrar do que Meredith me pediu mais cedo antes da prova surpresa de biologia.

Ela tem razão, eu preciso ficar longe de Logan, por mais que ele me faça bem, não quero machuca-lo.

Ouço Carter me chamar, mas ignoro, caminho para o banheiro sentindo meu corpo pesar mais do que realmente pesa, meus pés cansados e fracos me tombam de um lado para o outro. Cambaleando, eu preciso me apoiar nas paredes uma vez ou outra até chegar ao meu destino. Abro a porta do banheiro e na pia, lavo o rosto repetidas vezes, não quero limpar só as lágrimas que caem sem trégua, mas também me livrar dessa casca frágil e quebrada com a qual preciso conviver desde a minha última conversa com Bessie.

Choro, deixo que a dor me invada por completo e me destrua como sempre quis fazer. A deixo vencer, desfazer o que colei com todos os pedaços do que restou de mim e dói. O ardor em meus olhos se manifesta, meu nariz entope e preciso respirar pela boca, mas me engasgo com meu próprio choro e o reflexo no espelho torna a minha dor ainda pior. Quando me tornei essa pessoa não fraca e suscetível? A minha vida tem sido sofrimento desde que nasci, o meu pai me abandonou, a minha mãe é uma viciada em todo tipo de droga e o amor da minha vida não é a pessoa com quem irei construir uma família e ser feliz como sonhava quando criança.

Vale a pena continuar vivendo? Vale a pena eu passar os meus dias tentando ser o que não sou? Fingir sorrisos e emoções o tempo inteiro para que não me perguntem o que está acontecendo? Porque é geralmente isso que acontece quando alguém enxerga uma fração da dor que você carrega, ela se preocupa por um pequeno momento pra no instante seguinte dizer que vai passar. Na minha cabeça, seria melhor desaparecer do que ter que lidar com o que carrego, com a dor que me controla e me faz levantar da cama dia após dia. Tentar pra que? O meu destino é só um: ficar sozinha.

Pelo reflexo do espelho, ainda que com a visão embaçada vejo uma gilete no chão sujo de uma das cabines. Olho para trás, passando minhas mãos trêmulas abaixo de meus olhos para secar as lágrimas que apesar de não cessarem, me permite enxergar um pouco melhor. Agacho-me no chão, observando o metal afiado e reluzente brilhar sobre o piso azul marinho.

O pego para sentir em minhas mãos, está frio.

— Reagan? — a voz de Emilly soa atrás de mim. Levanto a cabeça para olha-la, seus olhos castanhos estão assustados e desviam de mim para o metal cortante em minha mãos, mas oscila quando encaro meus pulsos. — O que está fazendo?

Love AffairOnde histórias criam vida. Descubra agora