Você não quer compartilhar a culpa?

755 51 7
                                    

Reagan

Preciso me aproximar da mesa e sentar, porque meu peito aperta e dificulta a minha respiração. "Seu irmão", ele disse. Eu tenho um irmão. Abaixo a cabeça, estou atordoada com a informação que acabei de receber, minha visão está turva e tudo fica borrado e sem forma. A única coisa que sou capaz de enxergar são as lágrimas caindo no meu colo. Danon aproxima sua mão da minha para tocá-la, para me consolar. Não funciona. É tanta coisa acontecendo que eu não me encontro em condições para digerir tudo; primeiro descubro que meu pai era um monstro, depois que Bessie foi estuprada por ele e que ela dormiu com a mulher que o matou. Nadia surge do mundo dos mortos. Minha mãe está sendo perseguida e ameaçada por traficantes, mas esse problema foi resolvido porque Bessie lhe deu uma quantia considerável para que a minha própria mãe me deixasse em paz, coisa que ela não pensou duas vezes antes de aceitar e ir embora. E pra fechar a lista com chave de ouro; um colega de escola é assassinado, meus tios vão se divorciar, e agora eu tenho um irmão.

Um irmão.

Sustento o olhar para Cal que ainda está com aquele sorriso irritante no canto da boca.

— Ela tem os meus olhos, tio — ele fala balançando a cabeça de um jeito estranho e babaca. — Mas continuo sendo o mais bonitão da família. Não que você seja feia, mas há estudos que comprovam que os caçulas são sempre os mais bonitos.

Desvio o olhar para Danon que contrai os lábios e começa a se explicar:

— Sua mãe não o quis. Cal foi criado pela senhora Wilson e agora vai ficar aqui com a gente, pelo menos por enquanto. — olho de Danon para Cal e vice e versa. — Ele também é filho do John e...

— Tio, você pode me deixar a sós com a minha irmãzinha? — Cal o interrompe.

Danon assente.

Meu tio beija a lateral da minha cabeça e me deixa a sós com Cal. Ele aparenta ter uns quinze anos de idade, seu porte físico é robusto, mas o cérebro parece ser de uma criança de três anos e eu não preciso me esforçar muito para me dar conta disso. O meu irmão arqueia as sobrancelhas e morde o lábio inferior ao se aproximar de mim, puxando a cadeira para sentar à minha frente e poder me olhar nos olhos. Cal respira fundo e apoia os cotovelos na mesa, o que me irrita é que não dá nem mesmo para questionar o seu DNA, olhos cinza são a marca registrada da família Gray.

— Primeiro de tudo: — começo olhando profundamente em seus olhos — Eu não sou sua irmãzinha. Sou mais velha que você, o que faz de você o "irmãozinho" da história. Segundo: não tente se aproximar de mim dizendo que sempre quis ter uma irmã, não vai funcionar. Terceiro: se quiser entrar em contato com alguém deveria ser com a mamãe e não comigo.

— Eu tentei, mas não consegui contato — ele diz, com certo descaso. — E também, o papai sempre me disse que o nome da minha mãe era Dabria. Não conheço Elizabeth Gray, nunca nem soube de sua existência. Só descobri que ela era minha verdadeira mãe depois que a vovó morreu. Você teve sorte. Re-ree — gagueja, tentando pronunciar meu nome.

Reagan — enfatizo. — R-E-A-G-A-N.

— Beth deveria ter lhe dado um nome mais fácil, como Regina ou Rebeca — desconversa. Reviro os olhos. — Mas como eu ia dizendo, você teve sorte de crescer com a presença de uma mãe, eu nunca nem vi rosto dela. Só o da Dabria, mas foi por fotos. Nunca a vi pessoalmente.

— Se você acha que crescer com uma viciada em drogas é sorte, você não conhece o significado da palavra "sorte" — levanto da cadeira e vou até a geladeira, pego a caixa de leite e um copo, e volto para mesa me servindo. — Você é quem deve ter tido sorte, teve uma vida normal, sem encrencas, pôde dormir toda noite sem gente batendo na sua porta querendo bater na sua mãe. Nem precisou se esconder debaixo da cama cada vez que ela te oferecia como pagamento para as dívidas dela. Ah... E nunca a viu deitada no chão tendo uma overdose, nem tolerou o mau humor dela quando estava em abstinência. Isso, Cal... Isso, sim, é sorte.

Love AffairOnde histórias criam vida. Descubra agora