Pratos limpos.

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BESSIE

A taça de cristal ao meu lado direito está cheia, mas não tanto. O ideal é que o líquido ocupe apenas metade do recipiente, aprendi isso logo na minha primeira aula de etiqueta com Mrs. Beauchene, uma senhora baixa de uns setenta e muitos anos, com cabelo preto chanel e franja reta rígida que Lucca Devito contratou para me dar aulas assim que comecei a frequentar os eventos da alta sociedade com ele. Além de etiqueta, tive lições sobre política, sociologia, astronomia, linguagem corporal, técnicas de conversação, dress code, inglês britânico, italiano, espanhol, francês e muito mais. Foram tantas aulas e tantas informações novas que por um momento pensei que fosse enlouquecer, mas sobrevivi e hoje posso dizer que estou pronta para ser uma verdadeira dama da alta sociedade americana, apesar do meu coração gostar mesmo de um bom e velho jeans escuro, minha jaqueta de couro e comer com as próprias mãos enquanto mastigo batatas fritas e converso ao mesmo tempo.

Odeio etiquetas. Odeio eventos da alta sociedade, mas gosto de aprender coisas novas. Gosto de me inteirar sobre o que está acontecendo no mundo, de conhecer detalhes importantes que eu nunca tive a chance de entender antes e de poder ter conteúdo o suficiente para falar sobre todo e qualquer assunto em uma roda de conversas. Além disso, o aprendizado das diferentes línguas me ajudam quando estou viajando. Não há nada pior do que ter condições de sair do país, mas depender de alguém para traduzir tudo para você.

— A comida não está boa? — Lucca me pergunta quando vê que eu nem sequer toco no meu prato. — Podemos trocar, se assim você desejar.

Forço um sorriso para o homem, que me olha com atenção.

— Está tudo ótimo, querido — minto.

Para não preocupá-lo ainda mais, pego meus talheres e começo a remexer a comida, lembrando de ingerir alguma coisa vez ou outra. O vinho me ajuda a engolir, pois faz com que os alimentos deslizem pela minha garganta sem muito esforço.

Não consigo relaxar.

Alguma coisa dentro de mim está gritando. É como se uma placa de "perigo" estivesse piscando insistentemente, mas não consigo ver de onde o problema vem, porque tudo parece estar sob a mais perfeita ordem. Lucca conversa com seu casal de clientes como se eu não estivesse ali e pelos próximos trinta minutos eu tenho paz para absorver os meus pensamentos.

A vibração sutil do meu celular é quase a confirmação do que estou sentindo. É Penélope, me enviando uma mensagem de texto.

Se quiser evitar um problema ainda maior com o Mark e consigo mesma, chegue aqui em dez minutos. Sua ninfeta está dando um show!

Me levanto de sobressalto, atraindo o olhar do meu cliente e do casal que o acompanha. Lucca me olha sem entender e, dessa vez, eu não forço o sorriso.

— Preciso ir — digo simplesmente.

Pego minha bolsa e saio do restaurante aos tropeços. Lucca vem logo atrás. Consigo ouvir ele pedir desculpas aos seus clientes e dizer que entrará em contato o mais breve possível para informar sobre o caso. Caminhamos apressados para o estacionamento, não espero que ele abra a porta para mim, pois quando ouço o barulho do controle remoto destravando o carro, entro no mesmo sem pensar duas vezes.

— O que aconteceu? — o advogado pergunta perdido quando dá a partida no veículo. — Saiu apressada, me deixou sozinho lá dentro.

— Reagan — digo entredentes.

Não preciso dar maiores explicações, pois ele parece entender o que está acontecendo no exato momento em que digo o nome dela. Ainda ouço Lucca perguntar se devemos ir para o bar, mas apenas consigo assentir, pois a minha cabeça está um turbilhão, impossibilitada de formular qualquer frase.

Love AffairOnde histórias criam vida. Descubra agora