Capítulo 101 :

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CARLA

Meus dentes batiam. O estômago revirava. A cabeça rodava... Por mais que quisesse, não consegui parar de vomitar. Tomei um remédio, dois... Água... E após isso fiquei deitada em minha cama com uma bolsa de gelo sobre a testa e os olhos na televisão que soava bem baixinha. Porque tudo isso? Todos esses sintomas ruins? Será que era a saudade se tornando física?

Olhei para o relógio e vi que já passava das onze... Suspirei. Desde que voltei do restaurante com Arthur a coisa para mim não estava boa. O mal estar parecia só piorar, nunca melhorava. Tentei me erguer da cama e consegui com muito esforço, calçando a pantufa e me arrastando até o banheiro. Parei em frente ao espelho e me olhei demoradamente. Os olhos grandes e meio caídos, cansados, mas sem conseguir descansar. A pele mais pálida que nunca, quase reluzente na luz artificial. Joguei um pouco de água quente no rosto e prendi o cabelo na nuca... Minha temperatura estava um tanto baixa.

Desci para a cozinha, abri a geladeira e comecei a fuçar. Achei uma caixinha de suco de laranja e bolinhos de chocolate. A mistura era ridícula, mas peguei o suco e a vasilha de bolinhos e fui para o quarto. Sentei na cama e passei a comer. Talvez tudo isso fosse fome e logo passasse... Mas não! Assim que terminei o segundo bolinho e tomei quase metade do suco, senti tudo voltando. Bateu e voltou. Corri pro banheiro e consegui chegar a tempo de vomitar no vaso. Observei toda aquela nojeira e dei a descarga com cara de desgosto... Nada parava em meu estômago, meu corpo estava recusando tudo.

Irritada e um tanto fraca, voltei para o quarto e me sentei na cama com a garrafa de água do lado. Desliguei a televisão e fiquei no escuro, olhando para o teto sobre a luz do abajur. Até que involuntariamente pensei em Maria Clara e Arthur. Olhei para o celular ao meu lado. Olhei para o teto novamente. Ligar a essa hora seria ridículo! A menos que meu pretexto fosse bom... Maria Clara era um pretexto?
Assim que pensei, peguei o celular e liguei para o número de Arthur. Mordi os lábios enquanto chamava e ele logo atendeu.

Carla: Desculpe se acordei você... — falei antes mesmo do alô, atropelando meus pensamentos. Fechei os olhos e me xinguei baixinho.

Arthur: Carla? — perguntou um tanto sonolento, falando baixo — Tudo bem? O que houve?

Carla: Liguei para saber da Maria Clara. Ela está bem? Conseguiu dormir sem o bichinho de pelúcia? — outro pretexto ridículo. Ele gargalhou baixinho.

Arthur: Está dormindo aqui... Está tudo bem. Mas sua voz não me parece tão boa — mordi os lábios.

Carla: É que estou um pouco enjoada. Nada demais — dei de ombros e suspirei — Acho melhor eu me deitar. Porque dormir mesmo não sei se vou conseguir.

Arthur: Espera aí. O que é que você tem? — sua voz sonolenta soava grave.

Carla: Nada demais Arthur. Não quero te preocupar...

Arthur: Sinto muito, mas já me preocupou. Vou pegar a Maria Clara e ir até aí — ele estava sério, não estava brincando.

Carla: O que? Não! Ela está dormindo... Não faça isso! São onze e meia da noite... — insisti nervosa, fechando os olhos. No fundo sua preocupação me envaidecia.

Arthur: Farei sim. Não adianta dizer nada — parecia estar se mexendo do outro lado da linha, fazendo alguma coisa — Me espere que em onze minutos estou ai.

Carla: Arthú... — desligou e nada me restou a não ser a certeza de que ele viria.

ARTHUR

Maria Clara acordou quando a chamei, mas logo voltou a dormir assim que deitou no banco de trás do meu carro enrolada a uma manta verde clara. Coloquei touca em sua cabeça, pantufas em seus pés, arrumei seu cabelo e beijei sua testa antes de sentar no banco do motorista para dirigir. Antes de chegar à casa da Carla passei em uma farmácia 24hrs e comprei algum remédio para combater enjoos. O farmacêutico me disse que isso era o tipo de coisa que não se poderia brincar... Coca cola era ótimo pro estômago, também levei uma garrafa.

O mais difícil de tudo foi subir o elevador com Maria Clara no colo e as sacolas que comprei. Assim que Carla abriu a porta e me viu parado do lado de fora com Maria Clara tombada em meu ombro quase teve um acesso de risos. Sorri também, reparando em sua aparência abatida. Usava um pijama largão lilás, estava com a pele mais pálida do que nunca e havia olheiras fracas em seus olhos. Fraca. Essa era a descrição.

Arthur: Posso entrar? — falei humildemente.

Carla: Você é maluco! — Ela me deu passagem e notei que estava falando mole, meio arrastado.

Entrei com Maria Clara enrolada nas cobertas e a coloquei deitada sobre o sofá. Ajeitei a coberta sobre seu pequeno corpo e fui em direção a mesa colocar as sacolas. Vi quando Carla parou do lado de Maria Clara e lhe deu um beijo no cabelo, mas não demorou muito e a vi caindo sentada no chão ao perder o equilíbrio.

Arthur: Não preciso me preocupar? — corri para o seu lado e a ajudei a se levantar delicadamente — O que está acontecendo, Carla? Por Deus, isso não é normal!

Carla: Não sei Arthur — apoiou-se em mim, segurando em meu braço com a expressão chorosa — Estou com medo também. Não sei o que aconteceu...

Arthur: Calma, vamos lá para o quarto. Você deita na cama enquanto eu te dou um remédio, sei lá, alguma coisa para te distrair. Se não passar, vamos para o médico — a peguei no colo contra sua vontade, trazendo seu rosto para perto do meu.

Carla: Consigo caminhar sozinha — tentou protestar, mas segui carregando-a pela curta distância. Passou um braço em meu ombro e suspirou. Parei ao lado de sua cama grande e a segurei sobre a cama.

Arthur: A última vez em que te coloquei em uma cama as condições eram bem diferentes — sussurrei bem perto de seu rosto. Vi que me olhava um pouco tristinha, os olhos agora brilhando por estarem úmidos. Aquilo partiu meu coração em cem.

Carla: Arthú... — murmurou quase sem voz, meio que engolindo o choro — Não faz isso...

Arthur: Calma Carla. Não vou fazer nada... Será que esqueceu quem sou eu? — ternamente a depositei sobre a cama, em meio aos lençóis. Ficou olhando para o meu rosto e me sentei na beira de sua cama — Que remédios você tomou? — perguntei checando sua temperatura, que era normal. Um pouco gelada. Começou a me listar os remédios — Acho melhor esperar um pouco para tomar os que eu trouxe. Pode haver uma mistura grande aí dentro.

Carla: Também acho — suspirou e olhou para o meu rosto um pouco tímida — Posso pedir um favor?

Arthur: Até dois — dei de ombros.

Carla: Ajude-me a tomar um banho? Estou tão fria e... -– assenti no mesmo momento — Você é a única pessoa que eu não tenho vergonha de pedir algo assim.

Arthur: Não precisa se preocupar — fiquei de pé — Vou colocar a banheira para encher ok? — assentiu rapidamente — Volto em um instante.

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