Adeus Silencioso

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A casa sempre impecável, chão varrido e os móveis com nenhuma poeira, claro, sem falar da comida, que era feita nos horários. Tudo isso graças a Cecília, que ajudava muito sua mãe, Merícia, uma mulher que não parava em casa, vivia ocupada trabalhando.

Mas Cecília não dedicava-se somente aos afazeres domésticos, sua maior dedicação era mesmo os livros, devorava-os, um atrás do outro. Mundos desconhecidos, universos infinitos de possibilidades.

Seu quarto, seu mundinho, onde ela tinha a possibilidade de ser livre para sorrir, brincar, sonhar. As páginas traziam refúgio para ela, proteção. Ninguém podia machuca-la ali, nem mesmo sua mãe.

Cecília esforçava-se em acariciar o rosto da mãe, ou talvez, em pentear seus longos cabelos ondulados, mas em vão. As garrafas na mão da mãe, a ardência dos dedos dela em seu rosto e as palavras pesadas em sua boca, feriam-na.

O abandono do marido ao saber da gravidez e as lembranças dos olhos do pai no olhar da filha, machucavam Merícia. Encontrava nas bebidas forças para lutar contra esse passado, mas acabava deixando marcas no coração de Cecília, que sempre fugia para bem longe, dentro dos seus livros, mas até mesmo a vastidão do universo daquelas páginas encontrava-se limitado a presença de sua mãe quando retornava para casa toda embriagada.

As lágrimas dos seus olhos não a impediram de liberta-se do medo que a aprisionava. Sem olhar para trás, deixou sua casa e seus passos guiaram-na sob a calada da noite, mesmo não sabendo para onde estava indo, sabia que era para bem longe.

Seu caminhar perdido, solitário e triste por entre as árvores, levaram-na até uma escadaria com alguns pilares e uma larga porta no centro, onde seus olhos repousaram sobre seus livros, mas que logo depois foram acordados mansamente ao romper do dia por uma mulher gentil, cabelos grisalhos e sorriso fácil.

A senhora pegou-a pela mão direita e tirou-a da escadaria acalmando seus medos e levando-a juntamente com os seus livros para dentro, fechando a porta.

Cecília não sabia, mas seu adeus silencioso a levara para um novo mundo, um novo lar, uma nova casa, a Casa De Kaphia.

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