As Irmãs Samoy

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A lua pairava imponente no céu. A brisa farfalhava as folhas fazendo algumas caírem ao chão. Moradores da Cidade-alta de Nidon caminhavam por sobre as ruas, elegantes eram os tecidos de seus corpos. Não tinham preocupações em seus olhos, nem em seus passos. Não tinham porque temer. Soldados faziam suas rondas a beira dos muros, outros entre as ruas.

Anny Samoy, a mais velha, de sobretudo negro, ocultava-se do brilho da lua atrás de uma das torres com sua foice nas costas. Sob ela estava sua irmã mais nova, Momo Samoy, de lisos cabelos negros, ajoelhada com suas adagas-gêmeas em mãos. Os olhos observavam a tudo nesta parte alta da capital, sem nenhuma surpresa.

"Agora. " - disse Anny olhando para baixo.

Momo soltou um sorriso de canto de boca e pulou. Desapareceu. Nenhum som se fez, como se nada tivesse caído.

Pegando sua foice, Anny movimentou-a num golpe ascendente. Uma fenda abriu-se diante dela, como se um tecido tivesse sido rasgado. Era escura como a noite, silenciosa, vazia. Anny entrou. A fenda fechou-se.

O pai delas trabalhava erguendo as paredes da cidade, enquanto que a mãe fabricava vasos e os vendia na região Entre-cidades; o encontro da cidade superior com a cidade inferior. Uma área de muita movimentação por causa do comercio. Todas as partes tinham suas vendas, mas ali era o ápice.

Muitos eram os vasos que voltavam para casa. O reconhecimento não chegava aos olhos dos nobres, apesar deles ficarem expostos.

Muitas horas de trabalho para poucas moedas.

As filhas ficavam aos fundos da loja, não podiam ajudar nas vendas. Seus pais decidiram assim. Elas estavam escondidas para a própria proteção. Se os soldados vissem, as levariam para Cidade-alta.

As crianças são o futuro da nação.

Passariam por treinamentos militares. Teriam de tudo. Tudo do bom e do melhor, mas não poderiam voltar para casa. Serviriam ao reino. Somente ao reino.

Os pais poderiam ser deportados, mas valia o risco. O risco de ter os filhos nos braços.

Um dos generais da Cidade-alta rondava com quatro guardas pela capital nidoniana. Passaram sob tecidos vermelhos que se estendiam por algumas ruas, no qual, suas colorações eram exaltadas pelas tochas de fogo penduradas nas paredes.

Vestido com sua armadura negra, o General Ken'fer passou por um soldado cumprimentando-o com um aceno de cabeça. O soldado respondeu e seguiu seu caminho aproximando-se de uma esquina, mas uma adaga furou-o. Seu corpo foi ao chão.

Momo sorria atrás dele sob a sombra.

Um outro fazia sua ronda na outra rua, mas em suas costas uma fenda abriu-se, Anny saia dela. O soldado mencionou virar-se, mas foi muito lento. Seus joelhos encontraram o chão, logo em seguida o rosto. A foice atingira-o a uma certa distância, retornando seu tamanho original na mão daquela que a empunhava.

A situação da família não era fácil, os sorrisos eram as migalhas de reconhecimento. O árduo trabalho das mãos não era existente aos olhos da Cidade-alta. A tristeza pesava no coração das meninas sobre a situação dos pais. Sobre suas vidas e de sempre olharem para além dos muros, nas janelas, esperando algo, mas não ganhando nada em troca. Sentiam-se presas, mas não pela decisão dos seus pais, mas sim, por causa da realidade que viviam.

A saída foram os furtos aos dezoito anos, pequenos furtos. A mais nova acompanhou a irmã mais velha, pegou gosto pela coisa. O sucesso atrás do outro foi transformando os pequenos furtos em grandes assaltos. Mas numa fatídica noite, a casa que era pequena, tornara-se grande, vazia. Tudo tinha sido levado. Seus pais estavam ali, mas até suas vidas não foram deixadas para trás.

De costas na parede e com uma das pernas ao chão, Momo girava uma de suas Adagas-gêmeas nas mãos.

O General assustou-se ao ver aquela silhueta.

"Quem é você? Mostra-se! " - disse Ken'fer rodeado pelos seus guardas.

Nada aconteceu. Momo continuava girando a adaga em seu dedo.

"É uma ordem! " - ordenou ele com a espada estendida e um tom mais elevado da voz.

"Calma, General..." - disse Momo saindo da sombra.

"Ninguém está gritando. " - continuou Anny atrás deles, saindo de sua fenda e caminhando lentamente com um sorriso no rosto.

Sentindo-se acuado, ordenou o ataque.

Uma densa escuridão saiu de Anny, espalhando-se por aquele lugar, marcando-o, engolindo a todos.

Os soldados atacavam, mas seus golpes nada faziam. Seus olhos estavam cegos. Momo girava entorno de si mesma no meio deles. Sons de laminas ecoavam dentro da escuridão.

Depois de um breve espaço de tempo, a escuridão recuou-se através das paredes e sobre o chão de paralelepípedos, até desaparecer por completa sob as botas de sua possuidora.

Os soldados estavam ao chão. Todos com adagas fincadas em seus corpos. Ken'fer estava de joelhos diante Anny. Ferido. Calado. Momo estava atrás dele.

"Guarde bem a minha imagem, pois será a última que irá ver." - disse Anny em superioridade segurando a foice na mão direita.

As tochas de fogo estalavam as madeiras ao lado dos longos tecidos vermelhos.

Nuvens cobriam a lua, ofuscando sua imagem, mas não ocultaram o revoar de pássaros sobre algum telhado próximo.

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