Antes

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Não exista monstro. Não existia medo. Somente histórias. Histórias inventadas, criadas por Rahnath. Cabelos longos e negros. Um sorriso acolhedor. Uma mulher sempre disposta a ajudar os membros da Vila-suspensa. Embora sempre trazendo a gentileza como cartão de visita, a recompensa não era do mesmo valor.

Quando se vive na floresta, a lei da sobrevivência reina sobre o lugar. Então, saber lutar é um requisito mínimo para manter-se vivo. Mas para Rahnath, isso estava muito longe de acontecer. As horas, dias de treinamentos com os Caçadores não surtiam o efeito esperado. As flechas não acertavam os alvos. Esconder-se para não ser pega pelos inimigos era uma piada... O esforço era presente, mas não o suficiente.

Rahnath percebeu que começou a ser deixada de lado, esquecida. Tudo bem que ela não era uma boa Caçadora como os outros, mas ser rejeitada desse jeito, feria seu coração.

Por entre as árvores, sob o manto da noite, longe do brilho da lua e escondida dos olhares dos membros da Vila, Rahnath desabafava com seu confidente. Ele não a rejeitava. Sempre estava lá por ela.

Querendo, então, mostrar pra Vila que ela tinha o seu valor, e que podia ser útil de alguma forma, começou a contar histórias para as crianças sobre os Caçadores e seus feitos heroicos contra as várias criaturas de Mar-verde e contra os invasores de pés e mãos. Claro que, muita coisa era inventada pra deixar as histórias mais épicas e fascinantes. Foi o jeito que ela encontrou de motivar os jovens a terem mais confiança diante uma adversidade.

Tudo muito bom. Os jovens gostavam quando ela levava-os para sua casa dentro de uma enorme árvore. O passar do tempo não escondia os seus traços ao longo do tronco colossal. Ali não havia rejeição. Havia olhares atenciosos e acolhedores. Com tudo, isso começou a ser visto estranhamente pelos membros da Vila, pois, os treinamentos, parte essencial para a sobrevivência do povo, passou a ficar em segundo plano. Não serem mais tão importantes assim.

Então, alguns membros do conselho da Vila-suspensa, dentre eles, Laie, mandou uma advertência para Rahnath sobre suas ações. Rahnath não deu muita importância, permaneceu firme sobre o que estava fazendo. O que havia de errado nisso? Fazer com o que os mais novos, através das histórias, não se sentirem amedrontados diante uma ameaça, agora era ato de rebeldia? Eles tinham que agradece-la pelo que estava fazendo. Mas não foi isso que aconteceu. Outra advertência foi até ela. Outra rejeição. Por fim, decidiram agir de forma mais contundente.

Expulsão.

Caçadores prenderam Rahnath. Mas um membro de papel importante dentro da Vila, interveio sobre o que estava acontecendo, dizendo que ele mesmo resolveria do assunto. Pois, como pai, percebeu que até sua filha estava sendo influenciada por ela.

Rahnath foi levada para longe da Vila-suspensa. Ela tentou inúmeras vezes reverter sua situação, dizendo que não tinha feito nada de errado. E do porque ele estava fazendo aquilo com ela. E claro, sem contar todo o sentimento envolvido entre eles. Será que não tinha significado nada para ele ao longo desses anos?

"Você prometeu, Crasfer" - Rahnath suplicou.

"Não faça isso" - disse ele com olhar sério.

"Mas..." - os olhos de Rahnath molharam-se.

Crasfer, então, jogou-a num buraco localizado dentro de uma caverna. As lágrimas de Rahnath sob a escuridão, brilharam ao toque da lua. Já ele, nenhuma expressão de sentimento esboçou de seu rosto.

Rahnath gritou, gritou e gritou. Mas somente o silencio veio como resposta. A friagem fez sua pele arrepiar-se, mas muito além do frio, pequenos pontos luminosos espalhados ao seu redor e sons de garrinhas agitadas, como se estivessem correndo sobre um piso de madeira, circularam-na.

Rahnath elevou seus olhos molhados aos céus e submeteu-se ao seu destino.

Sobre o que parecia ser emaranhados fios de seda sob seus pés, inúmeras aranhas possuíram o seu corpo de forma avassaladora.

Não existia monstro. Não existia medo. Somente histórias inventadas, criadas por Rahnath.

Então, surgiu um monstro de verdade.

"Ah, meus pequeninos... A mamãe cuida de vocês"

Assim surgiu a Governanta.

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