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[ 20 de abril, segunda-feira ]








  Tudo parece bem quando chegamos em casa, à noite. Não tem nada fora do lugar, o jantar está pronto e Leigh está com uma papelada na sala. O problema é quando entro no quarto e encontro Ariane chorando na cama. Não é um dos choros sem sentido que acontecem de vez em quando por causa da bomba de hormônios, é um choro intenso. Seu rosto está vermelho e encharcado, e soluços sacodem seu corpo. Largo minhas coisas no chão e corro até ela.

  — O que aconteceu? — pergunto, aflito. — Está machucada? Com dor? — ela balança a cabeça negativamente. — Então, qual é o problema? Alguém te fez alguma coisa? Porque se fez, eu juro que quebro a cara de seja lá quem for, é só me dar um nome. Greene, pelo amor de Deus, me fala o que aconteceu ou vou ter um troço. Não está mesmo machucada, né?

  — T-T'Challa — soluça. — E-ele empurrou minha c-câmera na água e-e ela não quer mais ligar.

  Suspiro, sentindo meus batimentos cardíacos se acalmarem.

  — Como isso aconteceu?

  — Eu estava na hidromassagem e estava vendo as fotos — ela passa as mãos no rosto. — Me distraí por um segundo e ele empurrou a câmera.

  — Garotinha... Nunca é boa ideia misturar eletrônicos e água.

  — Eu sei! Não faça eu me sentir mais burra do que já me sinto — soluça mais. — O que vou fazer agora?

  — Fica calma, posso te dar outra câmera...

  — Não quero outra câmera! E quanto a todas as fotos que estavam aqui? Nosso casamento em Las Vegas, a evolução mensal da minha barriga, trabalhos da faculdade e tudo mais. Fotos suas, da banda, da minha família... Que merda! — Ariane esfrega o rosto outra vez e olha para mim. Sua voz está carregada de tristeza quando diz: — Você me deu isso quando dissemos ' eu te amo ' pela primeira vez. Tem valor sentimental, não dá pra substituir.

  Tá, eu fico tocado por ela se lembrar disso. Passo um braço por seus ombros e beijo sua cabeça.

  — Sinto muito, garotinha. Talvez dê pra consertar.

  — Eu devia ter revelado as fotos e feito um álbum. Pensei nisso várias vezes, mas fiquei protelando e agora... Eu sou tão idiota!

  — Para com isso, acidentes acontecem. Não é culpa sua.

  — Eu devia ter prestado atenção.

  — Relaxa, tá legal? — continuo tentando consolá-la. — A câmera tem um cartão de memória, não tem? Talvez dê para recuperar as fotos. Me dê o cartão e eu levo em algum lugar amanhã, ok? E se não tiver salvação, te compro outra câmera e poderá registrar novas memórias. Ainda tem muita coisa pra acontecer, afinal.

  Ariane não responde, só deita a cabeça em meu ombro. É sempre uma tortura do cacete vê-la assim, principalmente quando não tenho certeza de que posso resolver o problema. Sinceramente, espero que seja possível recuperar as imagens. Nosso primeiro casamento e os primeiros meses de gravidez não são coisas que quero deixar apenas na lembrança; quero poder vê-los sempre que quiser. Conservar os detalhes.

  — Falou com o Leigh hoje? — pergunto, ela nega. — Bom, então, acho que não sabe da novidade.

  — Que novidade? — ela levanta a cabeça. Seus olhos ainda estão muito úmidos e o rosto, vermelho.

  — A gente se entendeu. Ele me ajudou com umas preocupações de madrugada. Parece que o cara não é tão mau assim...

  — Preocupações? Tem alguma coisa errada?

  — Não, não, nada de mais — abano a mão. — Não se preocupe. Não está feliz por eu estar numa boa com um Frey?

  — É claro! Bom, o Leigh nunca te fez nada, pra começo de conversa. Fico muito contente mesmo em saber disso. Teve uma época em que nada te faria simpatizar com um Frey.

  — Eu mudei — dou de ombros.

  — E a que se deve essa mudança?

  — A você, oras, a que mais seria? Ainda me lembro do que disse quando terminamos. Achei que precisava dar uma chance pro cara, ele estava realmente disposto a me ouvir choramingar às três da manhã. Até me mostrou a tatuagem.

  — Calma aí, não rolou nada estranho, né? Vocês ficaram se exibindo um pro outro?

  — Sim, Greene, foi exatamente o que fizemos. Não deu pra resistir, as covinhas e tal... Não conta pro Keith.

  Ariane ri e meu coração fica menos pesado. Sei que o lance da câmera não será esquecido com tanta facilidade, mas é bom distraí-la um pouco. Levanto seu queixo para beijá-la. É meio molhado e melequento, mas quem liga? Não é como se eu nunca tivesse lambido certas coisas que saíram dela, se é que me entende.

  — Você já viu a tatuagem do Leigh? — pergunto, ainda segurando seu queixo.

  — Não.

  — Ótimo, que bom. Significa que ele nunca tirou a roupa na sua frente.

  — Por que ele faria isso? — ri.

  — Sei lá. Você é uma coisinha encantadora, eu sinto vontade de tirar a roupa na sua frente o tempo todo.

  — E tirou, é por isso que vamos ser pais. Espera, não — balança a cabeça. — Eu já vi a tatuagem. Uma vez.

  — Jura? — arqueio as sobrancelhas. — Quando?

  — Ano passado. Você tinha saído com a Megan, eu vim pra cá. Keith e Leigh estavam na hidromassagem e me convidaram pra entrar também.

  — Na hidromassagem com dois homens? Hum...

  — Ah, não começa.

  — Só estou brincando — levanto as mãos em rendição.

  — Na hora eu estava tão puta contigo, que nem reparei na tatuagem. Só conseguia pensar em socar você e aquela idiota. Foi quando o Lys apareceu de surpresa.

  — Três homens, então.

  — Oh, sim, fizemos a festa — trocamos um sorriso zombeteiro cúmplice, então ela se aconchega em mim. — Consegue imaginar?

  — Prefiro não — respondo com sinceridade. — Mas se um bebê nascer loiro e outro com cabelo cinza, vou cobrar pensão.

  Ariane ri outra vez.

  — Sabe que o cabelo do Lysandre não é cinza de verdade, né?

  — Verdade. Se nascer com heterocromia, então.

  Ela estapeia meu peito. Ariane está mais calma quando descemos para jantar, embora o rosto tenha ficado meio inchado. Antes de dormir, guardo a câmera de volta na caixa e deixo na mesa de cabeceira para não esquecer de levar comigo amanhã.

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