[ 15 de março, domingo ]
Acordo no meio da noite com o braço doendo e levo alguns segundos para entender o porquê. Ariane está com as unhas fincadas perto do meu pulso. Acendo o abajur e me apóio num cotovelo; seu rosto está retorcido e a respiração, ofegante. Franzo as sobrancelhas — ela deve estar sonhando. Tento libertar meu braço, mas suas unhas apertam ainda mais. Sugo o ar pelos dentes; isso vai deixar marcas. De repente, ela começa a se revirar e a murmurar.
— Greene — chamo suavemente. — Greene, acorde, antes que perfure uma de minhas veias.
Ariane abre os olhos, mas não parece me ver. Sua expressão é de puro pânico, o que me deixa preocupado. Digo seu nome mais uma vez e, de repente, ela se senta, me abraça forte e começa a chorar no meu ombro. Não entendo o que está acontecendo, mas a abraço de volta e sussurro repetidamente que está tudo bem.
— Eu sonhei que não conseguia chegar ao hospital — soluça. — Que eles não conseguiam sair, que sangrava demais e você não estava lá. Eu tentei, mas não consegui aguentar!
— Shh, calma, já passou — digo baixinho, acariciando seu cabelo. — Eu estou aqui, você está bem. Foi só um pesadelo.
— Foi horrível, ainda consigo ver!
— Fica tranquila, meu amor. Olha, não tem sangue nenhum.
Ariane se afasta de mim e analisa o lençol, que continua tão limpo quanto sempre. Acho que o medo agitou os bebês, porque consigo vê-los chutando. Ela abraça a própria barriga, como se quisesse protegê-los ou porque se sente aliviada por sentí-los. Passo um braço por seus ombros e beijo sua cabeça. Ela funga, mas o choro cessou.
— Se sente melhor?
— Acho que sim. Vou tomar um café.
— Café? São dez pras três da manhã — digo, conferindo o celular.
— É descafeinado.
— Tá, então vou com você — jogo as pernas para o lado e me levanto.
— Não precisa, pode voltar a dormir. Me desculpe por ter te acordado.
— Não vou voltar a dormir. Diferente do seu pesadelo, eu estou aqui — declaro com firmeza. — Por que não saímos para tomar um ar? É domingo e está quente pra caralho. Vai te acalmar e acalmar os pobrezinhos.
Aponto para os pequenos calombos que surgem e desaparecem em sua barriga.
— Até o terceiro neném está chutando — Ariane suspira. — Me deixe só vestir uma camiseta.
— Espera aí, deixa eu sentir.
Dou a volta na cama e coloco a mão em sua barriga. Sei que estão chutando porque estão assustados ou estressados, mas meu coração fica cheio de amor mesmo assim. Começo a fazer carícias suaves e espero que isso passe alguma sensação de segurança para todos eles. A agitação passa aos poucos.
— Olha só — Ariane arqueia as sobrancelhas. — Parece que eles têm um preferido.
— Só até nascerem e descobrirem que não tenho seios.
Ela ri e se junta à mim nas carícias por um momento, antes de ir até o guarda-roupas e vestir uma das minhas camisetas por cima do top esportivo. Já estou usando uma camisa, e não boto nada por cima da samba-canção porque está muito calor e é madrugada — ninguém vai ver. Será apenas uma volta no quarteirão. E não dou a mínima se for visto, na verdade; tenho me esforçado um bocado por essas coxas fenomenais.
No saguão damos de cara com o Nathaniel, provavelmente voltando da farra, com uma ruiva alta grudada no braço. Puxo Ariane para mais perto instintivamente. Não costumo pensar nele, embora Megan me venha à mente vez ou outra, mas tenho vontade de socá-lo sempre que o vejo. A única coisa que me impede é a mulher ao meu lado. Ela acha que não vale a pena prolongar a treta, principalmente porque temos coisas mais importantes em que pensar. Para a minha sorte, eles nos olha, mas segue o caminho sem falar nada. Ariane suspira.
— Qual o problema?
— Não gosto desse clima chato. Queria que tudo ficasse bem.
— Não me diga que está pensando em ficar numa boa com aquele cara.
— Bom, não quero que sejamos melhores amigos nem nada, mas acho que não vale a pena ficar com raiva para sempre.
Paro de andar e olho para ela.
— Se voltar a andar com o Nathaniel, eu volto a andar com a Megan. Estou falando sério.
— Eu não disse que quero andar com ele. E o que a Megan tem a ver com isso? Mantém contato com ela, por acaso?
— Não, mas poderia voltar a manter.
— Por que tem que transformar tudo numa guerra? Eu só disse que não gosto de como as coisas estão.
— Depois do que aquele imbecil fez, não dá nem pra cogitar deixar pra lá. Sabe muito bem que o Nathaniel poderia nos manipular de novo.
— Esquece — Ariane revira os olhos e volta a andar. — Vamos dar essa maldita volta e voltar para a cama.
Ótimo, agora ela está irritada comigo. Era só o que me faltava mesmo. Ariane caminha rápido na minha frente.
— Dá para esperar? — peço. — São três da manhã, porra, pode ter um assassino esperando na esquina.
Ela bufa e diminui o passo.
— A caminhada era pra te acalmar, lembra?
— É impossível ficar calma perto de você.
— Ah, Greene, não me fode.
— Não me fode você!
— Tarde demais!
Nossas palavras ecoam pela rua vazia.
— Qual é, vamos mesmo brigar por causa de uma besteira? — entro em sua frente e seguro seus ombros. Ela me encara com braços cruzados. — Não vai dizer nada?
— Pra que? Para você levar a mal e começar outra briguinha?
— Tá, a culpa é minha, eu provoquei seus hormônios grávidos — me rendo. — Se quer deixar a raiva de lado e perdoar o Nathaniel, vá em frente, mas não quero intimidades. Não quero que ele frequente nossa casa, muito menos que você frequente a casa dele. Não confio naquele cara e você é boazinha demais.
— Castiel, perdoar alguém não significa trazer a pessoa de volta para a sua vida. Não quero nada com o Nathaniel, só quero acabar com o clima ruim toda vez que topamos com ele em algum lugar. Você perdoou a Megan, afinal de contas.
— Eu nunca disse isso.
— E precisa? Eu te conheço. Você vê o Nathaniel como o único vilão, apesar de ela não ser nenhuma santa — Ariane abre um sorriso ácido. — Enfim, vamos voltar para casa. Estou começando a sentir sono outra vez.
Então, nós retornamos em um clima ainda meio esquisito. Maldita a hora em que sugeri tomar um ar.