[ 10 de maio, domingo ]
Depois de uma semana sendo atormentado pela minha querida esposa enxerida, decido falar com o Keith de uma vez por todas e dar um fim nisso. No momento ela está numa videochamada com a minha mãe, então aproveito a deixa e saio em busca do anão loiro. Procuro pelo andar superior primeiro, depois desço. Tudo parece Incrivelmente quieto, exceto pelos sons exteriores.
Encontro o Keith e o Leigh na cozinha, perto da lava-louças. Dou um passo para dentro, mas recuo quando noto o clima estranho. Pela linguagem corporal, é óbvio que estão brigando baixinho. Ora, ora, problemas no paraíso — um evento raro no planeta Leith. Luto contra o impulso de continuar bisbilhotando e bato na porta. Ambos olham para mim com cara fechada.
— Foi mal, hora ruim? — pergunto, mesmo sabendo a resposta.
— Não, tudo bem, eu já estava de saída — Leigh responde. — Com licença.
Dou um passo pro lado para que ele passe, depois adentro a cozinha.
— O que aconteceu?
— Nada. O que você quer? — Keith responde com impaciência, sentando-se num dos bancos da ilha.
— Você se casaria com o Leigh? — vou direto ao ponto.
— Estou com raiva dele agora, então não.
— Tá, mas e no geral? Se casaria com ele?
— Caramba, sei lá, por que está me perguntando isso? — bufa.
— Abri uma caixa de perguntas pra interagir com os fãs, e uma tal de " keithismyking " quer saber — minto descaradamente. Tenho ficado cada vez melhor nisso com os treinamentos da companhia de como agir na frente da imprensa. — Responde logo, tenho mais o que fazer.
— Que seja, tanto faz, diz que sim — ele abana a mão como se estivesse me enxotando.
— Não, tem que ser uma resposta sincera.
— Sim, tá legal? Sim.
— Ok. Ela também quer saber se você se casaria com ele esse ano, por exemplo, numa cerimônia de quintal dupla.
— Isso é bizarramente específico.
— Sim ou não? — insisto.
— Não sei, cacete, não viu que estávamos brigando? — esbraveja. — Não estou com cabeça pra abobrinhas agora, vai caçar o que fazer.
Arqueio as sobrancelhas.
— Escuta aqui, pingo de gente, não desconta em mim não! Qual é a droga do problema, afinal?
— Nada. Ele está todo nervosinho porque botei os trecos de cristal e porcelana na lava-louças — ele prossegue com uma péssima imitação do Leigh: — Quantas vezes preciso dizer que não se pode colocar esses utensílios na lava-louças porque podem riscar ou quebrar, e piriri pororó. Que saco! Quem liga pra uns arranhões?
— Você sabe que está totalmente errado, né?
— Essa é boa! Como estou errado?
— Caralho, Keith, nem eu sou tão obtuso — bufo. — O cara deve ter gastado uma nota com essas coisas, ele gosta delas, o mínimo que você pode fazer é ser cuidadoso. Se o Leigh pediu pra não botar na lava-louças, não bota e pronto.
— Ah, perdão, não sabia que tinham se tornado melhores amigos — revira os olhos.
— Eu tenho razão e você sabe muito bem — aponto um dedo pra ele. — Agora, larga a mão de ser otário e vai se desculpar, porque você não vai achar ninguém melhor que Leigh Frey, e não quero te ouvir choramingando pelo resto da minha vida por estar sozinho e mal amado.
— Uh, quer dizer que seremos amigos pra sempre?
— E tenho escolha? Com a minha sorte, acabaremos no mesmo asilo. Ou no mesmo hospício.
— Pra sua informação, eu sou muito capaz de encontrar outra pessoa boa. Já tem uma chuva de garotas me querendo.
— Eu vou socar sua cara — ameaço. — Acha que mais alguém vai fazer o que o Leigh faz? O mané lambe o chão que você pisa. Vai perder isso porque é teimoso e coloca cristais e porcelanas na lava-louças?
— Não seja dramático, Castiel. Foi só uma briguinha de casal, não vamos terminar.
— Não mesmo, porque você vai levantar essa bunda branquela e vai se desculpar — aponto para a porta. — É uma ordem. Anda logo.
— E quem é você para me dar ordens? — ele arqueia as sobrancelhas em desafio.
Me inclino e o jogo sobre o ombro com facilidade, depois me dirijo para fora da cozinha.
— Tá legal, que se dane. Eu gosto da vista.
Me seguro pra não chutar sua cabeça. Encontramos o Leigh regando as flores na lateral da casa. Ele para e nos olha enquanto coloco o Keith no chão.
— Toma, isso é seu — digo. — Se resolvam, porque se alguma coisa acontecer com vocês, minha mulher grávida tem um treco.
— Nosso relacionamento não é problema seu — Keith grita enquanto me afasto.
— Graças a Deus! — grito de volta.
Quando volto pro quarto Ariane está se exibindo para a minha mãe. Não de um jeito estranho, é claro. Ela só está mostrando a barriga.
— Você está tão linda, querida! — ouço minha mãe dizer. — Sua barriga está tão redondinha! Fico até com saudades de quando meu chuchuzinho ainda estava no meu ventre. Eu o colocaria de volta, se fosse possível.
Puta que me pariu.
— Keith disse que se casaria com o Leigh — informo.
— Sério? — Ariane pergunta com animação. — Como você perguntou? Foi sutil?
— Claro. Eles estavam brigando, mas estão conversando agora.
— Mas o que houve? — ela pega o celular, que estava apoiado num travesseiro no meio da cama. — Desculpe, Angel, eu te ligo mais tarde. Preciso conversar com o Castiel sobre umas coisas.
— Ele não está te tratando mal, está? Porque, se estiver, você tem minha permissão para dar uns tapas nele.
— Está tudo bem, mas obrigada — Ariane ri. — É possível que ele goste de levar umas palmadas.
Balanço minhas sobrancelhas para cima e para baixo.
— Tchau, mãe — grito.
— Tchau, meu gostosinho lindo! Tchau, querida. Você está linda!
Ariane agradece e encerra a chamada.
— Por que estavam brigando? — ela pergunta imediatamente.
— Porque o Keith colocou cristal e porcelana na lava-louças.
— Oh, que bom, nada grave. Então, posso encorajar o Leigh a fazer o pedido?
— Se ele tem certeza de que quer passar o resto da vida com aquela mala sem alça do Keith, vá em frente — dou de ombros. — Eu o encorajaria a pensar melhor.
— Não tem medo que todo o seu veneno se acumule até você explodir e morrer?
— Nem um pouco. Espero que aconteça em cima de um palco, porque seria um final épico pra um show.
— As pessoas venderiam pedaços dos seus órgãos no eBay.
— E você compraria?
— Claro que não. Depois de dez anos te aturando diariamente, tenho direito de pegar seus órgãos de graça. A pele tatuada dos seus braços daria uma bela tapeçaria.
— Ugh, você é esquisita — faço uma careta. — Não acredito que me casei com uma esquisitona, eu era o cara popular na escola.
— Popular entre os excluídos, parabéns — ela abre um sorriso desdenhoso. — Quer sair e tomar um sorvete?
— Claro, garotinha. Vamos nessa.
