[ 07 de outubro, quinta-feira ]
Piloto em alta velocidade, ziguezagueando entre os carros e ultrapassando alguns sinais vermelhos. Minha mente está a milhão; preciso chegar em casa o mais rápido possível. Ariane enviou mensagens me pedindo para voltar para casa urgentemente e não deu detalhes, então larguei o trabalho às pressas, em pânico. Meu coração nunca esteve acelerado, minhas mãos tremem. E se tiver acontecido alguma coisa com as crianças?
Mal estaciono no meio-fio, tiro o capacete e corro para dentro de casa. Ariane está de pé no meio da sala, tentando ninar um Kurt aos prantos enquanto ela mesma parece estar agonizando. Me aproximo rapidamente.
— Greene, o que foi? O que aconteceu? Ele está machucado?
— Preciso que compre absorventes e analgésicos, por favor — é sua resposta.
Balanço a cabeça.
— O que?
— Eu menstruei, não tenho absorvente e estou morrendo de cólica — explica. — Pode passar na farmácia pra mim?
Levo alguns segundos para processar e fico puto.
— Porra, mulher, ficou maluca? — esbravejo. — Quase morri de preocupação, vim correndo com a moto! Não acredito que me assustou assim por causa de absorventes! Não sabe que as farmácias entregam em casa, caralho? Me fez sair no meio do trabalho, achei que tivesse acontecido algo grave!
Ariane para de balançar o bebê e olha para mim com seus grandes olhos marejados, a boca tremendo levemente. Ótimo.
— Não pensei nisso — diz com voz chorosa. — Desculpe. Estou com muita dor e Kurt não para de chorar.
Respiro fundo, fechando os olhos por um segundo. A menstruação a afeta de formas diferentes todo mês e, sinceramente, os meses em que ela fica sensível assim são os que mais detesto. Uma vez a fiz chorar porque não adivinhei o que ela queria comer, o que, aparentemente, significava que não a conheço. Prefiro mil vezes que ela grite comigo.
— Tudo bem — respondo suavemente. — Não quis gritar, perdão. Algum absorvente e analgésico específicos?
— Qualquer um que tenha cobertura suave, abas e que seja grande.
— Porra, é uma pizza?
— Quanto ao analgésico, pode pedir uma sugestão ao farmacêutico. Pode levar o Kurt, por favor? Minha cabeça está explodindo.
— Quer que eu vá pra farmácia com um neném aos berros? — questiono, mas pego o Kurt mesmo assim. Ele para de chorar no mesmo instante.
Ariane solta um ganido, como um cachorro ferido, e enterra o rosto nas mãos. Sei que ela está chorando porque seus ombros começam a chacoalhar.
— O que foi agora?
— Por que ele para de chorar com você e não comigo? Sou eu quem cuida dele o dia inteiro!
— Talvez ele tenha sentido saudades de mim.
— Ou talvez eu seja uma mãe ruim — funga. — É o que ganho por ficar fedendo a leite o tempo todo!
— Para com isso, Greene, todo mundo sabe que o Kurt é o maior filhinho da mamãe. Ele te adora. Você tem mandado muito bem nesse lance de maternidade — dou tapinhas afetuosos em sua cabeça. — Descanse um pouco, ok? Eu já volto.
Ariane assente, enxuga o rosto com as mãos e vai para o andar superior a passos lentos. Quando desço os olhos pro Kurt, ele está olhando para mim.
— Mulheres, huh? — sorrio. — E o bicho vai pegar mais ainda em uns doze anos. Você é meu único aliado, seremos nós dois contra o inferno vermelho hormonal.
É assim que acabo passeando pelo supermercado com Kurt grudado ao meu peito pelo canguru. Recebo olhares de muitas pessoas — acho que um cara como eu carregando um bebê não é uma visão muito comum. A cesta cheia de absorventes, chocolates e qualquer tranqueira que possa acalmar minha mulher também não ajuda. Para equilibrar, decido levar umas cervejas.
— O que você acha? Oskar Blue, Blue Moon ou Rogue? — pergunto, parado em frente ao freezer. Kurt balbucia alguma coisa. — Concordo, Oskar Blue é a melhor. Eu deveria levar algo pra você também? Um maço de cigarros, uma coquinha gelada? É brincadeira. Não fume, tá legal? Sei que o papai faz parecer descolado, mas não é bom pros seus pulmões e eu me importo com seus órgãos. Me importo mais com os seus órgãos do que com os meus órgãos. Sabe, cara, você me quebra. Eu nunca pensei que amaria tanto um outro cara, aí você chegou e... Dá licença? É uma conversa particular.
A senhora parada em frente ao freezer ao lado, que estava prestando atenção em mim, faz uma cara chocada e vai embora.
— Velha fofoqueira — murmuro. — Vamos embora, filho. As pessoas não têm mais educação.
Quando volto para casa, depois de passar na farmácia e comprar os analgésicos e uma bolsa de água quente, Ariane está encolhida na cama. Hayley e Emily estão dormindo no berço, então faço o mínimo de barulho possível.
— Aqui, querida — boto as sacolas na cama. — Absorventes, analgésicos, doces. Pode ir à forra.
— Por que demorou tanto? — reclama, se aproximando das sacolas igual ao Smigle quando vê o Um Anel.
Ai, caralho, estou usando referências de O Senhor dos Anéis. Cheguei ao fundo do poço mesmo.
— Uma velha na farmácia me pegou de conversa. Passou meia hora elogiando o Kurt e fazendo perguntas. Ela disse que ele é o bebê mais lindo que ela já viu, e eu disse que é porque nós somos muito bons de foda.
— Disse isso pra senhora?! — ela arregala os olhos. — Castiel! O que ela vai pensar de mim?
— Ela nem te conhece. Além do mais, nós somos bons mesmo — dou de ombros. — Veja as crianças que a gente fez. Seu útero é a tela, meu pau é o pincel e nós somos artistas incríveis.
— Para de falar besteira, o Kurt pode te ouvir.
Olho para o Kurt, ele está sugando minha camiseta.
— Não acho que ele ligue. Enfim, tenho que voltar ao estúdio e...
— Não! Fique comigo, por favor.
— Mas, Greene, eu...
— Por favor, por favor, por favor — implora, se ajoelhando de frente a mim na beira da cama, fazendo cara de cachorrinho. — Só hoje. Estou sangrando e com dor e preciso de você.
— Está carente?
— Sim.
Eu não esperava que ela fosse admitir tão facilmente. Não é como se eu pudesse resistir.
— Tá legal. Vou ligar pros caras e pedir pra me cobrirem.
— Obrigada — sorri. — Você é o melhor. Vou tomar um banho, ok? Te amo.
Ariane sai do quarto com a sacola de absorventes e uma troca de roupas. Há uma pequena mancha vermelha no cobertor, então eu o troco, depois desço e coloco Kurt na cadeirinha. O levo para o jardim comigo, passando pela cozinha para pegar uma garrafa de cerveja e uma mamadeira de leite. Me sento no gramado, a cadeirinha ao meu lado. O clima está agradável.
— Tintim, amigão — brindo nossas bebidas.
Apesar de conseguir segurar algumas coisas, a mamadeira não é uma delas, então a seguro pro Kurt enquanto bebo minha cerveja. Isso é legal; nós dois sentados no gramado, tomando algo juntos. Ele segura meus dedos com as mãozinhas gorduchas e eu sorrio. Mal posso esperar para que ele comece a falar, para passarmos um tempo juntos enquanto batemos um papo maneiro.