As horas seguintes

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Diante da perplexidade que ficou com aquela cena, Aisha parou imóvel, olhando para a praça, quando um dos soldados deu um grito em forma de repreensão. Ela estava quase que em estado de choque, quando Lina, preocupada com a possível reação daquele soldado, colocou os mantimentos que segurava no chão e a virou com toda a força em direção ao muro, para que ela permanecesse na mesma posição que as demais mulheres se encontravam.

Ao tocar nela, Lina percebeu que ela estava a tremer de forma extrema, ficando assustada a imaginar o que Aisha pode ter visto naquela praça. Em volta deles as mulheres estavam quietas, todas imóveis a olhar para um muro, enquanto escutavam o barulho de um homem a chorar desesperado, provavelmente, em meio a aquela praça.

Aisha parecia estar em outra dimensão, em um primeiro momento. Lágrimas começaram a sair dos seus olhos e Lina demonstrava preocupação ao seu lado, enquanto um soldado se aproximava demonstrando uma irritação impressionante em seu olhar.

Furioso, ele chegou próximo aos ouvidos de Aisha e gritou:

- Não viu que tinha que ficar olhando para a frente.

Com medo da reação daquele homem quanto a Aisha, Lina intervém e diz:

- Ela é nova aqui senhor.

Aquele homem demonstrando uma fúria ainda mais extrema diz:

- Ninguém te chamou na conversa. Em seguida lhe deu uma forte bofetada, que a fez desequilibrar diante da violência daquele homem.

Aisha ainda parecia estar anestesiada, mas, aos poucos, após a violência daquele homem contra Lina, foi retomando a consciência e quando aquele soldado olhou para ela de forma ameaçadora, disse:

- Sinto muito senhor. Cheguei aqui há poucos dias e hoje foi a primeira vez que o meu esposo Caivan autorizou a minha saída. Ainda não estou acostumado com as práticas daqui da região, mas prometo me comportar melhor de uma próxima vez.

Aquele soldado recuou um pouco e questionou após engolir seco:

- A senhora é esposa de quem? Esse Caivan é um dos militares do nosso grupo?

- Sim. Ele é um dos militares.

Então aquele senhor se dirigiu para Lina, demonstrando uma preocupação enorme em seu semblante, especialmente, por ter a agredido grávida e a questionou:

- A senhora também é esposa do senhor Caivan?

- Sim senhor. Peço desculpas pelo meu ato.

- Não se preocupe senhora. Acho que as senhoras já podem ir. Estão todas liberadas. Diz aquele oficial, com um certo pavor em seu semblante, quando direciona para onde todas aquelas mulheres deveriam ir.

Elas foram encaminhadas para a rua que havia sido momentaneamente bloqueada.

Enquanto caminhavam em direção a casa em que moravam, uma mulher correu pela rua próximo da praça, chorando desesperada, gritando pelo marido e dizendo:

- Ele só queria dar alimento a mim e aos nossos filhos.

A perplexidade de Aisha aumentou ainda mais diante daquela cena desesperadora. Ela não estava conseguindo acreditar no que estava a presenciar. Como Caivan pode apoiar um regime com ideias tão retrogradas? Enquanto se dirigia para casa, ela evitou falar qualquer coisa com Lina, que ao ver o estado que Aisha estava, também preferiu não dizer nada.

O rosto de Lina estava a arder bastante, depois da violência daquele homem, mas, ela, demonstrando força, preferiu não se queixar e continuou a andar com uma sacola de alimentos nos braços em direção a casa em que moravam. Ela também não sabia o que havia ocorrido naquela praça, pois ainda não tinha presenciado uma cena como aquela, por não sair muito de casa e por não ter coragem de olhar para aquele local que julgava ser proibido.

Ao chegar em casa, Aisha continuou a agir como se tivesse com pensamentos distantes. Não trocou uma palavra depois do ocorrido por todo aquele dia e ficou a esperar Caivan. Ela queria uma explicação imediata dele, do porque atuava naquele grupo. Não era mais possível esperar para entender o porquê de fazer parte e lutar para aumentar o domínio e poder de um grupo com ideias tão radicais e contrárias as que ele apresentou enquanto discorria sobre a sua história.

Novamente surge nos pensamentos de Aisha a seguinte conclusão: Não há como Caivan ser tão bom o quanto imaginava que era, defendendo ações como essas que vi na praça. Se ele defende esse grupo e luta por ele, coaduna com o que eles pensam e com a forma de agir deles. Se ele concorda com isso, bom sujeito não é.

Mesmo curiosa por saber o que Aisha havia visto, Lina preferiu não ser invasiva e questionar o que ocorreu durante aquele dia. Mas, ao ver que ela estava a demorar muito no quarto para o lanche da tarde, preocupada, aquela jovem chegou próximo ao local que ela estava reclusa e questionou:

- Está tudo bem Aisha?

- Está sim Lina, está tudo bem. Disse Aisha com uma voz chorosa.

Estava claro para Lina que Aisha havia visto algo muito severo, por isso estava tão desesperada a chorar. Mas, para não insistir muito com ela demonstrando fragilidade daquela forma, preferiu ficar quieta e retornar para a cozinha.

Aisha não almoçou e não fez o lanche da tarde naquele dia. Ela ficou o tempo todo reclusa no seu quarto, boa parte do tempo a chorar. Por um bom tempo, a questão que vinha em sua mente era: O que fez Caivan vir participar de um grupo de pessoas tão extremistas? Não tem como uma pessoa que luta ao lado de um grupo desses ser alguém de coração bom. O que aconteceu com Caivan. Eu preciso de uma explicação.

Quando já estava escuro, Caivan chega do trabalho e é avisado por Lina que Aisha estava reclusa em seu quarto desde que chegaram do mercado, que não almoçou e parecia não estar bem.

Surpreso, pois, esperava encontrar a segunda esposa bem depois da noite maravilhosa que eles tiveram, Caivan foi ao quarto e encontrou Aisha a chorar, quando a questionou:

- O que aconteceu Aisha? Porque você está chorando?

- Eu quero saber agora Caivan, porque você entrou para esse grupo? Eu preciso saber o porque você está aqui e eu também.

- Amor, eu estou cansado agora. Tive um dia de pesados treinamentos, podemos falar sobre isso depois?

- Não Caivan, eu quero saber agora. Eu sou a sua esposa e tenho direito. Ademais, você disse que quando chegássemos em casa iria me contar tudo e até hoje não me contou o que te levou a fazer parte desse grupo tão mal visto no Ocidente.

- Eu sinto muito Aisha, mas hoje não vou falar sobre isso. Eu estou muito cansado. Espero que entenda.

- Eu não entendo e não vou entender Caivan, até que você me explique. Não é possível que alguém com uma alma tão boa possa participar de um grupo tão terrível quanto esse.

- Vamos jantar em paz Aisha. Eu prometo a você, que amanhã antes de dormir eu te explico tudo. Mas, vamos terminar o nosso dia em paz.

- Depois do que vi hoje, acho que dificilmente, enquanto estiver aqui eu terei paz.

- Me conte o que viu hoje?

- Contarei depois que você me contar o motivo de estarmos aqui.

- O jantar está pronto Aisha. Como te disse, não vou falar sobre isso hoje.

- Então não precisa mais falar Caivan. Se não for agora não precisa mais. Já estou satisfeita. Com essa sua atitude, você só demonstra que é tão crápula o quanto as pessoas que fazem parte desse grupo de extremistas.

Casamento forçado e abusivo IIIOnde histórias criam vida. Descubra agora