As consequências

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Nos minutos seguintes Aisha e Lina ficaram a chorar, já sentindo falta do esposo que não teve nem tempo de descansar um pouco antes de ser preso. Depois de muita reflexão Aisha questionou:

- O que será de nós se Caivan for condenado a morte Lina?

- Eu não sei Aisha. Teremos que fazer tudo para fugir do regime, pois não teremos nenhuma segurança aqui sem o nosso esposo. Mas, até isso acho muito difícil. Não está fácil para as mulheres fugirem. O regime está restringindo a saída de todos, especialmente das mulheres em período fértil, pois entendem que elas precisam se casar com combatentes para procriarem e disponibilizarem os seus filhos para a perpetuação do regime. Não sei se teremos condições de fugir.

- Imagino que ficarão de olho na gente se Caivan for condenado. Será impossível a nossa fuga. A família de Omar, certamente, vai me colocar como culpada da morte dele e eu estou totalmente perdida. Agora sim eles vão acabar comigo e não terei Caivan para me defender. Omar precisa viver. Tanto o nosso esposo quanto nós dependemos disso. Afirma Aisha com um semblante assustado.

- Ficamos em um beco sem saída Aisha. Em qualquer situação em que a vida do nosso esposo não estivesse em risco eu torceria muito para que Omar morresse. Mas, na situação que estamos temos que rezar pela vida desse homem repugnante, pois o nosso futuro depende dele.

- Isso é que é o pior. Depois de tudo que passei nas mãos desse homem, tenho que torcer para que ele se recupere o mais rápido possível para ter o nosso esposo de volta.

Ao chegar na delegacia, Caivan foi levado para uma sala para prestar depoimento. Depois de saberem o que ocorreu com Omar, aqueles homens foram muito respeitosos com ele, deixando que ele relatasse a sua versão dos fatos sem maiores pressões. A maioria daqueles policiais tinham uma admiração enorme pela história de vitórias que ele tinha no campo de batalha.

Ainda naquele dia ele recebeu a visita do comandante militar, o mesmo em que ele havia conversado pouco antes de ir até a delegacia, e aquele oficial demonstrou preocupações:

- Eu disse para você esfriar a cabeça Caivan e não realizar nenhum ato impensado que pudesse se arrepender depois.

- Peço desculpas comandante, mas não foi possível. Quando soube que Omar ameaçou a minha esposa eu não consegui me controlar e vim direto para cá. Quando ele me disse que minha esposa mereceu ser agredida eu não suportei, perdi a cabeça e parti para cima dele.

- A sua situação é muito delicada. Você agrediu de forma muito violenta o chefe de polícia da capital do regime. Além disso Omar é um homem de família nobre. O tio dele é um dos homens mais importantes do regime e está fazendo um esforço enorme para que te condenem a morte.

- Acha que tenho alguma chance de não ser condenado a pena capital senhor?

- O grande problema é que Omar está muito mal no hospital. Foi internado em coma e não sabemos a extensão dos seus ferimentos. Se ele se recuperar totalmente, acho que podem aliviar para você pelos serviços prestados ao regime, especialmente as conquistas dos últimos meses, mas, se ele morrer ou tiver qualquer sequela, acho que a sua condenação a pena capital será irreversível.

- Eu sinto muito que isso tenha acontecido comandante. Sinto muito mesmo. Não deu pra segurar. O senhor precisava ver como a minha esposa estava machucada. Eles a agrediram muito para que ela ficasse daquela forma. Só de pensar que eu estava a lutar enquanto eles agrediam alguém da minha família, me gera uma revolta extrema!

- Entendo o seu lado Caivan. Todos do exército acharam um absurdo a prisão da sua esposa. Por isso eu intervi, no sentido de que eles a libertassem. Mas, em nenhum momento soube que ela estava a passar por tortura aqui na prisão. Omar me negou veementemente que isso estava a ocorrer, por isso não intervi de forma mais incisiva.

- Assim que ele a libertou, jurou que na próxima oportunidade que tivesse a mataria senhor. Eu não sei que ódio é esse que Omar tem da minha esposa?

- Omar é um homem egocêntrico e conservador ao extremo senhor Caivan. Ele não suporta o fato de que o senhor tenha casado com mulheres que viveram na cultura Ocidental. Ele as acha muito extravagantes e nunca escondeu isso de todos. Ele julga que mulheres assim podem mudar os rumos da cultura do nosso Estado. Que elas são muito questionadoras. Que não aceitam o que o regime recomenda. Quando o senhor me pediu autorização para que as suas mulheres ficassem em casa, enquanto estivesse fora, eu imaginei que isso geraria problemas, pois essa não é a recomendação do regime para uma pessoa importante como o senhor. Mas, deixei porque era o senhor. Talvez eu tenha errado e esse erro gerou o problema que estamos a viver hoje.

- Ele não manda nesse regime senhor. Acha que manda, mas ele não manda. Somos nós que estamos na linha de frente. Somos nós que estamos a lutar para que todas essas pessoas tenham uma vida mais segura aqui. Somos nós que damos o sangue no campo de batalha para que ele tenha o poder que tem. É muito injusto ele imaginar que pode comandar as nossas vidas e até onde as nossas mulheres devem ficar enquanto estamos lutando pela pele dele.

- Eu entendo o seu ponto de vista Caivan, mas não é bom enfrentar alguém como Omar por tudo que ele representa. Ele tem influência direta sobre todo o comando do regime. Tem uma posição importantíssima aqui na Capital. Recomendo muito que se sair daqui, que haja conforme é recomendado pelo regime. Deixe as suas mulheres em alguma casa, mesmo que não seja a dele.

- Comandante, eu nunca neguei atender uma ordem sua. Mas, dessa vez, não vou deixar que Omar consiga aquilo que ele quer. Eu não vou me curvar a uma coisa absurda como essa. As minhas mulheres na minha casa não estão fazendo mal nenhum a ele ou a esse regime. Há milhares de mulheres de soldados de menor patente vivendo sozinhas em suas casas com seus filhos, por não ter alternativa e ninguém diz nada. Por que todos perseguem só as minhas esposas?

- Porque o senhor é um homem importante para esse regime senhor Caivan e quando toma uma ação isso realmente influencia os demais moradores.

- Eu não vou mudar a minha conduta com relação as minhas mulheres. Elas vão ficar na minha casa enquanto eu estiver a lutar. Posso fazer medidas para que elas tenham mais proteção, mas elas não sairão da minha casa porque o senhor Omar quer!

- Bem, o senhor que sabe. De qualquer forma tentarei te defender. Tentarei mobilizar os oficiais para que eles pressionem o regime de alguma forma, na medida do possível, para que se Omar sobreviver, que a sua pena seja branda. Não sei se vou conseguir, mas, prometo tentar.

- Você sempre me salvando comandante. Me salvou no Afeganistão e agora novamente.

- Você é o melhor oficial que já tive na vida Caivan. Não te abandonaria assim depois de tudo que fez por esse regime. Espero que tenhamos sorte, que Omar possa se recuperar e que em breve você possa retornar a luta, pois estamos precisando muito de você.

- Assim que estiver livre, retornarei para o campo de batalha senhor e espero muito corresponder as suas expectativas e necessidades. Muito obrigado pela ajuda de sempre.

- Tudo dará certo. Diz aquele comandante em despedida.

Os três dias seguintes passam sem maiores acontecimentos, com Omar ainda em coma, sem sinais de melhora e os membros do regime, políticos e religiosos, tomando ações para que Caivan fosse condenado a pena capital.

Enquanto isso os membros do exército tentavam convencer a todos que a situação estava muito desfavorável no campo militar e que Caivan era o principal comandante do melhor destacamento militar que eles possuíam. Uma condenação a morte dele poderia desmobilizar aquele grupo de elite, que já estava a perder a moral ao ter o seu comandante preso. Aquele regime, diante daquele contexto, enfraquecido e atacado de vários lados, poderia cair em ruína dependendo do destino de Caivan, alertava o comandante do exército nas reuniões sobre o tema.

Casamento forçado e abusivo IIIOnde histórias criam vida. Descubra agora