As horas seguintes

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Omar saiu daquela casa decidido a ir até o quartel para chamar reforço e partir imediatamente para a casa de Caivan para prender aquelas duas mulheres. Com sangue nos olhos após ser afrontado, ele queria muito cumprir a sua promessa de quebrar os ossos de Aisha naquele momento de ódio extremo e por tabela surrar Lina, mais uma vez, por ela ter feito algo que ele julgava fora das regras daquele regime.

Mas, a medida que ia dirigindo, foi colocando a cabeça no lugar e percebendo que uma afronta a alguém tão importante quanto Caivan, atingindo as suas esposas que ele alardeava por todos os lugares amá-las intensamente, poderiam trazer consequências imprevisíveis quando aquele oficial retornasse do campo de batalha. Então, ao chegar no meio do caminho, ele decidiu mudar de rota e ir para a sua casa.

Chegando em sua morada, ele tomou um banho para tentar esfriar a cabeça. Em sua mente ele imaginava o medo que aquelas duas mulheres deveriam estar a sentir naquele momento. Conhecendo muito bem as técnicas de tortura, ele sabia que o terror psicológico muitas vezes era mais efetivo e devastador do que a tortura física. Deixar aquelas duas mulheres na expectativa de uma punição exemplar, provavelmente era muito mais aterrorizante do que efetivar essa ação de imediato.

Diante dessa perspectiva, ele saiu sorrindo do banheiro, relembrando da submissão que Lina demonstrou para ele no momento em que ele a soltou e que ela não reagiu de nenhuma forma depois que ele a agrediu com aquele forte tapa. A Lina é uma mulher do jeito que a nossa cultura prega, mesmo não tendo nascido aqui. Já aquela Aisha, ainda terei a oportunidade de colocá-la em seu devido lugar. Ela ainda vai implorar para que tenha piedade dela e não terei. Eu prometo que não terei quando esse momento chegar. Eu vou acabar com aquela ocidentalzinha que pensa que pode mandar nas minhas terras. Ela não perde por esperar. Pensou ele.

Assim como as esposas de Caivan, naquela noite Omar também não conseguiu dormir. Ele estava muito envolto de ódio com a afronta de Aisha. Ficou a noite inteira a planejar como seria a sua vingança nos dias seguintes. Se ele deveria prendê-la em casa, ou se era melhor esperar ela cometer algum crime mais pesado para que a prisão fosse realizada e Caivan não tivesse oportunidade de se voltar contra ele, diante da Lei e de testemunhas.

Depois de muito pensar, ele preferiu a segunda opção. Nesse meio tempo, ele imaginava que o terror que aquelas mulheres passariam, diante da ameaça constante de serem presas, já seria um castigo suficiente a priori. Elas não teriam paz enquanto Caivan não chegasse e ele não fazia nem ideia de quando isso aconteceria. Omar estava decidido a prender aquelas mulheres apenas se elas saíssem na rua, mas, assim que isso ocorresse, ele faria tal ação sem pestanejar. Se Aisha e Lina pisassem fora de casa e ele as visse, elas não sairiam mais de suas garras.

Ao amanhecer, Aisha e Lina simplesmente levantaram, pois não pegaram no sono. Ambas já estavam mais calmas, em certa medida, porque não haviam sido presas durante a madrugada, mas, tinham muito receio de serem capturadas durante o dia, horário mais comum para a ocorrência de prisões, especialmente de mulheres naquele regime, quando elas estavam em casa.

Por volta das 10 da manhã, elas escutaram um som de batidas no portão e seus corações quase foram parar na boca de tanto desespero. Aisha vestiu a roupa apropriada para receber visitas externas, pegou a sua arma e foi até o portão, enquanto Lina rezava muito para que não fosse a polícia.

Ao chegar no portão, Aisha questionou:

- Quem é?

- Sou eu Aisha, a sua vizinha Amira. Eu queria saber se vocês têm um pouco de farinha para me dar, pois estamos completamente sem alimentos em casa.

- Vou pegar para a senhora Amira, mas queria saber se a senhora consegue avistar alguém nas proximidades a nos observar, pois estamos com medo da polícia vir nos importunar de alguma forma. Temos evitado abrir o portão com receio, pois ontem um policial agrediu Lina por ela ter atendido uma das famílias.

- Não senhora, não tem ninguém aqui que possa avistar. Mas, se tiver como doar a farinha, pode entregar por baixo da porta. Não precisa abrir. Eu sei que para vocês que ficam sozinhas em casa, a polícia tem mesmo um olhar mais cuidadoso e vocês precisam mesmo se proteger.

- Que bom que me entende. Eu vou pegar para a senhora e já retorno.

Aisha chegou na cozinha e disse para Lina que era Amira que estava a pedir uma doação de farinha. Nesse instante Lina suspirou demonstrando uma tranquilização, já que não era a polícia na porta. Então, foi pego o que aquela senhora pediu de doação e foi lhe entregue por baixo da porta. Daquele momento em diante elas agiriam daquela forma sempre que possível para não chamar a atenção da polícia ou não serem abordadas de forma desprevenida como havia ocorrido com Lina.

Mesmo com esses cuidados aquele dia parecia não passar. O medo daquelas duas mulheres era constante, Omar na mente delas, poderia aparecer a qualquer momento para prendê-las e elas não imaginavam o que poderia acontecer se isso viesse a ocorrer. Nesse sentido, aquele senhor acostumado com a tortura psicológica tinha razão. As vezes é muito pior deixar as pessoas na expectativa de um sofrimento extremo do que a própria efetivação desse ato. Novamente durante aquele dia Aisha e Lina tiveram muito dificuldade de se alimentar e durante a noite e madrugada de dormir.

Durante a madrugada tudo que Aisha rezava era para que Caivan retornasse logo, pois ela não estava mais a conseguir suportar aquela situação de medo do que Omar poderia fazer com elas nos próximos dias. Ao se recordar que da última vez que o seu esposo foi para o campo de batalha ficou por muito tempo fora, o desespero dela vinha ainda com mais intensidade, a fazendo chorar e, em certos momentos, perdida em seus pensamentos, se arrepender de ter afrontado Omar.

Ele vai acabar comigo! Eu não tenho saída. Se Omar me prender ele vai fazer muito pior do que Osnin fazia enquanto eu era casada. Eu estou perdida! Caivan, por favor retorne meu amor. Eu preciso muito de você! Eu prometo que quando você chegar vou te contar tudo o que aconteceu para que nos proteja. Nesse momento, só você pode nos salvar. Pensava ela em meio a um choro contínuo durante boa parte da madrugada, indefesa, implorando para que seu amor retornasse logo para que aquele sofrimento fosse minimizado.

Casamento forçado e abusivo IIIOnde histórias criam vida. Descubra agora