Casamento forçado e abusivo III

O chamamento

Em uma outra conversa delicada sobre o futuro, Caivan passa novas recomendações de segurança para Aisha:

- Recebi a notícia de que temos perdido ainda mais territórios importantes Aisha. A situação do regime está a se deteriorar mais rapidamente do que havíamos previsto.

- O que vamos fazer Caivan? Temo muito que eles te capturem.

- Era sobre isso que queria falar com você. Eu tenho deixado os meus oficiais de confiança com um aparelho celular. Caso aconteça algo comigo, eles estão avisados de que precisam ligar para vocês, para que possam fugir de Raqqa. Omar retornou ao posto e em uma possível falta minha ele vai querer vir atrás de você com toda a fúria Aisha. Você não pode deixar que ele te capture, pois seria o seu fim. Diz Caivan com um semblante triste e preocupado.

- Não diga isso nem de brincadeira Caivan. Diz Aisha a abraçá-lo fortemente. Quando complementa a sua fala: - Nós estamos juntos e vamos ficar juntos. Eu não vou te perder!

- Infelizmente, na situação em que estamos Aisha, temos que pensar em todas as possibilidades. Promete pra mim que não perderá tempo caso eu seja capturado ou morto?

- Não diga isso, por favor Caivan. Diz Aisha a chorar de forma ainda mais intensa.

- A guerra é um dos lugares mais perigosos que uma pessoa pode estar Aisha. A gente sabe que vai, mas nunca sabe se vai retornar. Você precisa ter isso em mente. No passado, estávamos com um exército mais poderoso e conquistando territórios. Agora estamos do outro lado, com um exército mais fraco, menos armado, perdendo territórios e com a moral dos nossos soldados muito abalada. A realidade é que eu posso sim ser capturado e você precisa fazer as ações certas para proteger a sua vida caso isso ocorra. Promete pra mim que vai fugir imediatamente se receber a ligação dos meus oficiais?

- Como vou prometer isso Caivan? Eu nem imagino uma coisa dessas. Como posso sair daqui sem saber se você estará bem ou não?

- Tem que me prometer que vai salvar a sua vida e a vida do nosso bebê que você espera Aisha. Você precisa sair daqui junto a Lina e Mohamed. Eu não sei o que seria de vocês se vocês caírem nas mãos de Omar sem eu aqui ou com uma perspectiva de retorno. Ele quer vingança contra a nossa família e não medirá esforços para fazer isso com toda a crueldade possível. Eu não quero que você sofra mais. Por favor Aisha, prometa pra mim que fugirá imediatamente, se receber uma ligação dos meus oficiais.

Muito relutante e emocionada só de pensar naquela hipótese, Aisha responde:

- Eu prometo. Farei o possível para ter forças para salvar a todos da nossa família. Mas, não quero que isso aconteça. Eu não quero perder você Caivan.

- Eu também não quero perder você Aisha. Mas, pode ser que aconteça e temos que estar preparados para isso. Eu já conversei com Nazdan. Ele vai levar todos para longe daqui caso aconteça alguma coisa comigo no campo de batalha. Tudo que peço é que fique atenta ao celular o tempo todo e que faça tudo que for necessário para se salvar, salvar o nosso filho e a nossa família se algo acontecer comigo. Você será a minha representação nessa casa, precisará ter controle emocional, agir com racionalidade, para salvar as minhas sementes nesse mundo. Essa será a sua missão.

Aisha se lembrou imediatamente das falas de seu pai Johnson nesse momento e se emocionou mais uma vez. Ela tentava negar que aquela possibilidade apresentada por Caivan estava presente naquele ambiente de guerra, mas, havia entendido a mensagem e prometeu a ele que atuaria da forma mais firme possível para proteger a sua família e as futuras gerações do amado, caso algo viesse a acontecer com ele.

Durante a madrugada em que tiveram aquela conversa, no começo do mês de maio de 2017, Caivan acorda com batidas na porta. Rapidamente Nazdan vai atender e o chama em seguida. Eram membros do exército que estavam precisando realizar uma reunião urgente com ele. Nessa madrugada não foi possível ele nem se despedir da família.

Na reunião foram passadas informações catastróficas sobre a situação da defesa da cidade, tendo aquele comando como única saída deslocar imediatamente os seus melhores soldados, incluindo Caivan, para a defesa da região sudeste que estava perdendo um importante ponto estratégico para os inimigos.

Em poucas horas o grupo comandado por Caivan estava em formação e eles partiram em direção ao campo de batalha para defender aquela posição essencial para a manutenção da cidade de Raqqa. Caivan preocupado com a situação de suas esposas, especialmente com Lina que já estava próximo de ganhar o bebê, pediu ao comandante geral para avisar a sua família que ele havia partido para o campo de batalha e que não sabia quando poderia retornar.

Durante a manhã do dia seguinte um dos oficiais entregou uma mensagem que foi lida por Aisha junto a Lina. A mensagem dizia que Caivan teve que partir com urgência para um fronte para defender o regime, sem data prevista para retornar. Aisha ficou muito triste e comentou:

- Dessa vez ele nem teve tempo de se despedir da gente.

- A situação deve estar mesmo muito séria. Isso nunca aconteceu. Caivan me disse que as coisas estavam difíceis no campo de batalha, mas parece que a situação está piorando. Constatou Lina.

- Temo muito pela segurança do nosso esposo em meio a essas batalhas difíceis Lina. Espero que ele esteja bem e que volte com segurança.

- Temos que torcer muito para isso e pedir ajuda ao magnífico para que olhe por Caivan durante a guerra Aisha.

- Temos sim Lina. Ele vai ficar bem! Dizia Aisha com esperança.

Lina durante a conversa e depois que elas se calaram, demonstrando ansiedade, ficou o tempo todo acariciando a sua barriga que já estava enorme. Naquela altura o seu bebê poderia nascer a qualquer momento, pois ela havia entrado no oitavo mês de gestação. Esse fator era uma preocupação a mais para ela. Mesmo tendo Nazdan em casa para a levar para o hospital em caso de necessidade, quando Caivan estava presente, ela se sentia mais segura e amparada. Viver aquela situação de gravidez com o marido ausente a maior parte do tempo era algo muito angustiante, mesmo para ela que já estava acostumada com essa rotina.

Aisha notava aquela fragilidade e preocupação no olhar de Lina e mesmo sem que ela dissesse nada, conseguia perceber o que aquela jovem estava pensando. Nesses momentos, ela se aproximava e a abraçava demonstrando apoio e que estava presente naquela situação, tentando de alguma forma minimizar aquele contexto que visivelmente a gerava sofrimento.