Casamento forçado e abusivo III

Uma nova carta

Passado o Natal, no dia 26 de dezembro, Aisha acordou um pouco mais disposta. Começou a fazer os serviços domésticos, quando no final da manhã alguém bateu na porta e jogou por baixo dela uma nova correspondência. Era uma outra carta de Caivan.

Novamente ela chamou Lina e as duas leram aquela mensagem juntas. Na carta Caivan mandou uma mensagem cifrada para elas as desejando um feliz natal, pois não poderia falar desse tema diretamente, haja vista que era uma festa cristã e, portanto, ele poderia ser julgado por estar atentando contra as leis da religião local se aquela carta fosse intermediada e lida por alguém antes de chegar ao destino.

Ao passar por esse ponto da mensagem, Aisha sorriu. Ela entendeu o sentido do que o esposo dizia e o porquê estava a escrever daquela forma oculta. Na continuidade da carta, Caivan diz que recebeu notícias de que os médicos estavam a retirar as sedações de Omar e que em breve receberia notícias sobre o estado de saúde dele e repassaria a elas em uma nova carta.

Caivan diz que esperava que Omar pudesse se recuperar totalmente e que se arrependeu de ter o agredido daquela forma. Reconheceu que Aisha estava certa com as palavras duras que o disse quando ele chegou em casa e que estava com muitas saudades de suas esposas.

Antes de finalizar, ele transmitiu uma nova mensagem cifrada as desejando feliz ano novo, falando das mudanças que estavam prestes a acontecer, no sentido de que esse tempo novo pudesse os trazer boas energias.

Depois de ler a carta, Aisha estava mais esperançosa e comentou para Lina:

- Se eles estão a tirar os sedativos de Omar é porque, provavelmente, ele demonstrou alguma melhora em seu quadro. Espero que fique tudo bem com ele.

- Eu também espero Aisha. Em breve teremos notícias sobre a recuperação dele e se ele melhorar totalmente, o nosso marido poderá ser libertado. Não vejo a hora disso acontecer. Estou com muitas saudades de Caivan.

- Eu também Lina. Fico impressionada com a inteligência e a sensibilidade dele nas palavras. Ele conseguiu nos dar um feliz natal e nos desejar um ótimo ano novo, sem dizer isso diretamente. Caivan era inteligente desde criança. Só evoluiu nesse sentido durante a vida.

- Espero mesmo que possamos ter um ano novo muito bom viu Aisha. Estamos precisando mesmo muito disso. Esse ano de 2016 foi um ano muito difícil, bombardeios, ficamos presas em casa por um bom tempo. Precisamos que 2017 seja um ano melhor.

- Vai ser Lina, eu tenho muita fé nisso! Temos que ter esperança!

Os demais dias daquele fim de ano se passaram rapidamente e chegou o Revellion. Diferentemente do Natal, na passagem de ano Aisha estava mais esperançosa de que os tempos de mudança lhes trariam boas novas. E, em certa medida, ela estava correta.

No dia dois de janeiro, uma nova carta foi entregue e nela haviam boas notícias:

Raqqa, 02 de janeiro de 2017

Aisha e Lina,

Recebi notícias sobre Omar. Felizmente ele está se recuperando muito bem e em poucos dias receberá alta. Em conversa com o comandante ele me disse que tem conversado com os líderes do regime sobre a necessidade crescente que eles têm de uma liderança como eu no campo de batalha e têm percebido que eles já não estão mais tão resistentes a minha libertação.

O meu julgamento será marcado para as próximas semanas e com Omar tendo uma situação melhor no dia dele, tudo leva a crer que poderei ser libertado para continuar os esforços de guerra. Estou muito feliz com as últimas notícias recebidas.

Espero que vocês estejam bem. Tenho uma expectativa muito grande de que em breve possamos estar juntos novamente.

Amo vocês!

Caivan

- Que notícia formidável. Eu disse para você que Omar iria melhorar e que tudo ficaria bem Aisha.

- Eu fiquei muito esperançosa de ter o nosso esposo de volta depois dessa carta Lina. Que bom que as coisas parecem estar dando certo!

- Acho que a frase que ouvi muitas vezes na Europa está fazendo muito sentido: Ano novo, vida nova! Diz Lina a sorrir demonstrando felicidade.

Com uma tranquilidade maior, ao fazerem os serviços domésticos, cuidarem de Mohamed e realizarem outras tarefas, aqueles dias iam passando rapidamente. Caivan enviou mais uma carta no dia 12 de janeiro, indicando que a situação de Omar havia melhorado bastante e que ele estava em casa para se recuperar. Nessa mensagem ele falou também que o seu julgamento havia sido marcado para o dia 17 de janeiro de 2017.

Em certa medida, aquela mensagem trouxe confiança para Lina e Aisha, mas ao mesmo tempo as traziam angustia, pois naquele regime, as decisões que são tomadas nesse tipo de julgamento é algo muito imprevisível, depende de muitos fatores e interesses, e elas não sabiam o que seria decido com relação a Caivan.

A medida que a data do julgamento ia se aproximando a angustia das duas ia crescendo. Será que teremos Caivan de volta? Era tudo que elas questionavam diante daquele cenário de incertezas.