O casamento

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Era vinte de agosto de 2015, uma quinta-feira e Aisha estava pronta para se casar com Caivan no final da tarde daquele dia. Ela refletiu muito durante aquela manhã e chorou por algum tempo ao relembrar a vida que tinha na Inglaterra e a liberdade que provavelmente perderia naquela sociedade após se casar.

O fato de ser impedida de estar ou reencontrar com a sua família da Inglaterra deixava o seu coração partido. Parece que naqueles momentos que antecederam o seu casamento é que a sua ficha caiu com relação as consequências da continuidade daquela sentença. Como nos dias anteriores ela estava concentrada em evitar a morte e torcendo para que Caivan suportasse aqueles castigos, ainda não havia pensado nas partes seguintes daquela condenação, mas, nesse dia, esses pensamentos vieram de forma mais intensa em sua mente e uma tristeza a consumia.

Mesmo diante de toda essa desolação, Aisha sabia que não havia o que se fazer, ou ela se casava com Caivan ou sofreria uma sentença de morte. Depois de tudo que lutou pela vida, ela nem cogitava mais essa possibilidade e queria muito viver.

Após o almoço algumas mulheres chegaram para fazer a sua maquiagem e no fim da tarde ela vestiu as roupas que seriam usadas para o casamento, ficando pronta. Às 17 horas aquela cerimônia simples foi realizada, com a presença de poucas pessoas daquela comunidade. A maioria dos presentes eram religiosos e militares que faziam questão de presenciar o cumprimento daquela parte da sentença.

Em meio a cerimônia, Aisha demonstrava um semblante nem animado e nem triste. Já Caivan estava extremamente feliz, mesmo ainda sentindo dores ao ser cumprimentado por aqueles senhores que insistiam em tocar nas suas costas extremamente debilitadas.

Todo o evento foi finalizada às 19 horas, quando eles foram para um quarto, onde ficariam presos durante os dias seguintes, até que pudessem partir para a Síria e cumprirem a terceira parte daquela sentença.

Ao chegar no quarto e ter o primeiro contato sozinha com Caivan, Aisha disse demonstrando nervosismo em sua fala:

- Olha a situação em que você me colocou Caivan. Está feliz agora?

- Aisha, eu não sabia que isso tudo iria acontecer. Se soubesse eu jamais teria a colocado em tamanho risco.

- Mas, me colocou Caivan. Eu quase morri por sua causa. Você tem noção do sofrimento que passei nesses últimos dias.

- Tenho Aisha. Eu também passei por um sofrimento parecido com o seu. E sei muito bem as dores que sentia.

- Não sabe não Caivan. No seu caso, você foi punido por um erro que cometeu de forma consciente. No meu caso não.

- Você também errou Aisha. Você sabia que era proibido se deitar comigo e fez isso.

- Então quer dizer que agora a culpa é minha? Questionou Aisha demonstrando uma ira em seu semblante.

- A culpa não é nem minha e nem sua Aisha. A culpa é da situação em que estávamos. Assim como era difícil para você resistir a vontade de estar comigo, depois de tantos anos de amor represado, para mim era a mesma coisa. Eu não consegui me controlar.

- Mas, deveria ter se controlado. Você era casado Caivan. Você me enganou.

- Eu sinto muito por tudo o que aconteceu Aisha. Eu sinto muito mesmo. Espero que você me perdoe algum dia.

- Não sei se conseguirei. Eu perdi muita coisa Caivan. Eu não vou poder mais ver a minha família na Inglaterra. Eu perdi a vida que eu tinha lá. Eu perdi o meu emprego. Eu perdi muito devido a tudo que aconteceu.

- Por favor Aisha. Me perdoa.

Então Caivan se aproxima, tentando fazer um carinho em Aisha e ela revoltada diz de forma ríspida:

- Não ouse se aproximar de mim Caivan. Eu jamais vou te perdoar pelo que fez.

- Aisha. Porque você está agindo assim?

- Você ainda pergunta? Depois de me enganar dessa forma, você ainda pergunta.

- Eu sinto muito Aisha. Se pudesse voltar eu corrigiria tudo o que fiz.

- Mas, não tem como voltar Caivan. Portanto, tudo o que quero é que você fique longe de mim. Reafirma Aisha demonstrando revolta em sua fala.

Caivan, desolado, resolve pegar um pano e colocar no chão daquele quarto, demonstrando que arrumaria um lugar para poder dormir no chão, enquanto Aisha se deita na cama.

Aquela ação dele deixou Aisha satisfeita, naquele primeiro momento. Mas, quando Caivan retirou a sua blusa para tomar um banho, o coração dela sentiu um aperto muito grande. As costas dele estavam com cicatrizes horríveis e feridas ainda abertas, com várias partes das suas costas completamente roxas, mesmo já tendo passado dois dias do fim daquele castigos. Lágrimas caíram dos olhos dela só de imaginar o sofrimento que ele passou durante aqueles sete dias de punição.

Mas, ela, querendo ter um poder de barganha maior, não demonstrava o que estava a sentir por ele. Quando ele olhou em direção a ela, para não demonstrar os seus sentimentos, ela virou o seu rosto para esconder as suas emoções e ficou deitada enquanto ele foi para o banho.

Aquele momento era o de maior sofrimento para Caivan. Sentir a água a tocar sobre aqueles pontos feridos o trazia uma dor quase que insuportável. Mas, aquilo era necessário para que aquela feridas não inflamassem.

Aisha se preparou para banhar e assim que ele saiu do banheiro, ela entrou e tomou o seu banho, deitando em seguida sem trocar mais nenhuma palavra com Caivan. Ambos ficaram pensativos por algum tempo durante aquela noite.

 Enquanto Aisha pensava: Será que estou fazendo certo, depois de tudo que ele fez por mim? Caivan arriscou a sua vida para que eu continuasse viva. Será que não fui muito severa com ele? De coração muito nobre ela teve esses pensamentos por alguns instantes. Mas, logo ela se lembrou de novo do contexto e começou a refletir de outra forma: Ele mentiu para mim. Não me disse que era casado. Me enganou. Se tivesse me dito eu jamais teria vindo. Caivan não me amava como dizia. Se me amasse de verdade, jamais teria me colocado em tamanho risco. Ele merece sim tudo que eu disse e terá que fazer muita coisa para mudar o que eu penso dele depois de tudo o que tive que passar em meio a esses castigos terríveis, por culpa dele.

Depois de se deitar no chão, Caivan pensou: Será que ela ainda vai me perdoar um dia? O nosso relacionamento estava tão bom antes de sermos pegos por esses homens. Porque a coloquei em tamanho risco? Porque não a disse a verdade. Eu sinto mesmo muito por tudo o que aconteceu. Eu não queria que Aisha ficasse presa a mim dessa forma. Eu queria que ela escolhesse estar ao meu lado e não que fosse obrigada a estar comigo. Mas, o meu amor por ela, me fez perder a cabeça e nós estarmos nessa situação. Quando chegarmos na Síria, tentarei ser o melhor marido do mundo. Assim quem sabe ela não me perdoa. Não esquece tudo que passamos nessa terra. Não se lembra o quanto o nosso amor foi bonito na infância e o quanto foi bom estar comigo em Cabul. Eu só preciso de uma nova chance e farei tudo para conquistá-la novamente.

Depois de algum tempo a refletirem, eles conseguiram pegar no sono.

Casamento forçado e abusivo IIIOnde histórias criam vida. Descubra agora