O DESPERTAR

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Nossos corpos estavam entregues aquela valsa, eu era completamente dele e ele meu, meus poros impregnados com o seu suor, a mistura dos nossos cheiros fazia daquele momento inexplicável, perfumista algum no mundo poderia descrever o aroma do nosso amor. Porém, Uma coisa ainda me incomodava, o silêncio que havia voltado entre nós. Não tínhamos coragem de nos encarar, eu com minha cabeça ainda apoiada no seu peito, resolvo quebrar os inquietantes minutos de total silêncio com o pedido mais importante da nossa história.

- Eu só preciso de uma palavra, apenas uma palavra sua e eu esqueço tudo. Por favor, diga apenas uma palavra.

A sua resposta veio com o antigo silêncio. A inquietação se transformou em dor, eu não conseguia externar o que sentia, mas internamente gritava pedindo por ele, por mais dele. Eu naquele momento não saberia, mas dos seus olhos escorriam lágrimas, o homem mais durão que conheci na vida chorava por não poder responder como eu gostaria, como ele também queria.
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17 meses antes

O Sol já havia nascido há algum tempo naquela cidadezinha, ali as galinhas ainda acordam primeiro, pessoas saem pra trabalhar às cinco da manhã no campo e vão dormir com o final do jornal das sete horas, uma cidade onde a lida é dura, onde mulheres precisam se desdobrar para criar os seus muitos filhos e os homens dividem seu tempo entre o trabalho duro na roça e um tempo no bar, tomando aquela pinga e falando banalidades como de costume.

Uma cidade com uma vasta flora, com lindas espécies de flores espalhadas pelos seus campos, com cheiro de cidade pequena, com sua população sentada nas portas de suas casas contando os causos do dia, da semana, da vida, sua principal diversão está na ida às tradicionais quermesses nos finais de semana.

Uma cidade que parece que parou no tempo, mas que tem passado por constantes modificações e tenta se adaptar a cada uma delas, não deixando as suas tradições de lado.

É nessa cidade onde Benício nasceu e viveu até hoje, e viverá até a próxima semana. Até o final desse dia uma grande novidade vai mudar completamente sua vida, e tudo que vê ao seu redor, os costumeiros cheiros e sabores terão que ser adaptados a realidade na cidade grande.

Já é dia, o despertador do celular de Benício insiste em tocar e o rapaz se utiliza do recurso do soneca no seu smartphone recém comprado. Pela próxima uma hora o jovem vai adiar o momento de levantar. A música no despertador não é aqueles toques polifônicos, é sim um estrondoso hard rock, não que ele gostasse muito do som, talvez o contrário disso, mas entendia que somente um som altamente insuportável poderia fazer com que vencesse o espírito pesado que o dominava todas as noites e inícios da manhã, o do sono.

Ele sabia que tinha sorte de morar na região central daquela cidade, caso fosse como inúmeros dos rapazes da sua idade que precisam ajudar a sua família na roça, teria sérios problemas com isso. Mas não, ele morava numa região privilegiada que o permitia travar aquela luta diária com o seu despertador, algo que costumeiramente tem feito nos últimos três anos, tempo ao qual terminou o ensino médio e conseguiu o seu primeiro e único emprego numa academia de médio porte da cidade, uma das poucas ali existentes.

O belo adormecido identifica o mesmo rock de todas as manhãs tocando novamente e volta a silenciar o celular, ele tem como filosofia de vida que você precisa do máximo de energia para enfrentar os problemas da vida e se utiliza disso para dormir até o último minuto possível.

Acontece que não foram poucas as vezes que esse pensamento o colocou numa enrascada perdendo constantemente o horário e chegando atrasado no trabalho. Vejam que interessante, por incrível que pareça esse é um desses dias.

O celular volta a tocar e ele novamente segue o seu ritual de calar o seu maior rival. Dessa vez ele observa o horário, são seis e trinta e sete da manhã, ele precisa estar às oito dentro da academia, sorri e percebe que ainda tem uma eternidade para dormir, nesse momento escuta a descarga barulhenta do único banheiro da casa, que fica justamente ao lado do seu quarto. É Fred, seu cunhado, que já deve estar saindo da casa para o trabalho, a essa altura sua irmã Berê deve estar na cozinha apressada arrumando Rosa para a creche e retirando o pão já tostado da sanduicheira para o café do marido, se atrapalhar era algo bem normal para Berê, não que sua irmã fosse irresponsável, é que para ela não era fácil conciliar as funções de boa esposa, mãe, dona de casa, irmã e profissional.

Benício antes de voltar a cochilar, acabou por se surpreender ao perceber que Fred agora está no seu quarto, ainda usando uma calça de moleton que começou a usar ultimamente. O pijama de moleton foi algo que Benício não entendeu, mas agradeceu inconscientemente ao cunhado, ele se sentia torturado com as constantes aparições de Fred apenas de cueca pela casa toda.

Desde a morte da sua mãe quando tinha ainda quatorze anos e precisou morar com Berê e seu marido bonitão, Benício precisou se ambientar com essa forma de viver mais a vontade do seu cunhado, na verdade ele também é adepto da mesma moda e tem por costume desde sempre dormir apenas de cueca, algo muitas vezes natural nos caras, mas que logo se tornou um grande teste de equilíbrio mental para Ben, isso quando ele notou que não estava indiferente aquele corpo, e que seu próprio corpo se sentia estimulado ao ver aquele homem andando de um lado para o outro apenas de roupa íntima. Ele conhecia milimetricamente cada parte do corpo do cunhado, e também cada uma de suas onze cuecas.

No aniversário de trinta e um anos do cunhado, cerca de três anos atrás, com um de seus primeiros salários na academia Benício cometeu a insanidade de comprar de presente para Fred um pacote de três cuecas que possuiam uma leve transparência em todo o seu tecido, não seria encarado como um presente com duplo sentido, aparentemente eram cuecas normais, contudo vestidas no corpo trariam visibilidade a todas as partes, porém, na hora da entrega do presente acabou se sentindo altamente culpado pela intenção e sentimento que nutriu pelo marido de sua irmã, trocou o item por uma gravata que havia comprado e não usado em sua formatura.

As cuecas transparentes ficaram pra ele mesmo, e após o banho da última noite, vestiu uma delas como muitas vezes fez nos últimos três anos antes de dormir.

O celular acabou por tocar novamente, o rapaz desperta e segue amaldiçoando o tempo que não para e percebe que seu cunhado ainda está ali de pé, de frente para a janela que existe na parede do seu quarto, Ben ensaia um movimento de se espreguiçar, mas o desânimo é cruel. Fred percebe a movimentação do rapaz e decide seguir para a cozinha, antes olha para o cunhado e ensaia uma frase, mas apenas deseja um bom dia a Benício, com a voz um tanto rouca, de quem acabou de acordar.

Ben ainda em estado zumbi o responde com a mesma rouquidão enquanto o cunhado se retira.
- Bom dia Fredelícia

E apaga novamente.

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QUERIDO BABÁ (ROMANCE GAY)Onde histórias criam vida. Descubra agora