AMANHECEU

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Quando Benício voltou a acordar naquela manhã, acabou por escutar um som diferente do habitual rock in roll no celular e percebeu que já existia uma agitação natural do seu dia. Som de carros, caminhonetes e cavalos passam com muita frequência pela sua rua, barulho de mulheres varrendo suas casas e gritando com seus filhos que já estão pendurados nas árvores de tamarindo presentes em boa parte das casas daquele bairro.

O cheiro do mato, das roseiras de Dona Mariana, e do alho fritando para temperar o feijão da casa de Dolores é presente no seu quarto, alguém já tinha aberto sua janela.

O celular não para de tocar e Benício toma um susto ao perceber que todas essas coisas não deveriam estar acontecendo ainda, a não ser que ele estivesse atrasado, atrasado não, muito atrasado e que o som do celular não era mais do despertador, e sim da oitava ligação de Vicente seu chefe no celular.

- Porraaaaaaa

O rapaz após o palavrão pula da cama e percebe que a situação é muito pior do que ele pensava, já passavam das nove horas e precisaria de uma desculpa muito convincente nos quinze minutos que correria até chegar ao trabalho. Na verdade ele já tinha utilizado todo o seu estoque, e apesar da tamanha criatividade que possuía, como matar um avô já falecido há vinte anos, ou inventar uma grave doença do seu amigo de escola já havendo se formado há três anos, ele sabia que Vicente já não acreditava mais em seus contos.

Na correria escovou os dentes porcamente, passou a mão molhada na cara amassada e depois nos cabelos curtos e vestiu a primeira bermuda e camiseta que encontrou pela frente. Não teria tempo nem para tomar um bom café da manhã, algo que iria se queixar por todo o resto da manhã.

Ao passar pela sala Ben encontou Fred sentado no sofá lendo um jornal, ainda vestindo a calça do pijama. Enquanto calçava o tênis resolveu questionar o cunhado que aparentemente estava bem concentrado na sua leitura.

- E aí Fred, de folga hoje é?

Ele sabia que isso era muito raro de acontecer, Fred conquistou tudo na vida por ser um cara muito dedicado ao trabalho, sabia também que a luta que estava travando para amarrar o cadarço do tênis e correr para o trabalho jamais aconteceria com o cunhado, Fred era o cara mais pontual que Ben teve a oportunidade de conhecer. Pontual não, ele era melhor que isso, sempre chegava antes do horário.

- Não cara. Você esqueceu? - Falou abaixando o jornal e olhando a agitação do cunhado- Eu disse ontem a noite no jantar, que o meu chefe pediu para que eu fosse hoje apenas no final do expediente, ele quer ter uma conversa séria comigo.

Ben se lembrou da conversa da noite anterior e também recordou da excitação gerada entre todos da casa, era muito provável que o assunto seja uma promoção muito merecida para o cunhado bonitão.

Benício consentiu com a cabeça demonstrando se recordar agora da fala de seu cunhado no dia anterior, enquanto se levantava e pegava a mochila, celular, carteira e chave da casa.

- Atrasado cara?
- Porra, e muito. Você bem que poderia ter me chamado.
- Mal aí velho, eu me perdi aqui com a leitura. Quer que eu te leve?
- Não, tranquilo, o tempo que você levará pra tirar essa caranga da garagem eu já estarei lá dentro da academia.
- Beleza, então corre lá meu garoto.

Enquanto saía correndo pelas ruas se desviando de todos a sua frente, pensava nas últimas palavras de Fred o chamando de seu garoto. Ele sentia saudade da amizade que um dia teve com o seu cunhado, de como ele e a irmã haviam sido fundamentais após ter ficado órfão. De como celebraram a chegada de Rosa, sentia saudade do calor dos rápidos abraços que recebia do cunhado quando ele chegava cansado do trabalho.

Era sempre algo muito automático, seu Ecosport 2005 entrando barulhento na garagem, um homem de pele clara, marcada pelo sol e pelo suor do dia, abria a porta e entrava cheio de pastas dizendo sua tradicional frase imitando o patriarca da família dinossauros.

QUERIDO BABÁ (ROMANCE GAY)Onde histórias criam vida. Descubra agora