- Nós precisamos conversar. - Micael disse sério, assim que chegou com a filha. Sophia o encarou sem entender.
- Eu estava indo tomar banho e depois fazer a janta. - Respondeu com a voz baixa. As meninas alternavam olhares entre os pais. - Conversaremos mais tarde.
- Não, a gente precisa conversar. - Insistiu. Apesar das palavras, seu tom era bem sutil. - Júlia, adianta a janta, depois a sua mãe vem. - A menina assentiu algumas vezes. Sophia rolou os olhos e subiu as escadas seguida de Micael.
- Será que eles vão brigar? - Cléo sentou ao lado da irmã. As duas ainda olhavam as silhuetas dos pais sumirem. - Tava com cara de DR.
- E o que você entende de DR? - Júlia desviou o olhar pra encarar a irmã, que a olhou de volta.
- Eu vejo novelas, eu sei o que acontece depois desse "precisamos conversar". - Ela bufou como se fosse obvio. - Papai veio muito estranho o caminho inteiro, ele quase não falou comigo. Pensei até que eu tivesse feito besteira de novo. - A menina parou e pensou um pouco. - Ai meu Deus, eu fiz besteira de novo e a mamãe me defendeu e agora eles vão brigar por causa disso? - Júlia então riu da irmã.
- Deixa de ser idiota. - Continuou rindo. - Nem tudo o que acontece tem a ver com você.
- Ei, você não tem que me xingar. - Ficou de pé com as mãos na cintura. - Eu só estou preocupada.
- É tudo culpa daquele cara lá, o Thiago. Teve uma confusão na empresa hoje por causa dele. - Ela soltou um suspiro pesado.
- Aquele seu pai? - Falou sem maldade e recebeu um olhar fulminante da irmã. - Desculpa, não foi por mal.
- É, ele mesmo. Parece que a mamãe estava brigando com ele mais cedo. - Respondeu baixo. - Eu não sei o que aconteceu naquela sala, os dois estavam sozinhos, depois nosso pai se meteu. Enfim, foi a maior confusão.
- Ele nem parece ser tão ruim assim. - A pré-adolescente conseguiu arrancar outro suspiro da irmã. - Até hoje eu não entendi muito bem essa história.
- Claro, você nem era nascida na época. - Ela riu. - E também não tem que entender nada, você é uma criança.
- Eu já tenho onze anos, não sou nenhuma criança. - Falou com raiva. - Você tem que me contar as tretas que rolaram. Naquele dia no natal eu não entendi muita coisa, só que ninguém gosta desse cara e que ele é seu pai.
- Você adora repetir isso né, pirralha? - Jú se levantou e foi andando pra cozinha. - Não adianta nem me perturbar, você ouviu o papai, eu tenho que fazer a janta. - Seguiu para a cozinha, mas a menina a seguiu bem de perto insistindo para que compartilhasse com ela o que sabia sobre o passado de seus pais.
- O que é tão urgente? - Sophia disse ao entrar no quarto e se sentar na cama. - Fez uma cena na frente das meninas, podia ter esperado até depois do jantar.
- Eu não fiz uma cena, eu te chamei pra conversar. - Disse baixo. - Eu quero entender o que foi que aconteceu entre você e Thiago antes de eu chegar.
- Ah, deixa isso pra lá, Micael. - Rolou os olhos. - Eu estou bem, isso que importa.
- Claro que não vou deixar isso pra lá. - Disse bravo. - Você chamou aquele cara pra conversar e eu quero entender o motivo. Eu tenho esse direito.
- Direito? - Ergueu uma sobrancelha. - Eu conto se eu quiser. Eu tenho a minha privacidade.
- Privacidade com aquele cara? - Cruzou os braços. - Você está arranjando briga comigo por causa daquele cara?
- Meu amor, quem está arranjando briga é você. - Ergueu as mãos. - Eu estou de boa.
- Sophia, será que dá pra falar? - Forçou a voz a ficar mais calma. - Eu só quero entender.
- A esposa do Thiago... - Ela começou a falar depois de respirar fundo. - Ela é a minha cara. Parece que sou eu.
- Chamou o cara pra conversar por causa disso? - Ergueu uma sobrancelha. - Ele é obcecado por você, sabemos disso.
- Você vai me deixar falar ou vai ficar interrompendo? - Ele ficou em silencio. - Ela é super simpática e nos recebeu muito bem, o Nathan é um amor de menino. Acontece que até agora não sai da minha cabeça o fato daquela mulher estar usando blusa com manga comprida e gola alta.
- Ela estava vestindo isso no verão do Rio de Janeiro? - Ergueu uma sobrancelha.
- E calças. - Balançou a cabeça. - Ele deve bater nela e ela esconde dessa forma. Isso me incomodou muito e na verdade está me incomodando até agora.
- Mas se ele bate nela ou deixa de bater não é da sua conta. - Sophia o fuzilou com o olhar. - Ela fica com ele aceitando isso porque quer.
- Você tem noção do absurdo que está dizendo? - A loira ficou de pé. - Ela pode aceitar isso por muitos motivos. Ela pode não ter pra onde ir, pode não ter parentes, ele pode ameaçar ela. Existe muitos "pode" pra avaliar, aquela mulher pode precisar de ajuda.
- Ela casou com ele porque quis. - Ela rolou os olhos, agora estava ficando brava. - Ela pode pedir o divorcio e sumir com o garoto, vai ganhar um bom dinheiro pra se manter.
- Até parece que você não conhece o Thiago, se ele ameaçar fazer mal ao filho dela, ameaçar tomar o menino. Nós mulheres, aguentamos muita coisa por um filho, Micael.
- Tá, ai você vai se colocar em risco por causa de uma mulher que você nem conhece? - Disse um pouco alto.
- Eu tinha você pra me ajudar quando eu precisei. - Sophia falou mais calma. - Ela pode não ter ninguém.
- Sophia, você não pode montar uma ONG de mulheres abusadas só porque você foi uma. Não da pra ajudar todo mundo do mundo. - Voltou a ficar irritada, não conseguia acreditar que seu marido era tão insensível.
- Na verdade, eu posso sim. - Pensou por um tempo. - Eu tenho dinheiro sobrando, eu posso montar um grupo onde as mulheres se ajudem, não sei. Uma pessoa não muda o mundo sozinha Micael, mas se eu fizer a minha parte aqui e outra pessoa fizer a parte dela no Japão, já estaremos mais perto de um mundo melhor. Eu não esperava que você fosse tão egoísta dessa forma.
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Virada [EM REVISÃO]
RomanceQue o mundo dá voltas, todo mundo sabe. Mas você vai esperar que isso aconteça justo com você? Que todo o mal que foi feito com brincadeiras estupidas no ensino médio fosse atrapalhar a sua vida anos depois? Que fosse se apaixonar pela maior vitim...