Cecília
Eu sai do hospital. Eu precisava respirar ar puro.
Apesar que aqui em São Paulo é impossível.
Eu tremia igual vara verde.
— Ela tá como? - Ouvi a voz de Thamara.
Eu me virei e expliquei. Ela ficou quieta. Eu não sabia o que iria fazer.
— Eu preciso ir embora, pelo menos tomar um banho e deixar minha mãe menos despreocupada, eu prometo que volto! - Thamara disse e eu concordei.
Eu sentei na calçada e peguei meu celular. Fui no número da minha mãe e eu tremia. Eu mordia minha boca forte, parecia nem doer. Eu apertei com tudo no número dela. Tocou uma, duas e...
Ligação 📞
— Oi Ceci, tudo tranquilo por ai? - Minha mãe disse logo que atendeu.
Eu suspirei fundo.
— Mãe, você tá perto de alguém? Se tiver, vai pra um lugar sozinha por favor! - Falei.
Ela ficou quieta por alguns minutos.
— Pode falar. To trancada no teu quarto. Aconteceu alguma coisa? - Ouvi a voz da minha mãe com uma certa preocupação.
— Mãe a Dag tá internada, eu preciso que vocês venham pra cá. Mas só você e a Ellen. Não comenta nada com Orelha e nem com meu pai. Por favor. - Falei sentindo minha garganta doer.
— Como assim Cecília? Que história é essa? - Minha mãe perguntou.
— Mãe, por favor vem, não diga nada pra Ellen, por favor, só venha rápido. - Falei sentindo as lágrimas caírem...
Ela ficou quieta do outro lado da linha. Eu comecei a ouvir alguns barulhos.
— Mãe? - Chamei.
— Eu to me arrumando. Eu vou pra ai agora Cecília. Eu vou levar a Ellen, agora me diga, Dagmar tá bem? - Minha mãe perguntou.
— Ela tá viva! - Falei sentindo meu peito se rasgar.
Minha mãe desligou.
Ligação off 📞
Eu entrei novamente pro hospital. Me sentei na sala de espera. Fiquei ali até Thamara voltar. Ela ficou e eu fui pra casa correndo, deixei meu celular carregando enquanto eu tomava banho.
Nem comer eu conseguia.
Eu peguei meu celular e o carregador e fui direto pro hospital de volta. Thamara tava lá, sentada dormindo.
Eu cutuquei ela e ela tomou um susto.
— Se quiser ir pra casa, pode ir... - Falei sentando e suspirando.
Ela negou com a cabeça e eu encarei nossa senhora que estava na parede.
Fechei os olhos e comecei a rezar. Eu só queria que minha mãe chegasse logo. Queria que a Ellen tivesse ali, queria que Dagmar ficasse bem e queria que a justiça fosse outra.
Mas a justiça que Orelha faria, seria bem pior...
*****
Era sete da noite. Eu senti meu celular vibrar e vi notificação da minha dizendo que estava em São Paulo já. Eu mandei a localização e sai de lá de dentro e fiquei esperando elas lá fora. Demorou alguns minutos e logo elas desceram do carro. As duas apenas.
— Oi meu amor! - Minha mãe disse me abraçando.
Ellen veio encarando o hospital sem entender nada.
— Cadê a Dag? Mandei mensagem pra ela e nada! - Ellen disse.
Eu engoli seco. Me afastei da minha mãe e minha mãe foi guiando com ela pra dentro do hospital. Eu fui direto pegar um copo de água e voltei. Minha mãe já estava falando que Dag estava internada. Ela ficou desesperada. Eu sentei perto dela e contei o que tinha acontecido, pensa num bicho.
Mãe nenhuma aceita que mexam com teu filho.
— Quem foi o filho da puta? Eu vou ligar pro Orelha! - Ellen disse pegando o celular.
Minha mãe pegou com tudo o celular da mão dela.
— Vamos primeiro falar com o médico Ellen. - Minha mãe disse segurando a mão dela. - Primeiro vamos focar na Dagmar, depois Orelha vai atrás de quem fez! - Minha mãe disse.
— Não. Orelha precisa saber do que houve! - Ellen disse com lágrimas nos olhos.
— E você acha que ele pode entrar nesse hospital? Você acha mesmo? - Minha mãe perguntou como se fosse óbvio.
Ellen mordeu a boca firme e fechou os olhos suspirando.
******
Elas entraram lá pra falar com o médico, ficaram umas meia hora. E quando voltou, Ellen tava em prantos.
Thamara na mesma hora se propôs pra levar Ellen tomar um ar e ela aceitou indo. Minha mãe veio até a mim e me abraçou.
— E ai? O que deu? - Perguntei.
— Foi um estupro bruto demais, introduziram dois pênis no ânus, eles machucaram o pênis dele também, vai ter que fazer cirurgia, Ellen perguntou se poderia já fazer a mudança de sexo, eles explicaram muitos detalhes sobre isso, e provavelmente façam. E a cabeça também, as pancadas foram fortes demais... Ele entrará em coma induzido... - Minha mãe disse.
Vai ficar tudo bem... Eu espero!
• aperta na estrelinha •
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Libertinagem
Teen FictionEm uma sociedade totalmente preconceituosa, existe Dagmar, uma trans que corre atrás pelos seus direitos. Mas morando na favela, o que não tem é respeito, mesmo ela sendo filha de um dos traficantes mais temido do Rio de Janeiro.