Dagmar
2 meses depois...
Era meu primeiro dia de volta pra faculdade. Eu tinha trancado a facul e tinha corrido atrás de muita coisa, a Thamara me ajudou noites e noites. Ou eu corria atrás de tudo, ou eu teria que começar no ano seguinte.
Pra mim seria um ano perdido. Eu vim aqui pra me formar, e era o que eu ia terminar de fazer o que eu tinha começado.
Eu me sentei na frente do espelho e me encarei.
— Você é forte... Você veio aqui pra se formar em moda. Ser uma designer e você vai conseguir! - Falei pra mim mesma.
Minha mente me machucava muito ainda. Eu ainda tinha os flashes na minha cabeça, e isso era o que acabava comigo de verdade.
— Tá pronta? O Uber já tá lá em baixo! - Ouvi a voz da Cecília entrando no quarto.
Eu encarei ela e assenti.
Pô, ela sim foi amiga, tava ali comigo em todo momento, não deixou eu em nenhum momento. E isso é o que a gente não esquece, das pequenas coisas.
Me levantei pegando minha bolsa e guiando pra fora. Entrei no Uber e ele me comprimento, eu fiquei quieta, Cecília entrou e já começou a papear com ele na maior intimidade, perguntando sobre a vida pessoal.
Isso por que deve tá com medo.
Aquele mesmo caminho... Eu fiquei encarando cada lugar que a gente passava.
Fazia muito tempo que eu não percorria esse caminho. Quando chegamos na faculdade eu demorei pra perceber. A Cecília já estava fora do carro. Eu sai e ela pegou na minha mão.
— Eu to contigo Dag, tu sabe, qualquer coisa me chama na minha sala que eu saio a qualquer momento! - Cecília disse e eu assenti.
Eu apertei forte na mão dela e fui caminhando com ela. Eu recebi muitos olhares, óbvio, todos sabiam quem eu era, e o que havia acontecido. Cecília me deixou na frente da minha sala. Eu entrei e mais uma vez senti os olhares dos outros. Thamara veio com tudo me abraçando.
Outra que me deu a maior força.
— Amiga, não deixei ninguém sentar no teu lugar durante todo esse tempo. - Thamara disse e eu ri.
— Se sentasse tu desse uma coça! - Falei me sentando.
Encarei a porta e Cecília ainda estava ali. Ela acenou e foi.
— Sabe o que o professor vai dar hoje? - Thamara disse e eu neguei. - Vai ser aula prática, glorificamos irmãos! - Thamara disse alto e todos olharam.
— Ainda bem, por que minha mão tá podre de tanto estudar! - Falei negando.
*****
Tava no intervalo. Eu me sentei comendo um salgado.
— Mais massa do que recheio. Eles miguelam no recheio, e a gente que nem boroca pagando dez reais nisso. Só ladeira abaixo viu Thamarinha do corre! - Falei dando uma mordidona.
Faculdade era uma lugar que me dava uma fome mostra.
Deus me livre.
Eu levava maçã, pão com mortadela, mas nunca passava a fome.
Eu tava até combinando com Thamara de começar a levar marmita, e bater um rango na aula.
— Oi margaridas! - Cecília disse com três salgados na mão.
— Morta de fome! - Falei e ela mostrou a língua.
Logo chega aquele sonso do João Aberto, Berto, fechado... Sei lá.
— Oi gente. - Ele disse, encarei ele dos pés a cabeça. - Tá fechado hoje a noite? - João Berto perguntou pra Cecília.
Coitada, ela ficou emocionada, nem respondia, tive que dar um murrão no braço da menina.
— Pode sim! - Ela disse sorrindo. - Dag, ele vai hoje lá em casa, tá bom? - Ela disse sorrindo.
Como se eu falasse não ia adiantar.
— Vai levar comida? - Perguntei e ele arqueou a sobrancelha. - Aqui é uma troca de negócios meu amigo, te dou a Cecília e você leva comida, tá achando que é de graça? Nada na vida é de graça! - Falei e ele riu.
— Pizza pode ser? - Ele perguntou e eu assenti.
João Berto tinha estilo de playboy, nada do jeito da Cecília. Mas se ela se interessou, posso fazer o que né?
Gosto de igual cu, cada um tem o teu.
Ele saiu de perto da gente e eu terminei de comer o salgado.
Minha cabeça já tava trabalhando, depois da faculdade eu ia pra fisio.
Sim, eu ainda tava fazendo.
Ia por que minha mãe me obrigava. Eu já tava boa, mas pra ela, eu tinha que fazer.
Se mãe manda, a gente tem ouvir né mores?
• aperta na estrelinha •
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Libertinagem
Teen FictionEm uma sociedade totalmente preconceituosa, existe Dagmar, uma trans que corre atrás pelos seus direitos. Mas morando na favela, o que não tem é respeito, mesmo ela sendo filha de um dos traficantes mais temido do Rio de Janeiro.