Silêncio

Mark

"Verdadeiros amigos são os solitários juntos."
Abel Bonnard

É quarta feira, estou em casa sem nada para fazer. Passei os últimos três dias ou jogando ou dormindo, mas hoje estou ansioso, não consigo me distrair ou dormir.
É o terceiro dia que não vejo ele, com a história da Safe House ele está preocupado que a distância repentina me afete, então decidimos nos ver a cada dois ou três dias até o dia 15, assim não vou sentir tanto, não sei como me torturar agora me ajudar na tortura que vai ser depois, mas sei que ele tem razão, me acostumar aos poucos é melhor.

Escuto o telefone tocando e começo a procurar, não sei onde deixei. Acho que é o Mark. Ele tem me ligado nos últimos dias e pra falar a verdade ele é legal, o Ohm tinha razão, estamos nos dando muito bem, gosto de conversar com ele, nunca tive ninguém que falasse sobre coisas profundas, aleatórias e as vezes sem sentido , ele gosta disso também então quando dei uma chance para ele, nos demos bem de cara.

Na segunda quando ele me ligou pela primeira vez, eu estava deitado tentando dormir, mas não estava conseguindo, era mais de meia noite, eu estava pensando em tomar um remédio, coisa que não faço desde que comecei a dormir com o Ohm, então o meu telefone tocou, sabia que não era ele pelo horário, quando vi o identificador era o Mark, atendi porque achei que algo podia ter acontecido.
- E aí cara, te acordei?
- Não, ainda estava acordado. Aconteceu alguma coisa?
- Na verdade não, eu só estava sem sono e sem ter com quem conversar e faz tempo que quero falar com você, então decidi ligar.
Achei aquela conversa estranha, um das coisas que aprendi com o Ohm é não confiar muito fácil, eu sempre fazia isso e muitas vezes quebrava a cara, depois que viramos amigos eu fui aprendendo com ele a me fechar aos poucos, não sou tão extremo como ele que não deixa ninguém entrar, mas também não confio facilmente.
- Então cara, eu estava pensando, acho que a gente vai se dar bem, sabe podíamos nos encontrar qualquer dia pra fazer alguma coisa. O que você gosta de fazer? Essa conversa tá estranha não e? Mas não importa, tenho certeza que estamos cosmicamente destinados a ser amigos, aposto que somos amigos em todo multiverso.
Aquilo me fez rir, ele realmente é estranho, estranho como eu.
Ficamos conversando a noite inteira, foi uma boa distração, no outro dia ele ligou de novo e ficou falando sobre a minha forma de atuar e que tipo de ator ele gostaria de ser, ele viajava muito e emendava um assunto no outro de forma aleatória, era divertido.

Achei o celular e como eu imaginei era ele.
- E aí cara, achei que não ia atender.
- Não estava achando o celular.
- Tá ocupado?
- Na verdade estou entediado. Quer vir aqui?
- Posso mesmo?
Ele parecia estranhamente feliz.
- Claro, eu mando a localização, podemos jogar alguma coisa, sei lá.
- Beleza, já chego aí.
Ele realmente parecia estranhamente feliz.

Para não ter nenhum mal entendido resolvo ligar para contar para o Ohm que ele está vindo aqui.
- Oi amor, estou morrendo de saudades, está tudo bem?
- Está sim, o que você está fazendo?
- Estou na academia, tenho passado muito tempo aqui, não está sendo fácil ficar longe, então tento gastar o máximo de energia e desviar o foco.
- Tá sendo difícil pra mim também... Escuta, liguei para contar que o Mark está vindo aqui, tudo bem?
- Legal, falei que o cara era legal e você ia gostar dele. Só avisa pra ele que se ele tentar alguma gracinha eu quebro as duas pernas dele.
- Ele não vai tentar nada, não é assim, acho que ele só é solitário, como eu.
- Você não precisa ser amor, mas eu entendo que você precisa de alguém para conversar e nunca fomos muito bons nisso, porque não temos quase nada em comum, fico feliz que você tenha alguém para isso.
- Acho que prefiro a sua conversa "eu vou quebrar as duas pernas dele", é muito estranho ouvir o meu namorado falando que está feliz de me ver com outro cara.
- Eu disse que estou feliz que você tenha alguém que te entenda, qualquer coisa que te faça bem e te faça feliz vai me deixar feliz, é simples assim.
- É por isso que eu te amo. Eu vou desligar então, liguei só pra contar isso para não ter nenhum mal entendido.
- Não se preocupe, nos vemos amanhã?
- Nos vemos amanhã.
- Não esquece de ir me mandando mensagem e de me ligar a noite.
- Tudo bem, eu ligo. Eu te amo!
- Te amo mais...
- Eu sei.
Fico esperando ele desligar, mas ele não desliga, ele nunca desliga. Então eu sorrio e desligo.

O Mark já chegou parecendo um mini tornado. Eu levei ele até o meu quarto e ele foi mexendo em tudo, toda hora falava "cara não acredito que você tem isso", "cara eu queria muito um desse", "caraaaaaaa". Ele era muito engraçado e hiperativo. Escuto a Nonnie batendo na porta e entrando.
- Nonnie esse aqui é o Mark, ele faz parte do elenco da série.
- Ahhhhh, você anda com o Phi Ohm né?!
- Eu mesmo, e aí?!
- Cadê o Ohm?
Ela pergunta olhando para mim, mas parece mais uma acusação.
- Ele está na academia.
- Porque ele não está aqui?
- Porque ele está na academia.
Ela olha para o Mark e depois para mim.
- O que vocês vão fazer?
- Vamos jogar. Agora sai fora.
- Não, deixa ela ficar com a gente. Você sabe jogar?
Ele se aproxima e coloca o braço nos ombros dela.
- Se não souber eu posso ensinar.
Ela fica vermelha na hora, acho engraçado porque pouca gente consegue fazer isso.
- Você também pode cuidar do seu irmão, vai saber o que posso fazer com ele. Vai que eu corto ele em pedaços e jogo no ácido.
- Que nojoooo...
- Sem ácido então. Quer ficar por aqui?
- Não eu tenho coisa para fazer. - ela está saindo do quarto, vira pra ele e fala - até mais tarde Phi, fica longe dele ou eu conto pro Ohm.
Quando ela sai, ele se vira para mim e pergunta:
- Ela sabe que vocês estão juntos.
- Não.
A resposta foi tão espontânea que só fui perceber depois o que ele tinha perguntado.
- Quer dizer...
- Tá tudo bem cara, eu vi vocês juntos uma vez, eu estava entrando em uma sala e vocês estavam se pegando no sofá. Tá tranquilo, não vou contar pra ninguém.
Eu não sabia o que dizer sobre isso, imagino que ele nos viu lá no começo, quando eu beijei o Ohm pela segunda vez. Se ele fosse contar para alguém já teria contado.
- Tudo bem, valeu.
- Vocês estão juntos a muito tempo?
- Essa é uma questão complicada de responder.
- Ok. Então o que vamos fazer?

Ele volta a andar pelo quarto e pega uma manopla do Thanos que está na prateleira e coloca, depois pega o violão e começa a cantar uma música muito antiga. Eu não aguento e começo a rir, o cara é hilário. Ele chega perto de mim e fala.
- Vamos lá, eu sei que você conhece a letra.
- Sai pra lá, eu não vou fazer isso.
Ele canta mais uma parte e diz.
- Senhoras e senhores com vocês Nanon Korapat! Nanon! Nanon! Nanon!
Eu levanto finjo que estou com um microfone e comeco a cantar com ele. É ridículo, mas eu adorei.

Ele fica comigo o dia todo, me diverti tanto que nem vi o tempo passar, ele se sentia a vontade como se fizesse isso comigo há anos e acho que isso que me deixou a vontade com ele também.
A noite ele fala que está indo embora e eu pergunto se ele não quer ficar e dormir aqui. Ele fica muito feliz e eu penso que ele realmente deve ser muito solitário, eu sei como é.