Torpor

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"E mesmo assim doía. A dor estava sempre presente, me puxando para dentro, exigindo ser sentida."
A Culpa é das Estrelas


Eu continuo chorando, por minutos, talvez horas, tenho a sensação de que o tempo passou sem eu perceber, continuei chorando, chorando, chorando, não conseguia parar de soluçar. Aquela sensação de estrangulamento não passava e sentia como se alguém tivesse pego algo do meu peito e rasgasse devagar, a dor é indescritível, como se eu estivesse despedaçando.

Ainda abraçando o Thor encolho as minhas pernas e encosto a minha testa nos joelhos, fico assim me encolhendo tentando me manter inteiro.
Será que o apartamento sempre foi tão frio? Começo a tremer, mas não tenho forças para me mexer, para sair de onde estou.
O silêncio é assustador, fico ouvindo os ecos do meu choro e dos meus soluços e algumas vezes o miado do Thor, que não tentou sair dos meus braços, algumas vezes até se esticava e passava a cabeça pelo meu pescoço, como se soubesse que alguma coisa está errada e tentasse me consolar.
Em algum momento eu perdi a consciência, não acho que dormi, foi apenas letargia, entorpecimento.
Ouço o toque do meu celular, mas está muito baixo, distante. Ele continua tocando sem parar, mas eu não consigo me mexer. O toque para e recomeça de novo, de novo, de novo, de novo, de novo....
E se aconteceu alguma coisa com ele? Eu levanto assustado e começo a procurar o celular, vejo que tem 57 ligações perdidas, inúmeras mensagens, nenhuma é dele. Vejo todos que mandaram mensagem, mas nenhum poderia ser algo sobre ele, então apenas ignoro. O celular começa a tocar e é a minha mãe, mas não quero falar com ela, então silêncio o toque. Sento no chão e o Thor pula no meu colo, a tela do celular acende e é a minha mãe ligando mais uma vez, deixo o celular no chão e começo a fazer carinho no gato. Várias pessoas ligam, toda hora entra sinal de mensagens, eu olho sempre pra ver se é o Ohm e depois volto para o torpor.
Mais uma vez me perco no tempo, paro de prestar atenção no celular e fico olhando para a janela.
Escuto alguém batendo na porta, ignoro também, se eu não atender a pessoa vai embora... mas a pessoa não vai, continua batendo, batendo e batendo.
Me levanto e vou até a porta, abro e é a Kwang.
- Aí meu Deus Nanon!
Ele coloca as duas mãos na boca e está com uma cara muito assustada. Eu não digo nada, só deixo a porta aberta e vou para o sofá. Escuto ela se aproximando.
- Nanon, estou tentando falar com você há horas, você não viu as minhas mensagens?
Eu olho para a janela e não respondo, na verdade eu não vi nada.
- Nanon, você tem uma reunião de emergência com o P'Tha para falar sobre o que aconteceu ontem.
Sinto o meu peito rasgando novamente e me encolho, eu não quero falar sobre o que aconteceu ontem, não quero nem pensar no que aconteceu.
- Nanon, isso é sério, a situação saiu do controle.
- Porque você está aqui? Como me encontrou?
- Eu liguei para a sua mãe te procurando, ela não queria dizer onde você estava, mas eu disse que era uma emergência, então ela acabou contando.
Eu apenas aceno.
- Nanon, por favor, se arruma e vamos para a reunião, você já está muito atrasado.
Eu aceno e me levanto, vou até o quarto, pego um conjunto de moletons preto, quando estou fechando a porta eu vejo aquela caixa e pela primeira vez eu saio do torpor e sinto raiva, é tudo por causa dessa merda, eu sabia que não devia ter seguido com isso. Pego a caixa, vou até a comoda e coloco tudo que está dentro dela, tento fechar, mas não da, então deixo ela aberta, sei que não dá pra fazer nada agora com a Kwang aqui, então deixo no canto para me livrar disso assim que conseguir, me arrumo vou até o banheiro e vejo que a minha cara está toda manchada, esqueci completamente que estava com maquiagem e as lágrimas deixaram rastros por onde passaram.
Lavo o rosto, mas tenho impressão que estava melhor antes. Estou muito pálido, com olheiras tão profundas e olhos inchados que parece que eu entrei em uma briga. Escovo os dentes e tento pentear o cabelo, mas ele ainda está com os produtos que colocaram ontem, está pegajoso porque em algum momento eu acabei suando. Vou até o armário e pego uma touca e um óculos, coloco e vou para a sala. A Kwang ainda me olha com aquela cara assustada, mas não fala nada.

Quando chegamos na empresa vamos direto para a sala do P'Tha, quando eu entro a primeira pessoa que eu vejo é o Ohm, ele está sentado de frente para o Phi e de costas para mim.
- Nanon, que bom que você chegou.
O Ohm vira e me olha, então olha para a frente de novo.
- Antes de começarmos, será que vocês podem nos deixar sozinhos por um momento?
O P'Tha faz uma cara de que não está de acordo, mas levanta e sai mesmo assim, quando chega na porta diz.
- Vocês tem cinco minutos, por favor, não briguem.
Ele sai e a Kwang sai atrás dele. O Ohm se levanta e se aproxima devagar, quando está bem próximo ele levanta as mãos e tira os meus óculos.
- Pelo amor de Deus, amor!
Ele me abraça forte e eu não sei como agir, isso está errado, não deveria ser assim, não depois do que eu fiz.
- Non, me desculpe, me perdoa por favor!
Como assim perdoar ele?
- Me perdoa, eu não devia ter dito aquelas coisas, não devia ter te magoado assim.
Eu não aguento e choro mais uma vez e me afasto.
- Você não vai fazer isso, não vai me transformar na vítima da história de novo Ohm! Você estava certo, eu sou um monstro, que tipo de pessoa faz o que eu fiz?
- Está tudo bem, eu entendo, você só queria me tirar de lá e...
- Não, para! Não faz isso, nada daquilo foi certo, não justifique o que eu fiz.
Ele passa a mão pelos cabelos.
- Podemos conversar em casa sobre isso? O nosso tempo está acabando e eles vão voltar, não quero conversar na frente deles.
- Você quer ir para casa comigo?
- Para onde mais eu iria amor?
Ele me abraça de novo e me beija, isso parace tão errado, eu sinto mais uma vez o peito rasgando e me encolho. Ele me afasta e limpa as minhas lágrimas.
- Vai ficar tudo bem amor, nós vamos resolver isso.
Quando a porta se abre, ele coloca o óculos em mim de novo e olha para o P'Tha.
- Phi, está tudo bem agora, como está a situação?
Ele passa por nós e me olha, então se senta, aponta para as cadeiras, o Ohm suspira e toca na minha cintura me guiando para lá. Nós sentamos e ele me olha de novo.
- Nanon, está tudo bem?
Eu apenas aceno, ele fica me encarando, então olha para o Ohm.
- O que aconteceu ontem?
- Foi tudo culpa minha phi, eu vou assumir a responsabilidade e as consequências.
- Não é tão simples assim Pawat, existem videos e fotos da briga, não é como as outras vezes, dessa vez o mundo viu acontecer.
- Eu sinto muito phi.
- Por enquanto vamos esperar as coisas se acalmarem e depois decidimos o que fazer, vamos limpar a agenda pública de vocês por pelo menos três dias, vocês estão bem para trabalhar juntos?
- Está tudo bem mesmo phi, não se preocupe.
Ele me olha mais uma vez, mas como eu não digo nada, ele não diz nada também.
- Tudo bem então, por enquanto ficamos assim, mas se acontecer alguma coisa vocês tem que me avisar.
O Ohm concorda e se levanta, como eu não me mexo pega a minha mão e me puxa. Ele pede desculpas e se despede, eu apenas aceno e saímos.
Ele me leva até o carro, entra e coloca o cinto em mim.
- Vamos para a casa amor?
Eu aceno, ele acena também e vamos embora.

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