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"A felicidade não depende do que nos falta, mas do bom uso do que temos."
Thomas Hardy

Odeio dias que começam tranquilos, eles sempre parecem ter um mau agouro.
Levantei mais cedo, fiz um almoço para o Ohm que tinha ido a academia, ele estava de dieta há dias, então fiz a sua comida favorita, porco com manjericão, arroz e a minha omelete que ele sempre pede. Nós almoçamos, lemos o roteiro de um evento que vamos gravar, discutimos algumas coisas que poderíamos ou não falar, ensaiamos um pouco, sempre pedem que cantemos as músicas da série e tento sempre deixar ele confiante, ele realmente melhorou muito.

A tarde o Mark vem para jogar comigo e ele fica comigo na cama e o Ohm fica em uma poltrona que compramos para deixar no quarto, ele aproveita para assistir as aulas de inglês.
O Mark como sempre está animado, tá toda hora gritando ou xingando por causa do jogo, mas o Ohm sempre foi muito focado, então não chegamos a incomodar ele realmente.
Passamos horas assim, jogando e falando sobre coisas aleatórias. Quando vejo o horário já são 17h, olho para o Ohm, mas ele continua tranquilo estudando, eu amo ver ele assim. O Mark bate no meu braço.
- Ei cara, acorda.
- O que?
- Você perdeu a explosão, foi tipo, bummm! O Big Bang!
- Falando nisso, viu que estão tentando descobrir como foi o Big Bang? Aí tem a tal partícula de Boson de Higgs, pense que se conseguirem recriar isso em laboratório, o humano vai evoluir tanto em tecnologia, vai descobrir como fazer isso e como viajar no tempo, daí vamos descobrir que quem começou o universo foi o humano.
- No vácuo? Come eles chegariam no nada? Ou eles abririam um buraco de minhoca e jogariam o coquetel molotov lá?
- Sim, abririam um buraco de minhoca.
- Mas é um paradoxo, como existiríamos hoje para criar o universo, se não existiríamos se o universo não se criasse sozinho?
- Não é paradoxo se é cíclico, só vira paradoxo se tira uma variável.
- Mas teria que ter um começo, essa é a variavel.
- Tem uma série que eu assisti que explica isso, eles encontram as peças de uma máquina no presente, fazem engenharia pra descobrir como funciona, aí os do futuro que conseguem voltar no tempo voltam com as peças prontas e enterram no passado, para elas serem encontradas no presente.
- Só porque fizeram em uma série, não quer dizer que faz sentido. Ainda acho que mesmo cíclico teria que ter um comeco e sempre que tentassem fazer criariam uma outra realidade. Poderia ser assim a criação do multiverso, cada vez que criam o universo, não estão criando O universo, mas um novo universo.
- Mas isso é quando tem paradoxo, como na história de matar o avô, essa é a variável.
- Que avô?
- Ué o paradoxo do avô
- Não sei.
- Você volta no passado e mata seu avô quando ele era jovem.. ele não vai ter o pai e não vai nascer você pra voltar no tempo e matar ele. Isso é um paradoxo.
- Então se por algum motivo alguém resolvesse quebrar a roda o universo não existiria?
- A ideia de pessoas do futuro voltar no tempo e começar o universo só vira paradoxo se tiver alguma variável que mude.
- Mas se o universo nunca foi criado seria apenas vácuo, não teria criação...
Ele continua falando, mas eu paro de prestar a atenção quando vejo o Ohm passar por nós e sair do quarto. Acho que dessa vez incomodamos ele.
- Ei cara...
- Ok ok.

Uma hora depois o Mark vai embora, depois que ele sai eu vou até o sofá e me sento ao lado do Ohm, ele continua olhando para o tablet, com os fones no ouvido. Fico olhando para ele e sei que alguma coisa está errada.
Eu fico por alguns minutos ali, mas ele não me olha e não fala comigo, então eu levanto e vou tomar banho. Depois do banho eu vou até a sala, mas ele não está ali, nem a cozinha. Saiu e não avisou, com certeza tem alguma coisa errada. Me deito e tento esperar ele, mas a acabo dormindo, no outro dia quando acordo ele não está. Mando mensagem, ele visualiza, mas não responde.
Fico ansioso, não gosto de não saber o que está acontecendo. Até procurei nas redes sociais para ver se tinha acontecido alguma coisa, as vezes o mundo sabe de algo sobre nós antes mesmo de nós sabermos, mas não tem nada, só as interações normais.
Pego o violão para me acalmar, fico tocando, estou compondo uma música sobre nós. Me perco nisso, fico fazendo por horas.

Quando vejo ele está abrindo a porta, ele olha para mim e suspira. Me levanto e vou até ele e o beijo.
- Vai me dizer o que está acontecendo?
- Não é nada. Ja comeu?
- Não e não vou comer até você conversar comigo. Onde você dormiu?
- Ao seu lado.
- Ok, porque não me acordou.
- Não quis incomodar.
- Onde você foi ontem?
- No doutor Alm.
- Mas você não tinha consulta.
- Eu liguei e pedi pra me atender, ele me atendeu depois do horário.
Eu o abraço e falo.
- Conversa comigo.
Ele encosta o rosto na minha cabeça e me abraça.
- Esse é o problema, eu não sei conversar com você.
Eu olho sem entender, ele toca o meu rosto e fica me olhando em uma mistura de adoração e sofrimento.
- Nos nunca conversamos, não como você conversa com o Mark, nos falamos de trabalho, estudo, coisas aleatórias, mas nunca de coisas que você gosta.
- E nem de coisas que você gosta. Isso te incomoda? Eu não gostar de malhar, por exemplo?
- Claro que não.
- Então porque eu me incomodaria por você não gostar das coisas que eu gosto, gostamos de coisas diferentes, sempre fomos assim e isso nunca foi um problema e não será um problema. Achei que você gostasse de eu ter alguém para conversar.
- É diferente quando eu tenho que ver acontecendo.
- Se te incomoda, quando eu for fazer alguma coisa com ele eu posso ir para casa.
- Não, essa é a sua casa, eu vou ficar bem.
- Tem certeza?
- Absoluta. Agora vamos comer.
Eu sigo ele, mas sei que ele não está bem ainda, beijo o seu pescoço e preparamos o almoço juntos, comemos e lavamos a louça em silêncio, então eu tenho uma ideia.
- E se a gente arrumar uma coisa para fazer juntos, algo que os dois gostem?
- Não acho que teríamos muitas opções.
- E se treinarmos inglês juntos, sei que você está se esforçando para aprender rápido, eu desenvolvo o meu inglês junto com você. Podemos fazer isso, conversar em inglês as vezes.
Ele sorri e concorda, então pergunta:
- Shall we play today?
- Of course. Handcuffs?
Ele sorri,  vem até mim, se ajoelha na minha frente e fica me olhando.
- Give me a blowjob, dear!

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