Capítulo 96

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Ao voltar para a própria cama e se posicionar confortavelmente no peito de Gilbert, ela imediatamente sentiu os olhos pesarem.

- Por que não medita sobre o assunto enquanto dorme, Di? Estou morrendo de sono - bocejou, encaixando o rosto na curva do pescoço do namorado para tentar tampar a luz.

- Está embriagada, isso sim - disse Bert quando ela puxou sua blusa levemente para cima - o que está tentando fazer?

- Entrar aí dentro.

- Dentro de onde? - ele segurou a risada, olhando para os outros, que os observavam com sorrisinhos.

- Dentro da sua camiseta - insistiu - não é conversa de bêbada, me dê cinco segundos - colocou a cabeça por dentro da barra da blusa larga do Blythe e foi se encaixando, até estar dividindo a gola com ele - viu?

- Vi você sendo a pessoa mais manhosa que já nasceu - respondeu, puxando a coberta por cima dela - com o tanto que se revira dormindo, vai acabar rasgando a camiseta.

- Cale a boca e aproveite - resmungou, e logo adormeceu.

Os cinco caíram na gargalhada.

- Como ela dormiu tão rápido? - estranhou Ruby, cutucando a Stacy. Ela nem se mexeu. A risada de Anne ficou mais alta.

- Gilbert, ela é sempre assim? - riu Cole.

- Principalmente quando está com sono - concordou, acariciando o cabelo da garota - do que vocês estão zombando? - ergueu as sobrancelhas - Invejosos - acusou, sorridente.

- Estou verde de inveja - admitiu Nan sem qualquer vergonha - quando tem sono lá em casa, Nia fica num mal-humor que nem milagre resolve. Pelo amor de Deus, Gilbert, me ensine o truque - juntou as mãos em um implorar que fez Biby rir.

- Nada pode solucionar seu problema, querida Anne, nada além da minha nobre presença - respondeu, pomposo.

- Oh, o que será de mim? - dramatizou, colocando a mão na testa e caindo teatralmente no colo de Diana.

Mais gargalhadas foram ouvidas.

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"Tudo o que é bom dura pouco"

Tania entendia o significado daquela frase.

Seu pouco tempo de absoluta felicidade na festa estava definitivamente acabado.

Sua cabeça doía, a luz fraca que atravessava as cortinas e entrava pelas pálpebras (que ainda não conseguira abrir) lhe machucava os olhos e ela arrancaria a língua de quem falasse acima de um sussurro.

O gosto em sua boca era tão terrível que ela se perguntou se não bebera xixi ao invés de champagne.

Considerando que o dia já havia raiado e ela não escutava sinais de caos absoluto, a Stacy concluiu que seus amigos estavam tomando café da manhã. A porta se abriu com um rangido suave e o cérebro da garota quis explodir.

- Nia - cochichou o Blythe, agachado ao lado da cama, e ela percebeu que nem sussurros eram baixos o suficiente.

- Cala a boca - resmungou, apertando o travesseiro nas orelhas.

- Vamos embora daqui a pouco; enrolei o máximo possível, mas agora você precisa mesmo levantar - tentou puxar o travesseiro, mas ela o agarrou com mais força - Amor, se não descer logo Anne vai vir te acordar, e ela não será tão piedosa quanto eu - advertiu, ainda baixinho.

- Piedoso? Você está quase estourando meus tímpanos, Gilbert Blythe.

- Sabe bem que sua irmã fala muito mais alto do que eu, Tania Stacy. Ruby sugeriu que jogássemos um balde de água na sua cabeça e Diana teria aberto as cortinas se Cole não a tivesse impedido. Você tem dez minutos antes que elas venham arrancá-la da cama a força - beijou a testa da namorada e saiu do quarto.

Tania jogou o travesseiro na parede e gemeu alto. A cabeça dela começou a girar.

Abriu os olhos devagar e eles decidiram explodir também.

Quando chutou as cobertas e se levantou, concluiu que não tinha muito tempo antes de todo o seu corpo entrar em combustão espontânea.

Ela caminhou devagar até a janela e abriu uma frestinha das cortinas.

Estava morrendo ou apenas ficando cega?

Fechou a frestinha.

Com os olhos entreabertos, ela trocou o pijama pelo vestido que Nan havia deixado pendurado no dossel e limpou da face o resto de maquiagem da noite anterior.

Depois, escovou os dentes três ou quatro vezes, até tirar a podridão da boca.

Ao se sentar para calçar os tênis, a perspectiva de se levantar novamente a fez se arrepender mas, com um esforço sobre-humano, ela se colocou de pé, tonta.

Ao abrir a porta, a luz do enorme lustre a fez se encolher. Desceu as escadas aos trancos, dentes e punhos cerrados, e caiu numa cadeira à mesa, que era ocupada por Gilbert, Anne e Diana.

- Bom dia, Bela Adormecida - zombou Di.

- Shhh - pediu, fechando os olhos enquanto suspirava. A Barry saiu para chamar ambos os loiros, que estavam dançando no salão enquanto as decorações eram guardadas.

- Como se sente, pequena Stacy? - perguntou tia Jo do Além (qualquer lugar após as pálpebras fechadas de Nia).

- Como se meu cérebro estivesse se autodestruindo - abriu os olhos com uma lentidão de dar inveja em tartarugas.

Josephine colocou na frente dela um pequeno copo de vidro, que continha três bolotas amarelas flutuando em um líquido transparente.

- Beba - ordenou. Tania sentiu ânsia de vômito.

- São ovos crus.

- Remédio para ressaca - corrigiu.

- Ovo cru - insistiu, piscando para o rosto enrugado da mulher - sabe que eu confiaria minha vida a você, tia Josephine, mas não vou beber ovos crus.

- Então aproveite a dor de cabeça - ela deu de ombros, bem humorada, falando alto. Os ouvidos da jovem começaram a prantear.

Com um choramingo resignado, vendo Nan e Bert se esforçarem para conter a risada, ela tampou o nariz e engoliu.

...

Depois de alguns minutos e duas xícaras de café, ela se sentia um pouco melhor.

Quando um sanduíche de queijo e linguiça foi colocado na sua frente e o cheiro de comida entrou por suas narinas, Nia sentiu que morreria se não comesse naquele exato momento, e deu uma grande mordida. Ela queimou a língua e se engasgou.

- Cuidado, está quente - disse Biby, e a Stacy jogou um morango nela.

...

Depois de um café da manhã delicioso e muito quieto, porque, apesar da chatice, seus amigos tinham alguma compaixão, eles entraram na charrete que os levaria até a estação de trem, as mochilas empilhadas em um canto.

- Precisamos comprar nosso livro de mágicas - disse para o namorado. Ela estava com a cabeça no colo dele e os pés no de Ruby, recebendo cafuné e massagem, e se sentia muito bem.

- E sua tinta para cabelos - adicionou Anne, em tom de brincadeira. Tania assentiu.

- Não estava falando sério, estava? - estranhou o Mackenzie.

- Você me acharia menos linda se eu tivesse cabelo roxo e azul? - perguntou a Gilbert.

- Não - respondeu sem pensar duas vezes.

- Então sim, perfeitamente sério.

The Fairy Queen - AwaeOnde histórias criam vida. Descubra agora