Capítulo 16

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No quarto, nem Anne nem Tania conseguiam dormir, porque Ruby chorava como um bebê; essa comparação fez Tania questionar sua vontade de ter filhos.

- Na minha primeira noite neste quarto eu chorei como você está chorando - Anne disse.

- Agora sabe como eu me senti - a Stacy comentou. Ruivinha a ignorou.

- Por mais que eu tentasse, não havia espaço para a minha imaginação naquela noite fria. A princesa Cordélia desapareceu.

- Princesa Cordélia?

Enquanto Anne descrevia a princesa Cordélia, e falava longamente sobre seu vestido de veludo com mangas bufantes, Tania correu até sua bolsa de pano velha e pegou um tecido de veludo que guardava ali, junto com as outras coisas de seus pais que sempre levava consigo quando se mudava, além do kit de costura que Marilla havia dado para ela, e pôs-se a trabalhar, ignorando os olhares interrogativos das meninas.

Depois de conversar bastante e decidir que fariam biscoitos mais tarde, Ruby caiu no sono enquanto Anne tinha um debate interno sobre voltar ou não para a escola, e Tania trabalhava incansavelmente no vestido de veludo castanho, com direito a mangas suavemente bufantes, saia longa e corpete de flores pintado a mão (tudo ainda em sua imaginação, mal havia terminado os moldes de papel quando as meninas acordaram).

...

Quando Anne e Ruby foram fazer os biscoitos, Tania decidiu trocar de roupa e fez algo inusitado. Abriu a mala com as coisas de sua mãe, pegou calças e uma camisa que ela havia comprado na França, e as vestiu.

Cozinharam os biscoitos e foram até a casa em reconstrução dos Gilles (ao ver o que ela estava vestindo, Anne deu um sorriso orgulhoso, enquanto Ruby parecia completamente perdida), onde encontraram todos trabalhando; todos menos o padre, que gritava com os trabalhadores. Quando lhe ofereceram biscoitos, Tania mal pôde acreditar, ele comentou sobre 'como o trabalho era pesado', sendo que elas sabiam que ele nem estava se mexendo; não disseram nada e seguiram em frente.

- Olha lá - disse Billy quando as viu - as esquisitonas e sua nova irmãzinha.

- Trazendo comida, nem me importaria se fosse o quasímodo - Gilbert retrucou.

- As vezes fico em dúvida sobre qual de vocês dois nos ama mais - Tania provocou. Andrews revirou os olhos e Blythe sorriu de leve.

Ruby, distraída admirando o moreno, tropeçou e caiu; enquanto Billy ria, ao invés de se levantar, ela ficou sentada chorando. Atencioso e preocupado como sempre, Gilbert desceu as escadas para ver como ela estava. Ele era tão cavalheiro que chegava a irritar, sinceramente (autora: eitaaa olha o ciúmes).

- Garotas são inúteis - o Andrews disse entre risos - deveriam ter ficado em casa, na cozinha.

- Qual é o seu problema? - Anne gritou.

- Ego frágil - a Stacy comentou.

- Vão para casa assar biscoitos! E deixem os homens trabalharem!

- Por que ao invés disso eu não pego esse martelo e continuo o trabalho que você está deixando de lado pra ser um bosta? - a morena xingou.

- Essa é a casa da Ruby, esqueceu?

À menção dela, Gilbert deixou seu martelo de lado e foi ajudar Ruby a se levantar. Tania, sem nem hesitar, pegou o martelo, subiu as escadas e pôs se a trabalhar. Billy quase desmaiou de raiva.

Ninguém questionou, afinal foi logo perceptível que a menina seria bastante eficiente, e que estava determinada. Algo que a mãe de Tania havia lhe dito uma vez e ela nunca esqueceria era que: você nunca pode dizer 'não' pra uma garota determinada, por que ela escuta 'eu te desafio'. Não era de se surpreender que fosse tão teimosa.

Podia sentir os olhares de todos grudados nela, mas só continuou trabalhando; dentro de algum tempo, os homens, silenciosamente ofendidos, voltaram ao que estavam fazendo, e Anne e Ruby foram embora, a loura suspirando sobre o Blythe.

- Obrigado por vir ajudar - disse ele. Tania deu de ombros.

- Meu pai era mecânico e trabalhava numa empresa de construção; esse é meio que meu habitat natural - brincou.

- Que legal.. - ele manteve-se quieto por uns segundos, olhando-a de cima a baixo - ficou ótima de calças, a propósito.

- Eu sei.

...

Horas depois, ela e Mathew voltaram para Greengables. A jovem se desviou no meio do caminho para a lojinha de materiais artesanato, onde comprou as tintas que usaria para pintar o teto de seu quarto. Como era longe de casa, chegou atrasada, mas Mathew havia avisado seu paradeiro para Marilla (o paradeiro que ela disse como desculpa, a casa de Cole), então não levou bronca.

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As bolsas abaixo dos olhos de Tania estavam cada vez mais profundas; tinha ficado acordada até tarde, trabalhando no teto, e não estava nem perto de terminar.

Mesmo assim, ficou animadíssima quando Anne a convidou a ir até a casinha de madeira na floresta, para a fundação do Clube de Histórias de Avonlea.

Após explicar a Ruby e Diana de que aquilo se tratava e declarar a primeira reunião do clube oficialmente iniciada, a ruiva sugeriu que escolhessem seus pseudônimos de escritoras.

- Escreverei com o nome artístico de Rosamond Montmorency. E você, Tania?

- Acho vou optar por algo mais místico e significativo, e que tecnicamente ainda é o meu nome - recebeu olhares interrogativos - A Rainha das Fadas (The Fairy Queen) - Anne sorriu e as outras duas continuaram com as sobrancelhas arqueadas - meu nome é russo, significa rainha das fadas - as sobrancelhas se ergueram mais ainda - o quê? Meus pais eram incríveis, superem - jogou os cabelos vaidosamente. Ruivinha, ficando instantaneamente triste por não ter conhecido os próprios pais, tratou de mudar de assunto.

- Uma vez por semana leremos nossas histórias em voz alta e conversaremos sobre elas - Tania não comentou sobre o fato de que provavelmente falaria sobre diferentes partes da mesma história, já que estava realmente empenhada em escrever um livro.

Abriram seus cadernos e potes de tinta, pegaram suas penas e puseram-se a escrever. Quer dizer, Anne e Tania puseram-se a escrever, Diana se esforçava para pensar em alguma coisa e Ruby não demorou mais de cinco segundos para dar uma grito agudo.

- Eu não consigo pensar em nada!

A ruiva não perdeu um milésimo antes de sugerir que ela escrevesse um romance trágico, e todas, animadíssimas, molharam as penas na tinta escura.

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- Nem acredito que amanhã vou voltar para a minha casa - Ruby bocejou, algumas noites depois, parecendo melancólica com a afirmação - e que as aulas vão recomeçar - Anne sorriu para ela.

- E tudo vai ficar bem - tornou a olhar para o teto recém-pintado, ainda de um sólido azul celeste.

- Sentirei falta de vocês - a loira disse suavemente, virando-se para a parede e caindo no sono logo em seguida.

Tania dormiu rápido. Estava exausta de trabalhar no teto e no vestido, e mesmo assim não tinha andado nem meio caminho; nunca havia se sentido tão impotente.

Anne, então, foi conversar com Marilla, que deixou para ela a decisão de treinar para virar uma esposa, ou voltar à escola, discretamente incentivando-a a escolher a segunda opção. Foi o que ela fez.

The Fairy Queen - AwaeOnde histórias criam vida. Descubra agora