Capítulo 17

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Na manhã de volta às aulas pós-incêndio, a chegada atrasada de Tania e Anne demorou a ser notada mas, quando foi, Diana e Ruby se levantaram as pressas para cumprimentá-las e, por mais chocante que aquilo fosse para a turma e até para a própria Tania, a Gilles pediu que ela se sentasse ao seu lado, o que a Stacy fez de bom grado, estranhando, mas feliz; ela tinha amigas.

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O Outono havia chegado, e com ele o cansaço eterno e infinito de Tania. Para quê havia sido criado o frio, se não para usá-lo como desculpa para ficar debaixo das cobertas o dia todo? Se Deus realmente existisse, ela teria uma conversa séria com ele quando morresse.

...

Na aula, estava acontecendo a competição de soletração; quem errasse perdia e tinha que se sentar; ainda de pé, estavam Anne, Tillie, Moody e Gilbert. Tania também estaria se não tivesse errado de propósito no começo para que pudesse voltar a dormir em sua carteira, como estava fazendo desde que chegara.

Tillie errou 'abençoado'.

Moody errou 'graça'.

Só restavam Anne e Gilbert. Aqueles dois estavam competindo pelo título de 'melhor aluno da turma' desde que se conheceram ('ah mas e a Tania?' ela não era boa aluna. Tirava boas notas por pura sorte (e memória fotográfica) mas seus conhecimentos se resumiam a: tudo menos o que estivessem estudando no momento. Ela gostava de aprender sobre astronomia, biologia, mitologia e física avançada (havia visitado Charlottetown com Cole para comprar novos suprimentos artísticos, e aproveitou para passar em uma livraria e comprar livros justamente sobre os temas mencionados); em sua opinião, soletração era um sinônimo de tédio).

- Excluído.

Gilbert soletrou corretamente.

- Esnobe.

Anne soletrou perfeitamente.

- Atroz.

Gilbert acertou outra vez.

- Penitente.

Anne acertou de novo.

- Intenções.

Gilbert continuou com sua onda de acertos.

- Perseverar.

Mais um acerto para a lista de Anne.

- Compromisso - o professor disse, olhando para Prissy. Tania sentiu náuseas; eca. Gilbert, que trocou um olhar de nojo com amiga, acabou errando, dando a Anne a mais que merecida vitória - está incorreto - olhou mais diretamente para a Andrews - a soletração, não o sentimento - sorriu para a loira; um sorriso asqueroso, vale frisar.

O Blythe deu à Cuthbert os parabéns pela vitória, mas ela mal conseguiu responder, com uma sensação estranha em seu baixo ventre que a fez sentar-se com os pés sobre a cadeira, parecendo uma bolinha.

...

Naquela mesma noite, quando todos já estavam dormindo (todos menos Tania, que lia a história de Perséfone sob a luz de uma vela), a ruiva acordou e levantou às pressas, não dando à morena tempo de perguntar o que era antes de segui-la escadas abaixo; o barulho da correria das duas acordou a irmã Cuthbert, que não demorou muito a descer também, encontrando uma Anne chorosa lavando roupas de cama sujas de sangue na pia, e uma Tania risonha tentando tranquilizá-la.

Os pais de Tania nunca foram do tipo que achavam embaraçoso conversar sobre este tipo de coisa, a menina sabia exatamente o que estava acontecendo com Anne (e que acontecia com ela mesma uma vez por mês), porque acontecia, e até de onde vinham os bebês (o que ela achava nojento, a propósito; qual era problema dos adultos?).

- Anne? - Marilla perguntou, entrando na cozinha.

- Desculpe - ruivinha disse, esfregando maniacamente a roupa de cama - desculpe por ter incomodado você, eu sinto muito por terem apostado em mim - disse chorando.

- Anne, eu já lhe disse, não precisa se preocupar - a ruiva chorava cada vez mais.

- Do que estão falando? - a mais velha se aproximou mais, tentando entender o que estava acontecendo.

- Eu nunca usei mangas bufantes - Anne fungou - se quiser me internar no hospital pelo resto dos meus dias eu vou entender perfeitamente - Marilla finalmente viu os lençóis ensanguentados.

- Você não está morrendo - falou calmamente.

- É o que estou tentando explicar! - frustrou-se Tania.

- Vocês podem plantar rosas no meu túmulo, por favor? - a Shirley nem parecia estar ouvindo.

- Anne - segurou os ombros da jovem - você não está morrendo! Você está.. desabrochando e-e virando mulher.

- Ai papai, isso vai ser constrangedor - a morena comentou, sentando-se sobre a mesa. Marilla odiava quando ela fazia aquilo? Odiava, mas estava muito ocupada para se importar.

- E é perfeitamente normal - disse, lançando à morena um olhar de advertência.

- Mas eu não estou pronta pra ser uma mulher! - Anne choramingou.

- Bom, é como Deus deseja que as coisas sejam.

- Ah - gemeu em frustração - deve ter havido um engano, porque é impossivel Deus achar que agora é hora de eu virar mulher!

- Vamos dar um jeito nisso - Marilla disse prática - vai precisar de panos de algodão para prender na sua roupa de baixo - e foi para a lavanderia, voltando rapidamente.

- Isso não pode estar acontecendo!

- Eles tem que ser lavados em água fria e depois quente.

- Vocês tem que aguentar isso também?

- Eu sim, Marilla não sei. Geralmente acaba depois de uns trinta-e-poucos anos.

- ANOS?

- Desisto.

- O ciclo dura só alguns dias por mê- a mais velha foi interrompida.

- TODO MÊS? Mas por quê? Por que isso agora? Antes tava TUDO BEM! - o Cuthbert entrou no cômodo.

- Mathew, fora! - Marilla ordenou.

- Anne? O que há de errado?

- Tudo - ela ainda chorava.

Ao ver os panos ensanguentados, ele ficou constrangido, mas pelo menos sabia o que estava acontecendo, ao contrário de muitos homens.

- Eu mandei sair! - sua irmã insistiu.

- Eu.. sim. Hm.. celeiro - pegou o chapéu e saiu, de pijama e tudo.

- Tadinho - Tania riu-se.

- Da pra você parar de rir? - ruivinha brigou - Isso é um pesadelo - estava realmente inconsolável.

- Bom, já que minha companhia não é requisitada, vou lá pra cima.

...

Horas depois, morrendo de sono, as duas foram para a escola. Anne havia recebido a opção de faltar aula, e negado; o motivo, só Deus sabia; Tania achava que era burrice.

Lá, a morena nem cumprimentou ninguém antes de se jogar em sua carteira, apoiar a testa no caderno e dormir.

Gilbert passou a manhã toda tentando acordá-la, temendo que a menina fosse levar uma bronca, mas não teve sucesso.

The Fairy Queen - AwaeOnde histórias criam vida. Descubra agora