Capítulo 31

586 68 3
                                    

- Isso.. foi esquisito - ela comentou, ficando na frente dele, que concordou.

- É, foi - ele fugia do olhar dela.

- O que foi? - perguntou preocupada, os olhos brilhando.

- ..Flashbacks são bem mais realistas do que eu esperava - foi só o que disse, antes de se sentar de novo, respirando tremulamente. Seus olhos estavam desfocados.

- Gilbert - ela se ajoelhou para ficar na mesma altura que ele - olha pra mim - pediu. Com um esforço descomunal, ele o fez. A voz dela parecia estar ecoando, mesmo que ele soubesse que não estava de verdade. A menina colocou uma mão na bochecha do amigo, e o toque pareceu lhe enviar um choque, trazê-lo de volta para a realidade. O Blythe piscou várias vezes, respirando fundo.

- Vai ser sempre assim? Isso nunca para?

- Diminui com o tempo - ela garantiu. Seus olhos pareciam ver a alma um do outro.

- Promete?

- Prometo - envolveu o rosto dele com as duas mãos, se aproximando devagar. Mais perto. Mais um pouco. Lhe deu uma lambida na ponte do nariz, e ele a empurrou de leve pra longe, rindo com irritação.

- Por que você é assim? - seu sorriso denunciava que não estava bravo de verdade.

- Porque você me ama assim - gabou-se.

- Amo mesmo - devolveu, a covinha na bochecha esquerda se fazendo presente. Ela riu, abraçando-lhe forte pelo pescoço, antes de soltá-lo, se levantar e pegar dois pratos para servir a torta de carne.

- Está com fome?

- Não muita.

- Não me importo - ele revirou os olhos, pegando o garfo que ela lhe estendeu e provando um pedaço do alimento.

- Hm, é bom - falou de boca cheia.

- É óbvio que é bom, eu que fiz - disse simplesmente. Os dois deram risada.

Comeram quietos, Gilbert pensando e Tania tentando descobrir no que ele tanto pensava.

--------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------

Alguns dias depois, Tania estava dando uma volta e tentando pegar flocos de neve com a língua, quando ouviu uma voz muito conhecida e muito irritante.

- Gilbert! Como está? - Billy Andrews perguntou; ao se aproximar, a garota viu que ele estava acompanhado de mais dois amigos, e que Blythe estava extremamente incomodado.

- Bem.

- Você precisa voltar pra escola, aquela órfã esquisitona nunca foi tão insuportável, e a irmãzinha feia dela está fora de controle.

- E daí? - apertou o saco que carregava com mais força.

- Precisamos mostrar que ela não é tão esperta.

- Ela é inteligente; aceite.

- Por que você está assim, cara?

- Por que você não lê um livro e resolve sozinho?

- Tá, falou - zombou - essa é boa, amigo - Gilbert parou e ficou de frente para o Andrews.

- Vou te dar uma dica, ok? - segurou o garoto pelo ombro - eu não sou seu amigo.

- Tá - riu.

- E se você incomodar a Tania ou a Anne de novo, vai se arrepender.

- Tá bom - olhou para os amigos com um sorriso zombeteiro.

- É, tá bom - lhe lançou um olhar ameaçador e continuou seu caminho.

- Qual o seu problema? - "Billy está chato, hein?" pensou Tania. O Blythe se virou, agora com a raiva borbulhando dentro de si.

- Me pergunta isso de novo! - o loiro hesitou - Não, sério. Pergunta!

- Por que você está assim?

- Vai, pergunta! - gritou. A Stacy deu alguns passos a frente, já preparada para apartar/se envolver em uma possível briga. Suspirando, o moreno tentou, de novo, seguir seu caminho.

- Sério, eu não tô entendendo. Qual é o seu problema? - em um movimento rápido, Gilbert jogou o saco que carregava nos braços do menino e deu um soco forte no nariz dele, que lhe agarrou pela cintura, jogando-o no chão.

Billy então envolveu a garganta do Blythe em um aperto forte, começando a desferir socos no rosto do moreno, e Tania logo correu até eles, puxando o Andrews de cima do amigo, e recebendo uma cotovelada na costela.

Então, com a raiva dobrada, Gilbert partiu para cima do loiro.

Andrews nem tentava mais devolver os socos, seu objetivo era claramente sair correndo para o mais longe possível.

Querendo apenas ir para casa colocar gelo no hematoma que provavelmente havia adquirido, Tania, muito cautelosamente, cutucou o ombro de Gilbert, que imediatamente de desvencilhou do loiro, colocando-se na frente da garota mesmo que não houvesse nenhuma necessidade, já que Billy e os amigos se apressavam de volta pelo caminho de onde haviam chegado.

Então, sem dizer uma palavra, o moreno agarrou o saco que estava carregando antes da briga e o apoiou no ombro com uma mão, enquanto passava a outra pela cintura da amiga, puxando-a com suavidade até a casa dele.

Os dois se mantiveram quietos por todo o caminho até a fazenda do Blythe.

Tania seguiu direto para a casa quentinha, enquanto Gilbert foi até o celeiro deixar ali o saco e, no caminho até a casa, encontrou Marilla no pequeno cemitério, vestida de preto da cabeça aos pés, chorando.

- Gilbert - ela cumprimentou - desculpe incomodar - falou, inexpressiva.

- Imagina, senhorita Cuthbert; por favor, fique a vontade - gesticulou vagamente para o túmulo do pai.

- Como será que ele se sente aí parado? - o moreno, que estava prestes a seguir seu caminho, virou-se de volta para ela - John adorava viajar.

- Acho que o exército o fez viajar bastante quando era jovem - se aproximou um pouco da mulher.

- Ele teve a vida que queria, cheia de aventuras. Ouvi dizer que se estabeleceu em Alberta - virou-se para o jovem.

- Fomos uma família grande por um tempo - confirmou - agora eu sou o último. O único.

- Sinto muito.

- Nah, tudo bem - respirou fundo - nós voltamos pra cá logo depois que eu nasci - riu de leve, fazendo a Cuthbert estranhar - os filhos pródigos, era assim que ele nos chamava. Fomos lá recentemente, a Alberta; ele queria vê-la de novo. É bonita - sorriu triste.

- Na escola, quando nós éramos colegas, John vivia falando de cidades grandes em outras partes do mundo, parecia.. impossível.

- Soa bem pra mim - comentou, agora com um sorriso verdadeiro.

- Você se parece muito com ele - devolveu o sorriso - John não conseguiu me convencer a ir embora - mudou de assunto - eu queria-

- Meu pai queria que fosse com ele?

- Sempre serei grata a ele por pensar que eu teria coragem. As obrigações podem ser uma prisão. - pausa - Eu sempre imaginei... Já vou indo. Por favor, nos procure se precisar de alguma coisa.

- Obrigado, senhorita Cuthbert - Marilla virou-se, e já ia indo embora quando Gilbert lembrou-se - ah, antes que se preocupe, Tania está na minha casa - apontou para a construção, e a mulher apenas assentiu, seguindo seu caminho.

Falando em Tania, durante esta conversa, ela estava preparando uma bebida.

Gilbert entrou em casa, sentindo o cheiro reconfortante de chocolate quente. O chocolate quente dela.

The Fairy Queen - AwaeOnde histórias criam vida. Descubra agora