Capítulo 75

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- O almoço está pronto! - gritou Bash da cozinha.

- Ótimo! Mal posso esperar para experimentar farofa - se levantou e puxou Blythe para a cozinha. Antes que ela pudesse se sentar, Gilbert a puxou para si, abraçando-a por trás e beijando seu pescoço - aaah! Faz cócegas, para! - suas mãos apertando os antebraços dele fortemente em sua cintura a contradiziam - Bert! - falou entre risadas o nome do garoto, que no momento mordia a pele do seu ombro, onde o vestido escorregara. Ele deixou um beijo sobre a marca suave da mordida e soltou-a para que ela se sentasse, fazendo o mesmo.

Sebastian colocou os três pratos na mesa. Cada um continha um pedaço bem temperado de costela de vaca, meia batata cozida recheada e três colheradas de um pó amarelo com pedaços de cebola e bacon.

- Tem mais na panela se quiserem.

- O cheiro está divino - comentou Bert, colocando um pouco da batata na boca - hmmm - engoliu antes de dizer: - a melhor batata que já comi.

Mas Tania não estava interessada na batata. Ao invés disso, partiu direto para a farofa. Espetou um cubo de bacon e uma fatia de cebola com a ponta do garfo, encheu o resto dele da tal farinha de mandioca e colocou tudo na boca.

Ela mastigou um pouco. Era salgado. E crocante.

- Uma delícia, mas tenho a impressão de que falta alguma coisa - admitiu.

- Experimente com a carne - Sebastian sugeriu, colocando na boca um pedaço de carne coberto de farofa.

Tania cortou um pedaço da costela, que quase se desmanchou de tão macia, colocou a carne e a farofa no garfo e comeu. Arregalou os olhos.

- Uau - falou de boca cheia. Percebeu as más maneiras e engoliu antes de continuar - está muito bom - Gilbert também experimentou. Realmente estava delicioso.

...

O almoço foi divertido. Bash contou histórias de suas viagens, Nia fez piadas, e Bert riu como se estas fossem bem mais engraçadas do que realmente eram.

Mas tinha um elefante na sala.

O nariz da Stacy ainda estava vermelho. Porque ela havia chorado, muito, até perder o ar, de uma maneira que não fazia na frente de ninguém. Não era aquela a primeira impressão que Sebastian deveria ter dela. A impressão que Gilbert deveria ter.

Tania não precisava de ajuda. Ela ajudava. Ela era a pessoa para quem seus amigos corriam quando precisavam de algo. Passara por coisas demais para se deixar abalar pelo cansaço, por pesadelos, por pensamentos ruins. Coisas quebradas não deveriam ser frágeis; não mais.

E ela não era; quero dizer, conseguira passar o ano todo sem preocupar ninguém, sem se preocupar.

Por que ela conseguia esconder seus sentimentos de si mesma, mas não dele?

Apenas um olhar de Gilbert Blythe destruía toda a sua armadura. E ela não podia se dar ao luxo de andar por aí desprotegida.

Mas não sabia como se proteger, então apenas fungou e continuou comendo.

Quando todos estavam cheios, Nia recolheu os pratos, os levou até a pia e já ia começar a lavá-los quando Bash a impediu.

- Eu cuido disso - tirou delicadamente a esponja e o detergente das mãos dela e começou a esfregar os pratos. Tania continuou parada, olhando, até Bert segurar sua mão, tirando-a do transe.

- Vamos subir? - perguntou baixinho, em tom cuidadoso. Então era assim a tratariam dali pra frente? Como se fosse uma criança indefesa?

Ela o acompanhou escadas acima, com um vinco profundo entre as sobrancelhas.

No caminho até o quarto dele, a garota se desviou e puxou-o até o piano, que ainda estava coberto por um lençol. Soltou a mão do namorado e retirou o pano com um movimento largo e teatral, espalhando poeira pelo ambiente. A Stacy segurou uma tosse enquanto dobrava o tecido, sendo firmemente observada por Gilbert.

- Eu não sou de vidro, sabe? - disse depois de um silêncio que pareceu longo demais.

- Nunca pensei que fosse.

- Então não é porque eu comecei a chorar de repente uma vez que vai acontecer de novo.

- Não foi de repente.

- Você me conhece, Gilbert - ignorou-o - sabe que não sou assim.

- Você é; só costumava ser melhor em esconder.

- Como pode saber que sou a mesma?

- Te amo do mesmo jeito - respondeu simplesmente.

- Com muito esforço? - ironizou.

- Como se fosse respirar - se aproximou até estar cara a cara com ela, que cruzou os braços e deu um passo para trás. Bert suspirou - não é errado aceitar apoio, sabe?

- Não preciso de apoio. Fiquei muito bem sem apoio o ano inteiro, e não é agora que isso vai mudar. Eu não preciso de você, Gilbert Blythe, e não preciso dos seus cuidados. Você mesmo me mostrou isso - por que ela estava dizendo aquilo? Por que estava sendo cruel?

Ele franziu a testa. Tania não estava com raiva dele, tinha certeza disso. Magoada, talvez, mas não irritada. Aquela raiva não era direcionada a ele, e Gilbert decidiu continuar a conversa quando ela percebesse.

Sem uma palavra, ele se sentou no banquinho empoeirado e dedilhou o piano. Bert não chegou a tocar nada, apenas brincou com os sons por alguns minutos, até que Nia descruzasse os braços e murchasse um pouco. Não podia perdê-lo de novo, não podia afastá-lo; ela não aguentaria.

A Stacy caminhou até ele e tocou suavemente seus braços, fazendo-o se virar. Com os olhos dele colados nos seus, Tania se ajoelhou e colocou as mãos nos joelhos do namorado.

- Me perdoa? - perguntou baixinho.

- Só se você me perdoar - rebateu, acariciando o cabelo dela.

- Pelo quê?

- Por ter ido embora - a menina negou com a cabeça.

- A sua ida não teve nada haver comigo; viajar foi a maneira que você encontrou de lidar com o luto, e eu não tenho o direito de fazê-lo se sentir culpado por isso. Me perdoa? - repetiu.

- É claro que sim - sorriu de leve, antes de descer do banquinho e se ajoelhar para abraçá-la. Se fez um longo período de silêncio, durante o qual Bert fez um carinho suave nas costas de Nia, por baixo da blusa, traçando as cicatrizes com os dedos, porque ele amava aquela parte dela também.

- Eu preciso de você sim, Gilbert - acabou dizendo, porque ele não mentia para ela, e Tania queria ser boa - preciso muito. Desde o dia em que te conheci - o garoto tentou afastá-la para olhar nos seus olhos, mas ela se agarrou a ele com mais força - você destruiu a armadura; eu nunca precisei dela de novo, porque você estava me protegendo. Mas então você foi embora, e eu não consegui reconstruí-la, Bert - está tudo bem. Você pode dizer isso. Pode dizer qualquer coisa. Ele está aqui. Não precisa mais da armadura - e os golpes foram fortes e doeu. Doeu demais - falou por fim.

N.A.: parece que fica mais triste a cada capítulo pqpppp, eu deveria estar deprimida quando escrevi isso (duas semanas atrás)

The Fairy Queen - AwaeOnde histórias criam vida. Descubra agora