Capítulo 81

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Anne entrou na sala, a saia arrastando de levinho no chão, o cabelo curto decorado por uma coroa de flores, parecendo uma dríade dos contos de fadas.

Gilbert abriu a boca para cumprimentá-la, mas Nan seguiu uma linha reta até Bash.

- Você é o Sebastian, que emoção! Li sobre os antigos reinados da África e sobre os mouros na Espanha, mas eu nunca havia conhecido uma pessoa de cor antes - Tania enfiou o rosto no pescoço de Bert com um gemido; tanto ela quanto Marilla haviam pedido que a Shirley não fizesse um escarcéu - ninguém com as suas feições; sua pele é absolutamente extraordinária. É um enorme prazer conhecê-lo - disse com admiração, estendendo a mão. Durante um segundo tenso, o homem franziu a testa, mas logo abriu um sorriso e apertou a mão dela.

- É um prazer conhecer você também, Anne Cuthbert - Nan riu de alegria.

- Quem gostaria de jantar? - Marilla chamou.

- O cheiro está divino - Bash elogiou.

- Já experimentou bruschetta? - a ruiva perguntou com animação.

- Não, mas o cheiro me diz que eu vou gostar - seguiu até a cozinha acompanhado de Mathew e Marilla, que disse:

- Meninas, apaguem as velas da árvore.

Gilbert ficou para trás com elas para lhes dar seus presentes.

- Anne - chamou, tirando um pequeno embrulho do bolso do casaco. Ela se virou para o moreno - feliz Natal - lhe entregou o objeto.

- E-eu não tenho nada para você.

- Não faz mal - deu de ombros.

Com um sorriso constrangido, Nan colocou o presente no bolso do vestido (todos os vestidos que Tania fazia tinham bolsos) e foi até a cozinha, deixando ele e Nia sozinhos.

Como Bert decidiu ajudar a namorada, eles acabaram soprando a última vela juntos, seus lábios muito próximos.

- E se nós deixarmos o Natal pra lá e formos para o lago patinar? - sussurrou, olhando para a boca dele.

- Garanto que me sinto bastante tentado - abriu um sorrisinho - mas Marilla te mataria por perder o jantar de Natal.

- Ela me mataria por diversão - rebateu, alternando o olhar entre os olhos e lábios dele, ainda muito perto do moreno, que riu.

Devagar, ele puxou-a pela cintura, apoiando uma mão na sua lombar e a outra nas costas desnudas (que se arrepiaram), e a beijou.

- Você tem gosto de morango - sussurrou.

- Usei calda de morango para deixar os lábios vermelhos - respondeu, logo tornando a encaixar sua boca na dele. Céus, como ela amava beijá-lo.

- Fadinha - se afastou um pouquinho.

- Hm? - ainda estava inebriada.

- Tenho algo para você - tirou do bolso uma concha azul-claro fechada.

_____

Uma vez, quando tinham 11 anos, Tania e Gilbert mataram aula para ir até a praia.

Era um dia frio de Outono, então não entrariam na água; ao invés disso, estavam caminhando na beirada, os sapatos pendurados nos dedos, procurando conchas peculiares e fósseis de bolacha-do-mar trazidos da América do Sul pela correnteza.

Eles conversavam sobre coisas que não entendiam.

- Tania Stacy - naquela época ele sempre a tratava pelo nome e sobrenome, porque achava que os dois nomes soavam bem demais para não serem ditos juntos - como alguém sabe que ama outra pessoa?

- Oras, como espera que eu responda? Nunca amei ninguém além de mamãe, papai e Jonah.

- Você geralmente sabe a resposta de tudo - murmurou.

- Você é novo demais para pensar em amor, Gilbert Blythe - naquela época ela sempre o tratava pelo nome e sobrenome, porque seria estranho se apenas ele o fizesse - quem poderia amar, afinal?

- Amo muito meu pai - deu de ombros.

- Mas você precisa amar o seu pai, é a regra.

- Então como sei se amo alguém que não preciso amar?

- Já lhe disse que não sei. Agora olhe por onde anda, está pisando nas pobres conchas - caminhou em silêncio por alguns segundos, pesando a pergunta - acha que ama alguém, Gilbert Blythe?

- Não. Mas se algum dia amar, quero saber que amo - Tania pensou com mais força.

- Acho que você ama alguém quando a pessoa te faz rir de coisas que deveriam te irritar. E você se sente invencível quando estão juntos - o garotinho observou ela, que estava concentrada no chão, e pensou que se Tania Stacy trocasse de lugar com a sombra dele, Gilbert não reclamaria - Gilbert Blythe, olhe! - se ajoelhou na areia molhada para pegar uma concha azul brilhante - Já viu uma concha desta cor? Ela deve ter vindo do céu, e não da água - disse com confiança enquanto ele se ajoelhava ao seu lado - ah, Gilbert Blythe, não é mágico que tenhamos encontrado uma concha de um lugar tão maravilhoso quanto o céu? Estou certa de que a chuva a trouxe para cá apenas para que a encontrássemos - o pequenino Blythe abriu um largo sorriso e segurou a mão dela, que segurava a concha.

- Tania Stacy, você sabia que é minha pessoa favorita no mundo inteirinho? - Tania parou de olhar para a concha para travar seus olhos nos dele.

- No mundo inteirinho, Gilbert Blythe? - seus olhos estavam brilhando ainda mais do que o normal.

- Nesse e em todos os outros, Tania Stacy - jurou. Assustada com a grandiosidade daquilo, ela virou a mão, deixando a concha cair na palma dele, e saiu correndo até Greengables.

_____

- É a concha daquele dia na praia? - sussurrou com a voz trêmula.

- Sim. A deixei bem guardada, senti que precisaria dela algum dia - se segurando para não chorar, Tania pegou a concha das mãos dele - por que não abre? - ela ergueu os olhos para Gilbert e os abaixou de novo.

Com cuidado, abriu a concha, encontrando dois anéis prateados. Ao olhar mais de perto, mesmo com os olhos embaçados de lágrimas, viu que haviam pequenos planetas gravados na prata.

- Nesse mundo e em todos os outros - disse baixinho, a voz embargada - ah, Gilbert, são perfeitos - o abraçou apertado, como se nunca mais fosse soltar - você também é minha pessoa favorita no mundo inteirinho - falou ao se afastar um pouco e encostar suas testas - nunca cheguei a lhe dizer.

- Eu te amo tanto, Tania Stacy - disse, afastando-a mais um pouco para limpar a lágrima que escorria por sua bochecha - gostou do presente?

- Se eu gostei? - riu - Seu grande idiota, Gilbert Blythe. É a melhor coisa que já ganhei na vida - colocou a mão livre atrás do pescoço dele e o puxou para um beijo lento, que fez todo o seu corpo se arrepiar.

Apoiando os calcanhares no chão devagar, porque estivera na ponta dos pés, ela abriu a mão que segurava a concha e ele pegou o menor anel.

- Posso colocar em você? - Nia assentiu. Seu nariz estava vermelho.

Bert pegou sua mão direita com delicadeza e encaixou ali o pequeno aro de prata.

- Minha vez - ela disse, ainda chorando, encaixou o anel no dedo dele, e o beijou outra vez.

The Fairy Queen - AwaeOnde histórias criam vida. Descubra agora