A reportagem

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No domingo, dia 04 de novembro de 2001, enquanto a guerra se intensificava, havia a necessidade de buscar apoio da população por parte da aliança formada pelos Estados Unidos, países ligados a Otan e os rebeldes. Uma das estratégias que eram adotadas era a comunicação de ações negativas tomadas por membros do regime vigente contra a sua própria população em veículos de comunicação, tentando fragilizar a imagem daquele grupo perante a sociedade.

Nesse dia foi vinculado por todo aquele país e espalhado para várias partes do mundo um artigo de uma repórter relatando a situação das mulheres do Afeganistão que viviam subjugadas pelos seus esposos e sem proteção nenhuma daquele estado governando por um regime religioso extremamente conservador.

Em meio a reportagem, foi citado um exemplo de uma cidade visitada ao norte do país em que uma jovem estava em um templo e não conseguia nem se sentar, por ter sido castigada pelo marido diariamente no decorrer de uma semana completa. Aquela ativista, infelizmente não tomou cuidado de não falar a cidade em que estava aquela jovem e também as suas características como idade e data da conversa, o que fez com que aquelas pessoas que estavam presentes no templo, logo ligassem aquela fala a de Aisha naquela ocasião.

A ativista dos direitos humanos estava a ser entrevistada, quando ela diz que ficou por horas a observar aquela jovem, quando a questionou: "o que estava a acontecer com ela que não se sentava para descansar um pouco em meio as suas orações?"E a resposta foi que ela havia sido vítima de agressões diárias e por esse motivo ficar em pé ou ajoelhada era melhor porque a evitava de sentir dores nos pontos atingidos pelas agressões do marido.

Claramente o objetivo daquela entrevista era enfraquecer aquele regime muito conservador e extremamente violador dos direitos das mulheres. Entretanto, ela ficou tão empolgada com aquela oportunidade que acabou dando mais detalhes do ocorrido na ocasião do que deveria, dando pistas de quem era a jovem a qual ela havia dialogado naquele dia. Por esse motivo, quando aquela reportagem chegou as mãos daquela população, na segunda-feira, eles logo ligaram aquela situação a uma conversa que Aisha teve com uma mulher estranha nas semanas anteriores.

Na continuação da reportagem, a ativista que encontrou com Aisha no templo, afirmou que ficou chocada quando ouviu aquela fala de uma jovem de aproximadamente 16 anos, que, provavelmente, foi casada forçadamente antes de conhecer melhor o seu esposo, como era muito comum naquela sociedade. A reportagem publicada era muito densa e tinha vários exemplos de situações de abuso que aconteciam naquela sociedade por parte dos homens, criticando pesadamente aquele regime vigente, o que atrapalhava a imagem daquele grupo tanto no país, quando perante a comunidade internacional.

O comentário da participação de Aisha naquela reportagem passou rapidamente de pessoa para pessoa naquela comunidade e pela transmissão boca a boca, rapidamente todos sabiam que era aquela jovem esposa de Osnin que estava a "denunciar aquelas agressões". Muito conservadores, os homens ficaram revoltados com a atitude daquela jovem mulher e queriam que providências fossem tomadas contra ela, por ter afrontado a órdem patriarcal existente naquela comunidade ao espalhar situações particulares para outras pessoas dentro de um templo religioso.

Boa parte das mulheres, também muito conservadores, ao saber o que havia acontecido, foram também questionar a ação de Aisha, a criticando intensamente por ter acusado os eu marido daquela forma. A cultura naquele local era tão enraizada e o machismo era tão intenso naquele sociedade, que as mulheres não conseguiam perceber que aquela ação de Aisha deveria ser apoiada por todas, mesmo que ela não tinha intenção de denunciar o seu marido ou aquelas agressões. Aquilo ocorreu de forma totalmente involuntária. Ela nem sabia que aquela mulher era uma ativista ou defensora dos direitos das mulheres no país. Se soubesse, certamente, não havia dito aquilo. Mas, se disse e aquilo se espalhou, pelo menos as mulheres que eram também, em sua maioria, vitimas de agressões similares, deveriam apoiá-la. Entretanto, a reação da maioria delas, devido ao conservadorismo, foi exatamente ao contrário e, muitas delas, se mostravam ainda mais revoltadas com Aisha do que os seus próprios esposos.

A maioria das mulheres, muito acostumadas a aquele modelo patriarcal e machista, que defendiam os preceitos de que os problemas domésticos deveriam ser resolvidos internamente, com os maridos, que eram os chefes de família, criticaram intensamente a ação de Aisha e principalmente daquela ativista em espalhar aquela informação de cunho pessoal, que dizia respeito a moral e os bons costumes daquela comunidade. Para elas, se Aisha estava a ser castigada pelo marido era porque havia feito algo para merecer e não deveria questionar as decisões do seu esposo. Aquela era a visão cultural que prevalecia naquele ambiente pela maioria dos homens e, impressionantemente, também, pela maioria das mulheres.

Casamento forçado e abusivoOnde histórias criam vida. Descubra agora