O dia seguinte

2.5K 205 9
                                    

Aisha não conseguiu dormir naquela noite, tudo que pensava era nas fortes palavras ditas pelo seu pai e no pesadelo que poderia se tornar a sua vida após um casamento naqueles moldes. Ela não iria aguentar um homem que a controlasse todos os dias de sua vida de forma tão intensa e, possivelmente, severa, pelos seus erros do passado. A curiosidade ficou em sua cabeça: quem seria esse homem que o seu pai tem em mente para o seu casamento? Como ela não conhecia esse vilarejo vizinho e as pessoas que moravam lá, era praticamente impossível que ela o conhecesse.

Daquele lugar ela só sabia as histórias. Como os homens eram de um conjunto religioso mais extremista do que o do seu vilarejo, as mulheres tinham ainda menos participação social. Não podiam estudar e nem realizar nenhum trabalho profissional, diferentemente da região em que morava, o qual essas ações eram permitidas, de forma muito controlada pelos chefes de família.

Naquele vilarejo vizinho, local de moradia do seu futuro esposo, haviam também muitas histórias de punições dos maridos que chegavam frequentemente as terras de Aisha, e essas eram as mais severas possíveis. Só de pensar nas histórias que já havia escutado das relações familiares naquele lugar, Aiha já tremia de medo. Depois de muito tempo a tentar dormir e não conseguir, aquela menina começou a rezar intensamente pelo seu futuro.

Quando amanheceu, o seu pai vestiu a melhor roupa que tinha e disse a Aisha quer iria atras de seu esposo. Nesse momento, aquela jovem se assustou intensamente. Ele saiu em disparada sem os seus produtos para a venda, pois, certamente, nesse dia, nem iria trabalhar.

Durante todo o dia Aisha ficou extremamente ansiosa, torcendo para que, a pessoa em que seu pai havia lhe dito que realizaria a proposta não aceitasse casar com uma mulher do seu perfil, afinal de contas, a religiosidade naquela época e região contava muito e, de forma sutil, as suas religiões eram diferentes, pelo menos, por alguns dos seus rituais e parte dos princípios.

Em meio as tarefas do dia, Aisha rezava o tempo todo para o magnifico iluminasse os seus passos e não a fizesse sofrer tanto. Pedia perdão a ele e dizia que aquelas punições de seu pai estavam a doer intensamente até aquele dia, portanto, parte dos seus pecados poderiam ser descontados pelo sofrimento que ela havia passado nos dias anteriores.

Naquela região as meninas aprendiam a ser mulheres muito cedo. Com pouco mais de seis anos aquela jovem jé era a responsável por todos os cuidados daquela casa, inclusive, por cozinhar para o seu pai. Mesmo tendo toda essa responsabilidade, inclusive de se preparar para o casamento, Aisha ainda era uma menina de apenas 14 anos, que já passava por todas essas pressões.

Tudo que passava na cabeça de Aisha era que o seu pai parecia não ter nenhum amor por ela, a fazendo sofrer de forma tão intensa. Não era possível que ele não sentia o mínimo de compaixão depois de tanta dor e pavor que ele havia feito ela passar nos dias anteriores em meio a aquelas intensas e desproporcionais punições. Depois de tudo aquilo, arrumar um casamento que poderia a condenar a sofrer pelo resto de sua vida era desumano demais nos pensamentos daquela jovem garota.

No fim da tarde o seu pai chega com um olhar mais animado e feliz. E então ele se senta no sofá e conta as novidades para Aisha:

- Deu tudo certo em minha viagem Aisha. O acordo foi acertado e o seu noivo aceitou colocar você nos eixos após esse casamento. Diz Mohamed de forma direta.

Aisha naquele momento sente um pavor imenso. O que seria colocar nos eixos? Questionava ela em meio aos seus pensamentos, já sabendo a resposta, mas não querendo imaginar o que isso significaria para o seu futuro de forma prática.

- Você se casa em quinze dias! Diz Mohamed.

Aisha se assusta de forma tão intensa com o curto tempo para o seu casamento, que instintivamente diz de forma direta, quase gritando:

- Quinze dias?

- Sim. Eu queria até que fosse antes, já na semana que vem, mas aquele senhor achou que seria melhor daqui 15 dias para poder organizar um belo casamento.

Aisha fica desolada com aquela fala, quando Mohamed continua:

- Eu chamei duas senhoras para ficar com você nos próximos dias, lhe ensinando os bons modos de uma moça casada. Aquela família é rica e você precisa aprender a se portar como eles, antes do casamento, para evitar situações constrangedoras. Não vai querer que o seu marido fique zangado com você após o casamento...? Diz Mohamed de forma pensativa.

Aisha não tinha mais reação. Era uma mistura de tristeza, angustia e desespero. Não sabia para onde olhar, o que dizer, o que imaginar. Parecia muito com uma cena de terror tudo aquilo, por não haver saídas ou para onde correr.

- Bem, estamos conversados. Se prepare, daqui 15 dias, será uma mulher casada. Diz Mohamed enquanto se retira daquele sofá indo em direção a cozinha e Aisha fica imóvel, pensativa e desolada.

Casamento forçado e abusivoOnde histórias criam vida. Descubra agora