Capítulo 1

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Camila ❁

— Tu acha que tua mãe vai deixar? — Talita perguntou abrindo o copo de guaravita.

— Não sei — me sento no banco do ponto do ônibus — Sabe como minha mãe é com essas coisas.. Acha que se eu for pro baile uma vez vou começar a usar drogas, larga os estudos e vou acabar vendendo as coisas de casa — sorri — Também tenho que ver se ela não trabalha no sábado, tenho que ficar com o Davi. 

— Tá bom — Talita disse ao fazer sinal para o ônibus — Me avisa, que aí já planejo um esquema. 

— Tá. passa lá em casa mais tarde.  — disse ao subir no ônibus.

Eu e Talita somos como unha e carne. Moramos na mesma vila, desde pequena somos esse grude. Sempre foi assim. 

Estudamos em uma escola fora do morro, por mais que eu seja nascida e criada no morro, minha mãe fazia o máximo pra me manter longe de tudo aquilo que o Lins era.

Complexo do Lins de Vasconcelos. Famoso por ter os melhores dj's, está em muitas músicas e famoso por ter os melhores bailes: Árvore seca, colômbia, pistinha e pistão. 

Mas apesar disso é onde tem as maiores operações de bandidos e polícia. É onde rola uma das maiores bocas de fumo da região e onde é concentrado o número de maior bandidagem, então já viu né? O crime aqui é solto.

Polícia sobe e mata inocente.
Bandidos matam polícia.
Polícia mata bandido. É assim vai seguindo.

Aqui você nunca pode dizer "A favela está em paz"  porque na verdade ela nunca está, inteiramente em paz.

Minha mãe zela muito pelo meu bem estar e o bem estar do meu irmão, Davi.

Meu pai foi um grande filha da puta com a minha mãe, abandonou ela assim que ela engravidou do Davi, sumiu, literalmente.

Depois disso minha mãe dá as tripas coração por mim e por meu irmão, então a minha vida é feita para agrada-la. Não sou capaz de desrespeita-la ao ver todo esforço que ela faz por nós. Seria uma decepção pra mim um dia não ser o motivo do orgulho da minha mãe.

— É ossada andar a pé até a barreira — Talita reclamou — Queria muito um moto-táxi! — fez bico.

— Tem dinheiro pra isso? — parei para descansar — O último que eu tinha comprei um Guaravita.

— Não!! — fez manha — Como você é nascida e criada nesse morro e não tenho conhecidos no moto táxi?

— Porque eu não me misturo! — disse óbvia — Já viu eu dando confiança pra algum desses meninos?

— Eles poderiam ser gentis. — retrucou.

— Quer gentileza, senta pra eles. — disse direta.

— Credo, Camila. — Talita sorriu.

— Você também sempre morou aqui, por que não fala com eles? — perguntei

— Não quero manchar minha imagem. — sorri e dei dedo a mesma, que caminhava ao meu lado.

Eu já namorei. Não sou tão inocente quanto dizem.

O nome dele era Wesley, era um garoto legal, namoramos por um ano e seis meses. Foi minha primeira experiência em tudo. Mas ele teve que se mudar, seu pai foi transferido no emprego para São Paulo, e então, ele se foi.

Passou..

Hoje em dia eu não deixo de viver, mas tenho meus limites. Penso em meus estudos e nada além disso.

(...)

— Cadê mamãe? — pergunto a Davi ao chegar em casa e me jogar no sofá.

— Desceu pra ir trabalhar — respondeu sem tirar os olhos da tv.

— Já almoçou? — ele assentiu — Não vai pra escola?

— Não tem água — fez careta — De novo.

— Não é você que gosta de ficar em casa? — perguntei debochando.

— Hoje era a final do campeonato de futebol né, Mila. — ele cossou a cabeça — E minha mãe nem tá querendo deixar eu jogar aqui no morro.

— Para de querer comer bola, Grilo. — ele me deu dedo e sorri — Vou tirar uma soneca, qualquer coisa me chama.

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