Capítulo 11

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Camila

Fazia um mês que eu estava olhando a Isa, e te falar, que criançinha abençoada! 

Ela não dava trabalho, ria até pro vento. Colocava um desenho, dava uns biscoitos a ela, pronto. Nem parecia que ela estava ali.

O Léo se tornou amigo agora até da minha mãe, ela sabe o que ele é, o aconselha, diz pra ele pelo menos tentar... Bom, tá fazendo efeito porque ele começou a fazer supletivo aqui na escola do morro. Agora com quem ela não vai só de olhar é o Igor. Diz ela que vê escuridão nele, e que o olhar dele a causa arrepios, não discordei porque sinto o mesmo.

A Brenda até que é legal, eu sei que ela não trabalha e não tem necessidade dela deixar a filha dela com alguém, mas o dinheiro não é meu e ela faz o que quiser com ele, né?

(...)

Estou chegando perto do morro e não vejo ninguém no moto-taxi, e estranho, ali basicamente fica cheio e só não fica quando acontece algo.

— Ué, será que houve algo? — pensei comigo

Continuei caminhando e estranhei ao não ver o Léo, era de costume ele ficar essa hora no moto-taxi e me dar uma carona pra casa.

Quando subi o primeiro morro, encontrei uma viatura 4x4 parada, fechando a rua que dava acesso a boca, então eu sabia que hoje o bicho ia pegar.

Eu olhava aquelas armas, todos aqueles equipamentos, e só pensava na quantidade de inocentes que já foram mortos por esses polícias, que também são bandidos disfarçados de heróis.

Eu sabia que o bicho hoje ia pegar, pra rua estar vazia, eu sabia muito bem que eles só estavam se preparando.

Me benzi e apertei o meu passo, subia aquela ladeira tão rápido que sentia meu peito pulsar, parecia que meu coração sairia a qualquer momento pela boca.

Ouvi um ronco de moto e logo olhei pra trás, era Igor. De primeira ele passou direto, como um flash, logo depois ele voltou e desacelerou a moto quando chegou em minha direção

— Sobe aí. — ele disse sério

— Deveria? — olhei com deboche

— Não tá na hora de você começar com teu deboche, Camila. — continuei caminhando — Então tá bom, daqui a pouco o tiroteio começa, fica aí pra ser mais uma na estática de mortos por bala perdida — arrancou com a moto

— Não! — gritei e ele parou sorrindo

— Quem tem cu tem medo, né — me ajudou a subir

— Não faz eu me arrepender não, Igor.

— Se quiser ficar aí, é a tua mãe quem vai chorar depois. — o encarei e ele arrancou com a moto.

No caminho fomos em silêncio, quando chegamos a uma certa parte do morro, pude ver a quantidade de bandidos e as arma que eles portavam, era tudo muito grande, tudo de muito número que eu me confundia só de pensar.

— Ou, essa não é a direção da minha casa.

— Eu sei — ele disse — Estamos indo pra minha casa.

— O que? Igor, o que eu vou fazer lá?

— Ué lá você faz o que você quiser, eu é que não vou ficar no meio do tiroteio.

— Mas então porque você não me leva pra minha casa?

— Sou seu motorista particular agora? — me encarou pelo retrovisor da moto — Pra você que não sabe, a concentração dos policiais é lá. Da tua casa dá pra vê tudo, se eu te deixo lá, não desço mais.

E assim seguimos pra casa dele, em silêncio.

A casa dele era simples como a de todo mundo no morro. Eu, na minha fértil imaginação achei que era luxuosa, com carrões e uma mansão. Ilusão minha, até porque os únicos bandidos luxuosos são aqueles que roubam de terno e gravata lá em Brasília.

— Limpa o pé, minha mãe odeia marca de pé na casa.

— Ela tá em casa? — perguntei assustada

— Se tivesse, teria problema? — ele sorriu — Entra logo.

Entrei e só pude constatar que der bandido não era nada daquilo que eu imaginava. A casa era simples. Tinha uma boa televisão, umas boas mobílias mas nada que uma pessoa simples não possa comprar.

— Porque você não tá lá fora com os outros, você também não é bandido?

— Porque eu não estou.

— Ué, tá fugindo da luta?

— Há certas coisas que você não tem que saber, Camila. — ele bebeu um copo d'água.

— O que vai acontecer hoje?

— Porra, você é pior que criança em! Não cala a boca não?

— Ahhhhh, eu só quero saber!

— Ahhhhh, e eu não quero explicar! — disse me imitando — Cala a boca um pouquinho.

Revirei os olhos e me ajeitei no sofá, logo escutamos o primeiro tiro e assim em diante.

— Esse daí teria pego em você. — ele disse caminhando até o sofá e ligando a televisão, logo o meu telefone começou a tocar.

— Aí meu Deus, é a minha mãe.. O que eu vou falar pra ela?

— Fala que tá na casa de uma amiga, ué — o encarei — O que é, nunca mentiu pra sua mãe? — levantei uma sombrancelha — Nunca? Vem cá garota, tu é da igreja?

— Cala a boca, Igor.

Respirei fundo e atendi o telefone.

— Oi mãe.

— Meu Deus, Camila. Onde você está? Tá dando muito tiro!

— Eu sei mãe, calma. Eu tô na casa de uma colega aqui no morro, assim que acabar os tiros eu vou pra casa, fica tranquila.

— Que Deus lhe guarde, minha filha, toma cuidado!

— Pode deixar mãe, você também.

E ela desligou.

— Pra quem nunca mentiu...

— Cala a boca, Igor — ele sorriu e ele se ajeitou no sofá vindo mais pra perto, e como reação eu me afastei.

— Fica tranquila, garota. Você não vale todo esse esforço não.

— Ah, engraçado que no dia do baile você não achou isso!

— No dia do baile eu estava bêbado, mas não sou de pegar qualquer uma — o encarei e ele sorriu — Quer vê eu te beijar agora?

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