Capítulo 2

4.8K 490 39
                                    

Igor ✕

Pra mim a vida não é fácil. Na verdade ela nunca foi.

Sempre passei por necessidade, por coisa que não desejo pra ninguém.

Minha mãe diz que tenho espírito de porco, espírito ruim. Talvez eu tenha mesmo, ou aprendi ao presenciar tantas surras que ela ganhava do meu pai. Pai não, do homem que gozou dentro da minha mãe e depois a maltratou.

Minha mãe sempre fez tudo por ele, enquanto ele comia várias na rua, chegava em casa bêbado e metia a porrada nela. Ela merecia? Não. Nunca mereceu. E eu presenciava tudo isso quieto, pra não apanhar também. Por noites minha mãe dobrava o joelho e orava por ele enquanto ele estava na rua, fazendo o que bem entendia.

Minha mãe perdeu anos da sua vida por um cara que apenas a maltratava. E eu cresci com isso, e se tornou meu pesadelo.

Quando meu pai foi embora, eu não tive maior felicidade, apesar de ver minha mãe se afundando nas bebidas. Uma fase que passou rápido porque eu me envolvi nessa vida. Foi o melhor jeito que vi de ajudar a minha mãe, a melhor saída que encontrei para esquecer o inferno que vivia em minha cabeça, mas tornei a minha vida um inferno.

Meu sonho é encontrar aquele desgraçado e fazer ele sofrer tudo, tudo que causou a mim e minha mãe. Aí sim, terei minha felicidade completa.

— Tá pensando na morte da cabrita, caralho? — Nandinho jogou um saco de drogas em mim — Acaba de empacotar essas coisas aí.

— Pô, minha barriga tá roncando, minha coroa fez uma macarronada pro almoço. — respondi, com a mão na barriga — Tô tendo alucinação do macarrão já! — Nandinho riu, acendendo um cigarro comum.

— Vai lá, ontem tu passou do horário. Só não esquece que amanhã tem baile.

— Suave — levantei entregando o saco a ele — Amanhã tô cedo aqui — fiz um toque e sai.

(...)

Abri a porta de casa e logo encontrei minha mãe sentada no sofá. Quando seus olhos me encontraram, pude perceber o brilho que ele continha. Não era um brilho bom e sim um brilho triste, um brilho de quem chorou.

— O que houve? — perguntei ao fechar a porta, olhei e no seu colo tinha um prato com um pouquinho de comida — Tá comendo só isso por que?

— Meu estômago. — disse cerrando os olhos — Está doendo novamente.

— Já tomou o remédio? — tirei a chave da moto do pescoço e coloquei sobre a bancada.

— Acabou ontem. — ela disse, pousando a mão sobre a barriga.

— E por que tu não me pediu, mãe? — disse, irritado de verdade — Sabe que tem que me lembrar, eu esqueço desse remédio.

— Eu já te disse que não te quero nessa vida, não vou ficar usando esse teu dinheiro sujo.

— É esse dinheiro sujo que compra teus remédios! — a olhei de soslaio e respirei fundo — Eu já disse pra tu parar com essas graças, ou prefere ficar passando mal? — ela não respondeu — Tô falando contigo, mãe.

— Não quero nada não, Igor. — disse sem me olhar.

— Tá, o dinheiro tá aqui em cima, se quiser o remédio liga pra farmácia do morro que eles trazem. — dito isso, fui até a cozinha e fiz meu prato, peguei o refrigerante e fui para o meu quarto.

A minha mãe não aceita meu dinheiro fácil, ela sempre usa o mesmo argumento de ser um dinheiro sujo. O que ela não entende é que no morro o método mais fácil é esse. Ela não precisa me apoiar, apenas aceitar. Já faz parte de mim isso. Eu sou isso.

Estava vendo um filme quando o celular vibrou, olhei pelo visor e vi que era uma mensagem da Brenda.

Brenda era minha ex, a mãe da minha filha Isabela.

Nossa relação não é saudável, sempre discutimos mas sempre que a fome bate é ela que eu trombo, sabe como é né?

Pode comprar fralda pra Isabela?/ Brenda

Marca um dez aí, tô comendo e daqui a pouco broto aí./ Igor

Isabela tem um ano e meio. Ela não foi planejada nem nada, no começo fiquei até meio escaldado achando que não era minha filha, até por que a Brenda nunca foi flor que se cheire. Mas não tem como, a Belinha é a minha cópia fiel. Ela e minha mãe são minha base, por mais que não trate minha mãe como ela mereça, ela e a Isabela são meu equilíbrio.

Terminei de comer, peguei o celular e liguei pra farmácia do morro, pedi as fraldas e o remédio da coroa.

Em cinco minutos as coisas chegaram aqui, minha mãe logo tomou o remédio e foi para o seu quarto dormir, peguei as fraldas e a chave da moto e saí. Montei na moto e pilotei até a casa da Brenda.

Ela morava com a mãe, mas a mãe só vinha pra casa sábado e domingo.

Cheguei e logo vi a Isa. Ela estava descalça e sem blusa, estava com uma prima da Brenda sentada no meio-fio.

— Vem cá filha — peguei a menina puto e dei um beijo em sua testa, caminhei até a casa da Brenda e a mesma estava fazendo a unha.

Chutei a porta e ela se assustou, me olhou com os olhos arregalados e colocou a mão sobre o lado esquerdo do peito.

— Tá maluco Igor? — disse assustada.

— Maluco o caralho. A garota acabou de voltar do hospital com pneumonia e tu deixa a garota descalça e sem blusa, Brenda? Tá comendo merda, filha da puta?

— Tá calor, Igor. — disse voltando a pintar as unhas.

— Tu fala isso por que não foi tu que ficou lá no hospital com ela, foi minha mãe. Irresponsável do caralho.

— Eu já ia dar banho nela, não é pra tanto. — disse com ar de deboche.

— Fica de deboche que eu vou fazer igual a última vez. Já disse que tu pode fazer o que tu quiser, só cuida da garota direito já que tu não faz porra nenhuma. — joguei a fralda encima da mesma — Melissa nova? — a encarei — Não tô aqui pra te bancar não em Brenda!! Se eu souber que tá usando o dinheiro da Isabela contigo tu vai ver!

— Tá me ameaçando? — disse me encarando.

— Tu sabe que eu não ameaço, eu faço! — saí dali com a Isa e a coloquei no tanque da moto, arrastando pra minha casa.

Cheguei e mamãe ainda dormia, coloquei um desenho pra ela na sala e fui até meu quarto pegar uma roupinha pra Isa. Dei banho nela e um lanche, depois deixei ela sentada no sofá vendo desenhos.

Lado Errado Onde histórias criam vida. Descubra agora