Capítulo 1

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Pov Lorena Damasceno (Princesa do Tráfico)

Enquanto caminho pelo campus da faculdade ouço o barulho do meu salto e nem tento disfarçar o sorrisão do meu rosto.

Atravesso o estacionamento e vejo Dedé encostado no carro preto mexendo no celular. Quando me vê, guarda o aparelho no bolso e segue em direção a porta do motorista enquanto eu sento no banco do carona.

— E aí, conseguiu? - Pergunta dando partida em direção ao morro.

— Óbvio. — Abro o porta-luvas do carro pegando um baseado e o isqueiro —- Ainda dei um fecho no avaliador que perguntou se eu acreditava na ressocialização do Capitão da Penha. — Declaro rindo

— O doidão fez isso mesmo? — ele franze o cenho, sabendo do que se trata já que eu treinei toda a apresentação do meu TCC com ele enquanto estávamos indo pra faculdade.

— Disse, mas eu falei que antes ele teria que ser preso. — olho pra ele e caímos na gargalhada

— Tá maluco! Ninguém pega o paizão não — ele argumenta sem tirar as mãos do volante.

— Agora eu quero que se foda também, com o TCC aprovado só vai faltar pegar a OAB — dou um trago.

— E não vai seguir sendo doutora por quê? — ele olha pra mim e depois volta a prestar atenção no trânsito — Vários irmãos aí querendo uma oportunidade de mudar e tu entrando pra essa vida sem necessidade.

— Dedé, eu odeio a advocacia — faço careta — além do mais, que futuro eu teria sendo filha do chefe da maior facção do rio de janeiro?

— Não sei se esse é o futuro que o chefe quer pra você, lolo. — ele faz um bico pensativo

— Se ele não quisesse, não teria colocado uma arma na minha mão aos 12 anos de idade — encosto a cabeça no banco — a favela é meu lar e eu vou honrar isso.

— Papo, tu vai ser a melhor chefe que essa penha já viu— ele me dá um sorriso de incentivo — mas aproveita enquanto sua barra ainda tá limpa.

Fomos o resto do caminho cantando o pagodinho que estava tocando na rádio do carro. Dedé, além de chefe da minha segurança, é um bom amigo pra mim. Eu sei que no fundo ele percebe que a vida do crime tá no meu sangue, eu tenho ódio desse sistema engravatado que esculacha o favelado e vou lutar pra que a vida na minha comunidade seja muito melhor.

Quando chegamos na penha vejo que a favela está bem movimentada. Um pouco depois da barreira, BW dá esporro em um vapor que apenas abaixa a cabeça e concorda.

— BW tá se achando pra caralho ein — Dedé pontua fechando a cara

— Para de implicar com o cara, Denilson, meu pai confia nele.

— Implicância nenhuma, chefinha — ele discorda — Mas se vier cantar de galo no meu terreiro, vou entrar numa com ele.

Quando vê o nosso carro, BW manda o vapor vazar, ajeitando a bandoleira com o fuzil e estreitando os olhos na nossa direção.

Denilson para o carro perto dele e eu abaixo o vidro, olhando o Breno e percebendo sua nova tatuagem acima da sobrancelha grossa.

— Fala aí — ele sorri pra mim e acena a cabeça pro dedé — Capitão tá querendo falar com a Princesa lá na boca, desce aí que eu te levo.

— Relaxa, Dedé vai me deixar lá — ele olha pra mim e depois pro Dedé — Valeu aí, BW — Subo o vidro do carro e seguimos pra boca.

Chegamos na frente da boca e descemos do carro. Dedé cumprimenta os moleques com um toque.

— Eai, meninos — Falo simpática enquanto vou entrando pra sala do meu pai e eles respondem com um "Boa tarde, Princesa". Eu acho engraçado que o apelido que meu pai me chama desde criança pegou pra todo mundo da favela, não me incomoda mas também não me identifico.

Paro na porta aberta do meu pai e o vejo falando no telefone, ele sorri pra mim e desliga a chamada.

— Entra, minha Princesa! — ele me chama com a mão.

Sonho dos crias [M]Onde histórias criam vida. Descubra agora