Capítulo 115

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Capítulo 115 — Lorena

Respiro fundo, controlando a vontade de vomitar que o sangue escorrendo pelo banheiro tá me dando. Intercalo o meu olhar entre o cara morto do chão e o pai do meu filho. Foi tudo muito rápido, mas os flashes estão na minha mente e eu reconheço o esforço do Matheus em não perder a cabeça. O tiro não foi impulsivo, foi um recado pra quem quer que se atreva mexer com a gente.

— Me dá a mão, vai acabar escorregando aí nesse sangue todo — Matheus me estende a mão e eu seguro, passando uma perna e depois outra sobre o corpo no chão.

— Não existe um segundo de paz na nossa vida, né? — rio, conferindo se sujei meu tênis branco.

Rio mesmo, porque parece que a minha mente já até se acostumou e fica esperando o próximo filho da puta que vai aparecer pra testar a nossa sanidade mental.

— Paz e nós dois não combina, loirinha — ele ri também, passando a mão limpa no meu rosto e cabelo.

Sinto o carinho e o amor dele nessas pequenas atitudes da mesma forma que o sinto nos grandes atos, como matar esse merda caído no chão. 

— Ainda bem que a gente tem a gente, então — solto a mão dele quando minha barriga encosta na barriga dele, me obrigando a olhar pra baixo e depois pro rosto do meu marido — Vai dar merda isso não?

Sinto uma pontada de medo, não por mim, mas pelo nosso bebê. Tudo é diferente agora, eu já amo essa criança mais do que tudo no mundo e tenho a infância dela na mão. Não quero a mesma criação que eu tive. Quero que meu filho se sinta seguro, que nunca duvide do meu amor, que possa contar comigo e com o pai pra tudo... Mas nós somos traficantes procurados pela federal, nós temos inimigos dentro do próprio crime, inclusive o meu pai.

Um passo em falso e tudo o que eu planejo pra ele, vai por água abaixo.

— Se liga no papo que teu marido vai te dar — segura meu queixo, alinhando nossos rostos — Princesa e Jogador é a dupla mais pica do mundo, não é do rio de janeiro, não. É do mundo e não vai ser bandidinho fuleiro de outro estado que vai vir na nossa cidade, tentar crescer pra cima de nós, não.  — diz sério, passando a mão na minha barriga — Tua missão agora é gerar o nosso filho, cuidar pra que ele nasça bem e com saúde. Minha missão é proteger vocês e não deixar que nada te abale. Fica tranquila, o ko que aparecer, eu vou resolver. Tô ligado que tu não gosta dessa posição, mas é o que a nossa família precisa agora.

Tá junto de alguém que te conhece melhor do que você mesma é se entender a partir do que a pessoa fala. É verdade quando o Matheus diz que eu não gosto da posição que a gravidez me impõe. Não me arrependo de ter engravidado, tô amando estar grávida, mas as condições não são compatíveis pra minha personalidade, muito menos com a minha função. Porra, eu sou a dona do Complexo da Penha, mas antes disso eu sou a mãe da Malu ou do Leo.

— Tranquilo? — ele pergunta depois dos meus segundos em silêncio — Confia em mim?

— Confio — concordo também com a cabeça — Sei que agora as minhas ações não são só sobre mim. Por isso eu não arrebentei a cara do arrombado no mesmo segundo que ele me tocou.

— É, chega de tomar tiro. Se esse filho da puta te machuca, eu ia ter que pendurar a cabeça dele lá na dutra, entre rio e São Paulo — ri e segura minha mão de novo, me guiando pra fora do banheiro.

As caixas de som do baile tão estourando, por isso, ninguém parece ter ideia do que aconteceu dentro do banheiro.

Vejo o Pit segurando dois pacotes de pipoca perto do sofá que estávamos, ele troca uma ideia rápida com o Coreano, mas passa o olho pelo camarote atrás de nós dois.

— Vou comer minha pipoca — solto a mão do Jogador — e você vai contar pro Dom que matou o parceiro dele. Boa sorte.

— Filha da puta — ouço ele dizer, segurando a risada, enquanto me observa andar até o Pitbull com a minha pipoquinha.

Não foi isso que ele pediu pra eu fazer? Relaxar, que ele ia resolver tudo? Então é isso que eu vou fazer.

(...)

Às cinco horas da manhã estamos entrando no Alemão. Matheus dirige com uma mão no volante e outra na minha perna, enquanto eu presto atenção no carro da frente, que faz nossa segurança, parando na barreira.

— Não íamos direto pra casa? — olho pro rosto do Matheus e ele franze a testa, olhando pro corolla na nossa frente.

No meu da rua, Concha segura o fuzil com uma mão e faz sinal pro motorista seguir mais um pouco com a outra, esperando o nosso carro parar na frente dele. Matheus encosta o carro e abaixa o vidro do meu lado enquanto o soldado se aproxima.

— Solta o cinto, amor — diz pra mim e desliga o rádio — Qual foi? — inclina o queixo na direção do concha e aperta a minha perna.

Eu aperto o botão pra liberar o cinto de segurança e me inclino para frente, passando a mão pela arma embaixo do banco antes de olhar pro meu cria.

— Mal ae, Patrão. Te falar, bateu uma mulher ai no morro atrás da nossa rainha, tá ligado? Eu tentei passar a visão de que não era assim que as paradas funcionam, que não dá pra chegar cheia de marra. Mas a mulher não cansa, não quer me dar o papo e parece que tá desesperada, sentada lá na frente da boca. Pretinho mandou dar uma parada pra mulher comer e esperar vocês chegarem.

— Não me mandou mensagem por que? — Matheus questiona.

— Mandei, mas foi agorinha, acho que já tavam no caminho, consegui falar com Pit só, por isso ele parou ali. 

— Qual o nome dela? — pergunto, sentindo uma coisa ruim no peito.

— Soraya, mas o assunto, ela só quer falar contigo.

— Vamo lá — viro pro Jogador.

— Lorena...

— Vamo lá, amor — passo a mão sobre a dele, que não deixou a minha perna um segundo sequer.

Ele me olha e concorda, fácil assim. Não preciso bater o pé, porque ele sabe bem que, quando a minha intuição bate, é melhor ouvir. Ele só precisa de um olhar pra me entender e dar partida no carro.

— Eu gosto desse lugar, sabia? — presto atenção nas ruas até a boca.

— Sabia que tu ia gostar daqui, te mandei esse papo logo que tu chegou — fala e eu sorrio, me lembrando da nossa conversa comendo um belo x-tudo. Minha barriga parece que cria um buraco na mesma hora. Porra! To comendo pra caralho. Só penso nisso.

Matheus dirige e estaciona na esquina, quando eu desço do carro, puxando meu vestido pra baixo.

A mulher tá lá onde o Concha disse que estaria, o Pretinho, encostado na parede atrás dela, com um baseado na mão. Eu me aproximo, notando o olhar de cansaço e medo, ela não tá bem e os sentimentos dela me atingem.

Os cabelos pretos caem nos ombros quando ela me vê e levanta, fazendo com que o Pretinho segure o braço dela, impedindo que ela corra até mim.

— Princesa — diz meu nome aos prantos — É verdade que você tá grávida — fixa o olhar na minha barriga.

— E você tá precisando da minha ajuda — aperto os olhos, tentando entender ou imaginar o que aconteceu com ela.

— Muito. Preciso muito.

— Solta ela, Pretinho — Eu mando e ele solta, depois de olhar pro Matheus, que observa tudo calado — Fala.

— Meu filho... Capitão, ele pegou o meu filho — o choro dela, arrepia meus braços e eu passo a mão pra amenizar a sensação — Você tá grávida, você tem que entender e me ajudar.

— Quem é você e quem é seu filho? — pergunto.

— Eu fui uma idiota que se envolveu com seu pai — sustenta o rosto nas duas mãos enquanto chora.

Ando até ela e seguro os seus braços, forçando o contato visual. Não sinto maldade, sinto  medo e raiva. Uma mãe com raiva de quem feriu seu filho, comete loucuras, eu entendo.

Sonho dos crias [M]Onde histórias criam vida. Descubra agora